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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO DOUTORADO E MESTRADO Dissertação Thaís Cristina Martino Sehn AS POSSÍVEIS CONFIGURAÇÕES DO LIVRO NOS SUPORTES DIGITAIS Porto Alegre, 2014. CIP - Catalogação na PublicaçãoElaborada pelo Sistema de Geração Automática de Ficha Catalográfica da UFRGS com osdados fornecidos pelo(a) autor(a).Sehn, Thaís Cristina Martino As possíveis configurações do livro nos suportesdigitais / Thaís Cristina Martino Sehn. -- 2014. 265 f. Orientadora: Suely Fragoso. Dissertação (Mestrado) -- Universidade Federal doRio Grande do Sul, Faculdade de Biblioteconomia eComunicação, Programa de Pós-Graduação em Comunicação eInformação, Porto Alegre, BR-RS, 2014. 1. comunicação. 2. livro digital. 3. e-book. 4.remediação. 5. design. I. Fragoso, Suely, orient. II.Título. THAÍS CRISTINA MARTINO SEHN AS POSSÍVEIS CONFIGURAÇÕES DO LIVRO NOS SUPORTES DIGITAIS Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Orientadora: Prof.ª Drª Suely Fragoso Porto Alegre, Março de 2014. Banca Examinadora Profª. Drª. Sônia Elisa Caregnato Profª. Drª. Ana Cláudia Gruszynski Profª. Drª. Mônica Lima de Faria AGRADECIMENTOS Ao pensar nesses dois anos, que me dediquei exclusivamente ao mestrado, me lembro de muitas pessoas que me ajudaram de alguma forma nesse caminho, algumas sabem que estou me referindo a elas e outras nem imaginam o impacto que tiveram sobre mim. Com certeza, não citarei todos os nomes e nem farei menção a todos os momentos, que apesar de banais, fizeram meu dia mais feliz. Espero não te decepcionar se o teu nome não estiver aqui, mas tive que me controlar para não transformar estes agradecimentos em um texto do tamanho equivalente a outra dissertação. Primeiro, acho justo lembrar os professores e amigos que me ajudaram durante a seleção para o mestrado, discutindo ideias, dando-me conselhos e revisando meu projeto. Obrigada Janaina Schvambach, por me ajudar a pensar e revisar o projeto; Mônica Faria, por me ajudar com as dicas para a entrevista; Maria de Lourdes Reyes, por aceitar conversar comigo sobre o que eu poderia pesquisar e, no meio da conversa, dizer: “Se tu estudou sobre livro no TCC, porque não pesquisa agora sobre livro digital?”; Alexandre Assunção, por achar um tempo para revisar o meu projeto quando estavas envolvido com a tua tese (e desculpa eu ter sido uma chata te incomodando nesse momento conturbado); Fernando Igansi, por me orientar na especialização e me ajudar na preparação para a seleção do mestrado; Adriano Dias, pelo incentivo a entrar na Linha de Redes Sociais e Patrícia Damasceno, por me dar uma luz quando eu estava perdida procurando o foco da pesquisa. Agora, começam os agradecimentos ‘pós-ingresso no mestrado’. À minha orientadora, que apostou em mim na sua estreia dentro do PPGCOM da UFRGS. Suely, tu és uma pessoa que além de divertidíssima, és genial! Adorei nossas orientações ‘tira-teima’ por e-mail e nossas conversas no bar da faculdade, nas quais falávamos de várias coisas, inclusive sobre a dissertação. Aprendi muito contigo, obrigada por ter puxado minha orelha nos momentos certos e também por ter me elogiado quando achaste que eu merecia. Acima de tudo, obrigada pela confiança e parceria. Também preciso agradecer aos meus irmãos e amigos que me aguentaram com papos de pesquisa e vida acadêmica, fazendo cara de interessados no que eu estava falando e também àqueles, que dividiam comigo as mesmas angústias da pós-graduação. Em especial, agradeço às pessoas que deixaram a minha estadia em Porto Alegre menos solitária: aos meus colegas de ap, a ‘Prima’, a Ana Marafiga, o Guilherme, o Klaus, o André e o Paulo, além de fazermos companhia uns aos outros, também dividíamos as contas; a Lívia e a Ita, que estavam sempre prontas quando eu ligava em cima da hora convidando para comer alguma coisa na Cidade Baixa; ao grupo IMC (Interação Mediada por Coruja, computador e chimarrão), Thais Martini, Annie Piaggetti, Tanira Ledebeff e Luciele Copetti, pela força mútua e pelas risadas no Le Grand Burguer; as gurias da turma do ‘livro digital’, Danusa Oliveira, Greta Lemos e Raquel Castedo, pelas dúvidas, eventos e discussões compartilhadas; aos parceiros de R.U., Irina Coelho, Mariana Sirena, Francisco Santos, Camila Barths, Gisele Noll, Veridiana Vecchia, Fulgencio Muchisse, Camila Mozzini e as que juntavam a nós no cafezinho pós-almoço, Taís Teixeira, Débora Sartori e Zizil Arledi, pela troca de ansiedades do mundo da pesquisa e conversas engraçadíssimas sobre assuntos diversos; aos meus queridos alunos do estágio docente Natalia Lassance, Camila Chisini, Felipe Barroco e Laura Haffner, que me ajudaram a enxergar melhor as possibilidades do livro digital; e também a todos os meus colegas que eu não incluí o nome aqui, mas que tornavam as discussões de antes, durante e depois da aula, mais ricas e/ou divertidas. Sobre as aulas no PPGCOM, lembro, entre outras coisas, da Helen Rozados e a paella ma-ra-vi-lho-sa do Paquito; das discussões sobre a comunicação sem informação e a informação sem comunicação nas aulas de Teorias com a Virgínia Fonseca, Nilda Jacks e Sônia Caregnato; das aulas do Alex Primo e os actantes ‘bip’ do ar-condicionado, coluna do meio da sala e, claro, meu chimarrão; das constantes risadas matinais nas aulas da Marcia Benetti; e da Fátima Regis com o Platão. Obrigada professores por terem me ajudado nesse caminho e me brindado com suas aulas. Também preciso agradecer aos membros da banca de qualificação, Ana Gruszynski e Sônia Caregnato, por suas valiosas contribuições a este trabalho. À secretaria e coordenação do PPGCOM, que sempre me ajudaram quando precisei. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes – pela bolsa de mestrado, tornando tudo isso possível. Não posso esquecer de registrar o meu ‘muito obrigada’ à Romina Sivolella, que sempre esteve presente e pronta para me ajudar, principalmente com as traduções para o inglês. Por fim, e nem um pouco menos importante: Ao meu namorado, que me obrigava a fazer pausa nos estudos para me encher de carinho. Rafa, obrigada por me apoiar, por abrir espaço pra eu entrar na tua vida e por me fazer feliz. Te amo. À minha sogra e seu ar-condicionado, que me ajudou a raciocinar nesse verão atípico de sensação térmica de 50°C. Mas, obviamente, não só por isso, também por me acolher como uma filha em sua casa, sempre se preocupando comigo e querendo o meu bem. Não vou esquecer, entre outras coisas, o esforço que tu fazias para não conversar ou me chamar para ver alguma coisa, enquanto dividíamos a peça e o mate, só para eu não perder o foco na dissertação. Ao meu pai, que sempre me paparicou, levando lanches, frutas e chimarrão, enquanto eu estudava, e gibis do Homem-Aranha, enquanto eu não estudava. Pai, obrigada por me incentivar a ir atrás do que eu acho que vai me fazer feliz. Obrigada por me mostrar o que é certo e errado. E, obrigada, por deixar claro que eu posso tentar fazer o que eu quiser, e, até ‘quebrar a cara’, porque eu sei que tu sempre vai estar lá, me ajudando e me apoiando no que eu precisar. À minha mãe… Mãe, é difícil achar palavras diferentes para te agradecer mais uma vez, tudo o que fazes por mim, mas como eu sei que tu vai adorar ler isso, vou falar mesmo que eu seja repetitiva. Tu, além de acreditares no meu potencial, ficar orgulhosa de qualquer coisa – por mais boba que seja – que eu faça, foste incansável me ajudando a revisar os textos, traduzindo minhas ideias truncadas para frases legíveis, virando madrugadas lendo ogeral do mesmo. Para que isto acontecesse o conteúdo deveria ser apresentado de forma que o leitor não fosse induzido a uma sequência específica. A terceira foi colocada a fim de que fosse verificado se, em algum momento do livro, estava prevista a conexão entre partes deste através do hipertexto ou de um hiperlink que direcionasse para um site. A quarta subcategoria versou sobre a customização do livro. Aqui foi avaliada a existência da possibilidade de o leitor alterar os elementos visuais deste artefato. Dentre as possibilidades mais usuais de alterações a serem realizadas pelo usuário, pode-se citar: o tamanho da fonte (diferente do zoom, que faz com que o texto se reconfigure na tela), a tipografia, as cores do fundo do texto, o tamanho das margens e o espaçamento entrelinhas. Se o livro possibilitou pelo menos uma dessas alterações, a customização foi considerada presente na obra analisada. Tabela 8 - Potencialidades do meio digital I POTENCIALIDADES DO MEIO DIGITAL Interatividade Multimídia acionada pelo leitor Narrativa hipertextual Hipertexto e hiperlink Customização Fonte: a autora. O segundo grupo destacado dentro de ‘Potencialidades do meio digital’ foi a Multimídia. Aqui se efetivou uma avaliação sobre a existência e exploração de multimídia no interior do livro (sem considerar a capa). Para avaliá-la, fez-se uma divisão sobre as diferentes linguagens que poderiam formá-la. Uma classificação geral seria: texto, imagem e som; no entanto isso não foi suficiente para demarcar as especificidades dos livros digitais. Portanto, separou-se em: texto; cores (aplicada ao texto e/ou imagem); imagem estática (ilustração ou foto); imagem em movimento (animação ou vídeo); trilha sonora (música e/ou som que acompanham toda a narrativa); som em momentos específicos da história (ou de algum personagem específico); narração; e outro (quando não se adequasse a nenhuma das opções anteriores). Para o caso de vídeos e animações com som, optou-se por marcar tanto o item imagem em movimento, como som em momentos específicos da história. No caso dos livros analisados no aparelho Kindle, cuja tela e-Ink não permite a utilização de cores, avaliou-se a exploração dos tons de cinza. Outra ressalva que 35 deve ser feita quanto a esta análise é que os itens resultantes do uso do ‘som’ não foram associados entre si, sendo possível em um livro haver apenas a possibilidade de narração e, em outro, ter narração, trilha sonora e som em momentos específicos e, por esse motivo, a detecção destes detalhes foram marcados separadamente. Tabela 9 - Potencialidades do meio digital II POTENCIALIDADES DO MEIO DIGITAL Multimídia Texto Cores Imagem estática Imagem em movimento Trilha sonora Som em momentos específicos Narração Outro Fonte: a autora. A outra potencialidade verificada abrangeu a Interação entre leitores mediada pela tecnologia digital. Esta categoria foi dividida em três quesitos. O primeiro deles indicou a possibilidade de compartilhamento de trechos da história (por e-mail, redes sociais etc.) entre os usuários e se avaliou se essa ação foi facilitada por algum atalho, ícone ou botão no livro ou software de leitura. No segundo observou-se a possibilidade de, durante a leitura do livro, o leitor conseguir ver destaques e/ou comentários feitos por outros usuários (categorizados como anônimos ou não). O terceiro e último quesito diz respeito à possibilidade de se estabelecer uma discussão online sobre um livro, durante sua leitura, ou seja, se era possível, entre os leitores, a troca de comentários e/ou destaques simultâneos, no momento em que estes estão sendo feitos. Tabela 10 - Potencialidades do meio digital III POTENCIALIDADES DO MEIO DIGITAL Interação entre leitores Compartilhar trechos com outros leitores Ler destaques e/ou comentários de outros leitores Troca entre leitores de comentários e/ou destaques Fonte: a autora. A próxima macrocategoria contemplou a remediação do livro impresso (Tabela 11), na qual se investigou se os livros digitais estavam se aproximando ou se distanciando do seu análogo em papel. Para essa fase, foram estabelecidos 36 quatro parâmetros para avaliação: Aparência, Estrutura, Navegação linear e Ênfase no texto escrito. Para avaliar a aparência, verificou-se a presença de imitações da materialidade do livro, como representação de suas páginas, do som emitido ao folheá-las quando em papel etc.. No quesito estrutura, buscou-se a existência de elementos pré-textuais, textuais e pós-textuais, que estivessem bem organizados e que fossem identificados claramente. Esses elementos foram definidos conforme a síntese construída com base em Haslaw (2007), Hendel (2006) e Fontoura (2007), apresentada na seção 4.1. Para se manter a classificação binária e se evitar o excesso de subcategorias, selecionou-se os itens que foram mais essenciais à estrutura do livro para serem elencados nesta análise. São eles: a capa, a folha de rosto, a página de créditos, o sumário, um elemento pós-textual e, obviamente, a parte textual. A opção por não se delimitar os elementos pós-textuais para avaliação baseou-se no fato de que estes variam conforme o gênero de leitura. Também vale destacar que a página de créditos e o sumário podem vir tanto no início quanto no final do livro. Quando foram apresentados no final, podem ser considerados como elementos pós-textuais. Optou-se por inserir a navegação linear nesta macrocategoria de remediação, pelo fato da encadernação e numeração de páginas do livro induzir a uma leitura linear. Consequentemente, aqueles conteúdos que mantiveram a ordem de navegação, sempre horizontal ou vertical, causando a sensação de uma leitura linear, estão se aproximando da ideia de livro tradicional. Os outros, que alteraram essa navegação, ora se movimentando de forma horizontal, ora vertical, ou, ainda, que propuseram outro tipo de navegação, como janelas que surgem de alguma forma etc., se distanciam da navegação linear do livro. Vale lembrar que neste item foi avaliada a sensação de linearidade. Essa sensação, em um livro digital, pode ocorrer mesmo em um conteúdo que contenha narrativa hipertextual. Diferente do livro impresso, no qual o leitor teria que pular páginas ou ir para uma página específica indicada para seguir a história – conforme sua escolha – avançando ou retornando no material encadernado; no meio digital essas opções podem ser exibidas linearmente, sendo exigida a tomada de decisão do usuário e, logo a seguir, como consequência, apresentada a resposta, causando a sensação de 37 linearidade, mesmo que o leitor esteja consciente de que se trata de uma narrativa hipertextual e de que poderia haver outras opções. O último quesito desta categoria focalizou a ênfase no texto escrito. Isto corroborou a favor de que fossem usados outros recursos para dar apoio ao texto, sem tirar-lhe a prioridade. No caso de livros ilustrados, tanto no meio impresso como no meio digital, a imagem divide a atenção com o texto e, para esses casos, a ênfase no texto escrito foi marcada como positiva, uma vez que a imagem e o texto estavam equiparados. Se a imagem foi percebida como elemento principal e o texto como seu apoio (legenda explicativa, comentário etc.), considerou-se uma resposta negativa a esse quesito. Tabela 11 - Aproximação da ideia de livro impresso (remediação) APROXIMAÇÃO DA IDEIA DE LIVRO IMPRESSO (REMEDIAÇÃO) Aparência Estrutura Navegação linear Ênfase no texto escrito Fonte: a autora. A última macrocategoria que se analisou abordou o projeto gráfico do livro digital. Esta macrocategoria foi dividida em Miniatura da capa, Capa, Aplicação consistente de estilos e espaçamentos, Projeto gráfico específico para o meio digital, Fonte da editora, e Customização sem perda de informações visuais(Tabela 12). Na miniatura da capa foi avaliado se ela estava coerente com o layout da capa principal. O livro foi considerado um exemplar com capa, se possuía uma imagem de abertura com titulo, autor e editora. Esclarece-se que por imagem se compreende também a utilização de cores e tipografias, que diferenciam a capa de um exemplar específico das outras. No item referente à ‘Aplicação consistente de estilos e espaçamentos’, pretendeu-se avaliar a formatação do texto, ou seja, foi verificado se os títulos se apresentavam diferenciados de alguma forma, se as informações eram hierarquizadas visualmente de acordo com seu nível de importância, se os espaços em branco eram utilizados dentro do padrão proposto no livro etc.. O ‘Projeto gráfico específico para o meio digital’ foi criado para que se pudesse averiguar se as características do meio digital foram aparentemente consideradas no momento do projeto gráfico, ou se o livro trouxe elementos que 38 poderiam facilitar a leitura no meio impresso, mas que não seriam úteis no digital; ou seja, verificou-se se o meio digital funcionou como um portador17 (0) ou um suporte (1). Quando um livro pôde ser customizado e trouxe, além das possíveis opções do software reader, a fonte original da editora, embutida no livro, este item foi marcado como positivo. Também foram considerados com resposta afirmativa, aqueles casos em que não existiu a possibilidade de customização da tipografia, mas que ficou subentendido que, como foi oferecida apenas uma fonte, esta seria a escolhida pela editora. Outro parâmetro relacionado ao projeto gráfico foi a ‘customização do conteúdo sem perda de informações visuais’. Este item diz respeito à manutenção das hierarquias do texto mesmo quando é possibilitado ao leitor que altere as configurações tipográficas. Especificando melhor, se houver negrito, itálico ou outro destaque tipográfico, no texto essas especificações devem ser mantidas, mesmo que o texto seja customizado pelo usuário. Além desses fatores, no último quesito se avaliou a qualidade da realização ou da execução do arquivo. Nesse item se investigou a presença de erros de funcionamento e/ou da apresentação visual do livro. Tabela 12- Projeto Gráfico de Interface PROJETO GRÁFICO DE INTERFACE Miniatura da capa Capa Aplicação consistente de estilos e espaçamentos Projeto gráfico específico para o meio digital Fonte da editora Customi-zação sem perda de informações visuais Qualidade de realização do arquivo Fonte: a autora. Com a tabela construída, passou-se para a etapa que focaliza a análise da amostra. Para realizá-la, foram selecionados um tablet, um e-reader e um notebook. A escolha do modelo e marca de cada um deles ocorreu em função da conveniência da pesquisadora, por serem esses os aparelhos aos quais a mesma tinha acesso. Assim, foram utilizados o e-reader da Amazon, Kindle Paperwhite com tela e-Ink de 6 polegadas, o tablet da Apple, iPad 2 com sistema operacional IOS7 e tela de 9,7 17 Segundo a definição de Ribeiro (2012), explicada no glossário deste trabalho. 39 polegadas, e o notebook da Dell, modelo Studio 1458, com monitor 14 polegadas e sistema operacional Windows 7. Através do resultado dos estudos-piloto, fez-se a opção de não incluir o smartphone nesta análise, já que suas funções são semelhantes às do tablet. A maior diferença encontrada entre esses aparelhos foi que no smartphone o livro ficava com o tamanho reduzido, proporcionalmente, sem alterações visíveis, principalmente nos livros aplicativos, e, no caso de livros projetados para serem lidos dentro de aplicativos de leitura (PDF, EPUB, MOBI etc.) ou para leitura online, havia uma reorganização visual da interface do software, atendendo melhor o usuário desse display, o qual possui um tamanho menor. Concluiu-se, então, que a alteração observada ocorre em decorrência do aplicativo utilizado, uma vez que os recursos do livro eram os mesmos. 2.2. CORPUS A escolha dos livros digitais foi feita a partir da observação das fontes encontradas pela pesquisadora durante o período do mestrado: os sites Feira de Livro Frankfurt18, Congresso Brasileiro de Livro digital19, Digital Book Awards20, The Institute for the Future of the Book21, Publish News22, Electronic Book Review23, Literatura Digital24 e Electronic Literature Collection25; os blogs Revolução E-book26, iPadFamília27, Blog da Cosac Naify28 e Blog da Companhia das Letras29; as lojas virtuais Amazon30, iTunes31, Livraria Cultura32, Livraria Saraiva33, Google Play34, Google Livros35. O Fórum Internacional de Leitura Digital36, o Simpósio Internacional 18 https://en.book-fair.com 19 http://www.congressodolivrodigital.com.br/site/home 20 http://digitalbookworld.com/2013/2013-publishing-innovation-award-winners 21 http://www.futureofthebook.org/ 22 http://www.publishnews.com.br 23 http://www.electronicbookreview.com/ 24 http://www.literaturadigital.com.br/ 25 http://collection.eliterature.org/ 26 http://revolucaoebook.com.br/ 27 http://ipadfamilia.com.br/ 28 http://editora.cosacnaify.com.br/blog/ 29 http://www.blogdacompanhia.com.br/ 30 http://www.amazon.com/ 31 https://itunes.apple.com/ 32 http://www.livrariacultura.com.br/ 33 http://www.livrariasaraiva.com.br/livros-digitais/ 34 https://play.google.com/store/books?hl=pt_BR 35 http://books.google.com.br/ 36 Realizado em Porto Alegre, nos dias 9 e 10 de novembro de 2012 na ESPM Sul, disponível no site: https://twitter.com/FILD_ESPM , acesso em 5 de janeiro de 2014. 40 Futuros Possíveis37 e o evento de lançamento do Manifesto Digi-Brasil38, os quais esta pesquisadora participou. Através da observação destas fontes, foram verificadas as sugestões de livros digitais e de outros sites que falavam sobre o assunto. Ao perceber que um e-book poderia ser interessante para a análise, verificava-se as opções de aquisição do mesmo: se gratuito ou à venda. Analisava-se também se este possuía amostra do material e se esta seria suficiente para analisar os recursos utilizados no livro; para quais aparelhos e sistemas estaria disponível etc. Durante um ano e meio, esses livros foram sendo armazenados para que no momento da construção da amostra fossem selecionados. Esclarece-se, ainda, que a amostra foi constituída de artefatos que foram ofertados no cenário atual (entre 2011 e 2013); e, mesmo que ela traga muitos livros que estão sendo disponibilizados, ela não objetiva fazer um retrato dos recursos mais utilizados e/ou mais populares, mas das possibilidades que estão sendo exploradas e que podem ser mais utilizadas. As análises foram feitas consecutivamente, e seguindo uma ordem pré-estabelecida que inicialmente abarcasse aparelhos, dentro destes os softwares que disponibilizavam os livros e finalmente as próprias obras que foram analisadas. Essa ordem pré-estabelecida permitiu que se chegasse ao ponto de saturação mais claramente, tornando possível identificar o momento em que os recursos e as características dos livros de cada tipo passavam a se repetir. Desta maneira, foram analisados39 82 livros digitais: 16 deles no e-reader; 26 nos aplicativos específicos para leitura no tablet; 18 no aplicativo iBooks, que já vem instalado no aparelho (iPad); 26 livros aplicativos no tablet e 14 no notebook. A maior quantidade de livros aplicativos abordados é justificada por nesse tipo de livro não existir um padrão tão claro de utilização de recursos, diferente dos e-books que são lidos a partir de softwares específicos para leitura. Os livros analisados podem ser vistos na Tabela 13 a seguir: 37 Realizado em São Paulo, de 1 a 5 de Outubro de 2012 na FAU – USP, disponível no site: http://simposiofuturospossiveis.wordpress.com/,acesso em 5 de janeiro de 2014. 38 Realizado em Porto Alegre, em 17 de abril de 2013, disponível no site: http://revolucaoebook.com.br/movimento-busca-literatura-pensada-para-digital/, acesso em 5 de janeiro de 2014. 39 Os resultados obtidos dos livros menores são decorrentes da observação de todas as páginas do e-book. Nos livros maiores não foi possível analisar a obra como um todo, focando-se no objetivo de buscar características representativas que pudessem ser identificadas. Nesse caso, as principais páginas observadas foram as pré e pós-textuais, os inícios e os fins de capítulos e páginas de texto/imagem do interior do livro, que foram selecionadas aleatoriamente. Também foram observados os recursos disponibilizados no menu do livro/software. 41 Tabela 13– Corpus: artefatos analisados Nome do livro Autor Editora/empresa Formato Software Hardware 1 Writing Space* David Bolter Ed. LEA mobi kindle/aparelho kindle 2 As viagens Olavo Bilac Domínio Público mobi kindle/aparelho kindle 3 Charlotte Sometimes Fábio Fernandes Ed. Draco mobi kindle/aparelho kindle 4 O que é Espiritismo* Allan Kardec Virtue Participações LTDA mobi kindle/aparelho kindle 5 Caim José Saramago Ed. Companhia das letras mobi kindle/aparelho kindle 6 Dois Mundos Um destino* Pedro Xavier Ed.(?) Index ebooks mobi kindle/aparelho kindle 7 Lendas do Sul* João Simões Lopes Neto A Public Domain book mobi kindle/aparelho kindle 8 Pride and Prejudice* Jane Austen --- mobi kindle/aparelho kindle 9 Superheroes: The best of Philosophy and Pop Culture* William Irwin Blackwell Philosophy and Pop Culture series mobi kindle/aparelho kindle 10 Aqueles tempos Edney Silvestre Ed. Intrínseca mobi kindle/aparelho kindle 11 O entregador de bonecos Denis Lenzi --- mobi kindle/aparelho kindle 12 Histórias para lembrar dormindo | amostra Braulio Tavares Ed. Casa da Palavra mobi kindle/aparelho kindle 13 Esse é meu tipo* Simon Garfield Ed. Zahar mobi kindle/aparelho kindle 14 O Ladrão no Fim do Mundo* Joe Jackson Ed. Objetiva mobi kindle/aparelho kindle 15 Os haicais do menino maluquinho Ziraldo Ed. Melhoramentos mobi kindle/aparelho kindle 16 How to be creative* Hugh MacLeod Change this pdf kindle/aparelho kindle 17 Vida peregrina Mariana Kalil Ed. Dublinense mobi kindle/app iPad 2 18 Breaking the page Peter Meyers O'Reilly mobi kindle/app iPad 2 19 Divina Comedia Dante Alighieri Libro de Dominio Público mobi kindle/app iPad 2 20 LivroLivre Julio Silveira ímã editorial epub BluefireReader iPad 2 21 Marvel comics -A história secreta Sean Howe Ed. Leya epub kobo/app iPad 2 22 Fistful of Reefer David Mark Brown Lost DMB Files epub kobo/app iPad 2 23 Comunicação para cidadania: objetos, conceitos e perspectivas Lahni & Lacerda Intercom pdf kobo/app iPad 2 24 Vintage Tomorrow Carrot and johson O'Reilly pdf Adobe Reader iPad 2 25 #24h Bernardo gutiérrz dpr-barcelona pdf ibooks iPad 2 26 Accessible EPUB 3 Matt Garrish O'reilly epub ibooks iPad 2 27 Aconteceu com um amigo meu Leandro Fonseca autopublicação epub ibooks iPad 2 42 28 O Brasil nas ruas Fernanda Godoy (coordenação) e-books O Globo epub ibooks iPad 2 29 Dicionário nada convencional Arlene Renk Argos Ed. da Unochapecó epub ibooks iPad 2 30 The dinosaur that poped Christmas** Fletcher & Poynter Random House Children's Publishers UK epub layout fixo(?) ibooks iPad 2 31 The making of life of pi** Twentieth Fox Century HarperCollins epub ibooks iPad 2 32 Caçada dos Mares proibidos Parreiras & Carvalho autopublicação epub ibooks iPad 2 33 Cinderella --- iglobooks epub layout fixo(?) ibooks iPad 2 34 O pezinho feio L. Peralva autopublicação epub layout fixo(?) ibooks iPad 2 35 Memórias de um lobo mau José Fanha e alunos do 5º e 6º ano autopublicação epub ibooks iPad 2 36 A menina que roubava livros** Markus Zusak Ed. Intrínseca epub ibooks iPad 2 37 O patinho feio Roberto Beli Todolivro epub layout fixo(?) ibooks iPad 2 38 A bruxa de Portobello Paulo Coelho Sant Jordi Associados Agencia Literaria epub ibooks iPad 2 39 Yellow Submarine Edelman & Minoff Subafilms limited epub3 (?) ibooks iPad 2 40 Wolverine --- Fox Century epub3 (?) ibooks iPad 2 41 As melhores receitas petiscos.com --- epub3 (?) ibooks iPad 2 42 The visions of Tondal** McDermott & Wieck --- epub3 (?) ibooks iPad 2 43 A árvore dos sonhos Coleção: meu dinheirinho Itaú | fabiano Onça Produções livro app livro app iPad 2 44 Tobi Alex Weschsler Technolio livro app livro app iPad 2 45 The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore baseado na obra de William Joyce Moonboot Studios livro app livro app iPad 2 46 Dragoberto Alfredo Stahl E-stilingue livro app livro app iPad 2 47 Quem soltou o PUM? Franco & Lollo Companhia das Letrinhas livro app livro app iPad 2 48 A ararinha do bico torto Walcyr Carrasco Ed. Ática livro app livro app iPad 2 49 A Princesa e o sapo Mariana Massarani Manati Produções Editoriais livro app livro app iPad 2 50 Souricete Sabine --- livro app livro app iPad 2 51 The laughing monster --- tap tap kids livro app livro app iPad 2 52 Homem-arnha Michael Siglain Marvel reads livro app livro app iPad 2 53 Ali Baba e os 40 ladrões** --- Chocolapps livro app livro app iPad 2 54 A Menina do nariz arrebitado Monteiro Lobato Globo Livros livro app livro app iPad 2 55 Little Red Riding Hood --- Bean Bag Kids livro app livro app iPad 2 43 56 Toy Story Disney Pixar livro app livro app iPad 2 57 Quem roubou a lua** Helen Stratton-Would Windy Press livro app livro app iPad 2 58 Color Uncovered Andrews et. al Exploratorium livro app livro app iPad 2 59 Allan Poe Edgar Allan Poe Play Creatividad livro app livro app iPad 2 60 Oxford Bookworms Library App & Level test Oxford University Press iEnglish.com Limited livro app livro app iPad 2 61 Guia politicamente incorreto da história do Brasil Leandro Narloch Ed. Leya livro app livro app iPad 2 62 Would you stay? |TED Books Michael Forster Rothbart Ted Books livro app livro app iPad 2 63 A borboleta e o caçador Atma e André Falcão Ed. Biancovilli livro app livro app iPad 2 64 Scooby-Doo who are you? Andre du Broc hallmark Giftbooks livro app livro app iPad 2 65 Os porquês de Luísa: a separação Carlos Magno pássarododô.com livro app livro app iPad 2 66 The four season Tabtale livro app livro app iPad 2 67 Lili: Quando eu crescer quero ser Porto Editora livro app livro app iPad 2 68 Alice's Adventures in Wonderland through the looking-glass** Lewis Carroll Atomic Antelope livro app livro app iPad 2 69 Alice's Adventures in Wonderland** Lewis Carroll Edited by Edmund R. Brown, ilustração John Tenniel | Google Livros pdf navegador - Google Chrome Notebook 70 Alice's Adventures in Wonderland** Lewis Carroll Xilogravuras de George A. Walker, Int. Alberto Manguel | Google Livros pdf navegador - Google Chrome Notebook 71 Alice's Adventures in Wonderland through the looking-glass** Lewis Carroll Oxford World's Classics | Google Books pdf navegador - Google Chrome Notebook 72 Almanach de Pelotas 1913 Ferreira & Cia Diario Popular | Memória Gráfica de Pelotas pdf navegador - Google Chrome Notebook 73 Emma Jane Austen Richard Bentley - Editora pdf com OCR e epub (?) navegador - Google Chrome Notebook 74 Grimm's Fairy Tales Edna Henry Lee Turpin Maynard, Merrill - Editora pdf com OCR e epub (?) navegador - Google Chrome Notebook 75 18:30 Samir Mesquita --- site - livro - instalação navegador - Google Chrome Notebook 76 ELO - The Electronic Literature Collection Volume Two* Borràs Memmott Raley Stefans The Electronic Literature Organization (ELO) site e CD navegador - Google Chrome Notebook 77 The mobile playbook Spero & Werther Google site navegador - Google Chrome Notebook78 Dois palitos Samir Mesquita --- site navegador - Google Chrome Notebook 79 Um estudo em vermelho Marcelo Spalding projetolitearturadigital site navegador - Google Chrome Notebook 44 80 Perolas e Diamantes, Contos Infantis Irmãos Grimm projeto gutenberg html navegador - Google Chrome Notebook 81 The Aesthetics of Sufficiency: On Conceptual Writing lareviewofbooks.org --- epub (?) Social Book - browser Google Chrome Notebook 82 Speaking Truth to Power Aaron Swartz --- epub (?) Social Book - browser Google Chrome Notebook 2.3. ESTADO DA ARTE O Estado da Arte foi realizado entre o final do ano de 2012 e o início do primeiro semestre de 2013, a partir do banco de dados da CAPES de teses e dissertações desenvolvidas no Brasil. Ao realizar esta etapa, o problema de pesquisa ainda não estava na configuração atual, o que concentrou a pesquisa em torno dos termos “livro digital”, “livro”, “e-book” e “hipertexto”. Inicialmente optou-se pela configuração padrão de busca, a qual procura no banco de dados todas as palavras digitadas no campo de busca, estando elas próximas ou não dentro do trabalho pesquisado. Dessa forma obtiveram-se muitos resultados, entretanto poucos realmente abrangiam o que era referido. Por iniciar a pesquisa com as palavras “livro digital”, os resultados que surgiram eram de assuntos muito variados, contemplando ora um e ora outro termo, inclusive foram associados a pesquisas de medicina, de informática, de biologia etc., ou seja, o termo “livro” referia-se a alguma bibliografia utilizada no estudo e, o termo “digital” a uma tecnologia digital. Assim, obtiveram-se 444 respostas para os termos “livro digital” e, a partir da revisão destas, observando os títulos e resumos, foram separados 44 teses/dissertações que tangenciavam o tema de alguma forma, algumas delas falando apenas do livro em si, as quais foram julgadas pertinentes para constar no Estado da Arte, já que para refletir sobre o e-book, é necessário pensar sobre o livro de um modo geral e sobre o que ele representa. Todos os itens selecionados nesta busca estão listados na tabela do Apêndice A. Ao procurar por “livro eletrônico leitor”, o resultado foi mais objetivo: 32 teses/dissertações; das quais 9 se destacaram por serem diferentes do obtido anteriormente e relacionarem-se com o tema em questão. Também foi buscado “e-book”, onde das 217 teses/dissertações listadas, 10 possuíam relação com 45 pesquisa. Ao redigir o termo “hipertexto”, já que é um dos assuntos que perpassam o livro digital, foi localizado 581 teses/dissertações e, antes de aprofundar nestas, preferiu-se afunilar a busca, juntando ao vocábulo “hipertexto” a palavra “leitor”, o que fez com que o escopo diminuísse para 89, dos quais 29 pode-se supor, pelo resumo exposto e título, que tinham relação com esta dissertação. Ainda foi efetuada uma nova busca com restrição de “expressão exata” para os termos já pesquisados, obtendo 5 resultados para o termo “e-book livro digital livro eletrônico”; 5 para “livro digital”; 25 para “livro eletrônico” (dos quais apenas 21 eram realmente sobre esse assunto) e ainda 217 teses/dissertações para o termo “e-book” (onde 22 pareceram realmente enfocar esse tema). Muitas dessas teses/dissertações já constavam nas buscas anteriores e uma deles se destacou por aparecer nessas quatro últimas listagens, estando indexada sob os quatro termos (o nome dessa pesquisa é “Os e-books infantis em análise”). Portanto, através das palavras-chaves, chegou-se a um total de 1.029 teses/dissertações, das quais se pode perceber, através da leitura dos títulos e resumos, que apenas 140 realmente tangenciavam o assunto buscado, salientando que, como algumas teses/dissertações se repetiam, na construção da tabela foram eliminadas as repetições. Finalizando esta etapa da análise com 73 teses/dissertações desenvolvidas no Brasil que discorrem sobre livro, livro digital ou hipertexto. Com um olhar mais apurado aos títulos, foram selecionados 29 trabalhos para serem analisados em maior profundidade, sendo que desses 29, obtive acesso a 22 completos. Ao efetivar a leitura, percebeu-se que 4 fugiam do tema de pesquisa, fechando o escopo com 18 teses/dissertações para serem examinadas (as quais estão com o título em negrito na tabela do Apêndice A). Desse grupo, algumas serão incorporadas no referencial teórico, outras se destacaram pela metodologia ou por algum capítulo mais específico. O critério de seleção foi a abordagem a pelo menos um dos temas mencionados a seguir: o livro digital; a mudança do livro impresso para o digital; a história do livro e o hipertexto. Ao observar esses 18 trabalhos percebeu-se três tipos básicos de metodologias abordadas: (1) apenas revisão bibliográfica, às vezes utilizando exemplos ao longo do texto para elucidar alguma questão; (2) revisão bibliográfica e 46 análise de obras (livros digitais ou sites); (3) revisão bibliográfica e entrevistas/questionários. O primeiro grupo era composto por cinco trabalhos: Mathias (2011), Alves (2012), Ribeiro (2009), Bastos (2005) e Gomberg (2006); no segundo, que envolvia análise de obras, cinco: Aquino (2008), Ludwig (2010), Longhi (2004), Minchillo (2001) e Spalding (2012); e, no terceiro, que também realizava entrevistas/questionários, oito: Lazzari (2012), Salgado (2008), Conceição (2007), Dadico (2011), Mello Jr. (2006), Rosa (2008), Moraes (2012) e Araújo (2006). 3. O LIVRO IMPRESSO: MATERIALIDADEE HISTÓRIA O livro é um objeto cuja história se mistura com a leitura, sendo esta uma prática que pode ser comparada a um jogo, pelo qual o leitor, através dos índices verbais e não-verbais apresentados, elabora hipóteses a serem confirmadas, descartadas e/ou reconfiguradas ao longo do texto. Nesse ato, o resultado depende de “dois conjuntos de fatores: (1) os relacionados aos leitores e às comunidades de interpretação nas quais estão inseridos; e (2) os relacionados aos textos e a sua materialidade” (CHARTIER, 199640 apud GRUSZYNSKI, 2007, p. 121). Este estudo se debruça sobre o segundo grupo de fatores, mais especificamente naquele que tange ao aspecto da materialidade, refletindo sobre como a transposição do texto para os suportes digitais altera as potencialidades de mediação editorial do livro digital e interfere diretamente no produto final que chega ao leitor. O projeto gráfico de um livro, ao ser elaborado, objetiva construir um sentido, direcionar o leitor para um conjunto de expectativas, que poderão ser confirmadas ou reformuladas ao longo da leitura (GRUSZYNSKI, 2007). Entretanto, muitos leitores não tem consciência dessa ação, e como disse Gruszynski (2007, p. 21), “Quem sabe ler, gradualmente esquece a letra e vê/ouve a palavra, a frase, o texto”. Em virtude dessa passagem automatizada do visual para o sonoro é gerada uma pretensa invisibilidade à formatação da palavra escrita, todavia esse fenômeno não significa que o leitor está “imune” aos estímulos dados pela materialidade do texto (GRUSZYNSKI, 2007; CHARTIER, 1997), inclusive muitos autores defendem que o projeto visual deve permitir que o leitor seja absorvido pelo conteúdo, facilitando esse processo de apreensão, ao invés de se interpor a ele (HENDEL, 2006). Também se observa “que as sensações provocadas pelo livro como objeto, quando conscientemente percebidas, antecedem a leitura, não coincidem com essa” 40 CHARTIER, Roger (Org.). Práticas de leitura. São Paulo: Liberdade,1996. 48 (DADICO, 2011, p. 61), sendo mais evidentes no momento da escolha, aquisição ou conservação da obra. Vale ressaltar que Todo o design lida com um problema comunicacional, pois ele se dirige a alguém que deve compreender seu trabalho. O designer necessariamente dialoga com um outro quando produz, seja ele consideradocomo público-alvo ou leitor modelo. [...] A construção de sentido pela leitura está em contínuo movimento e se sustenta em hipóteses sugeridas pelo texto e pelo contexto. O texto do autor e a organização visual proposta pelo designer levam em consideração quem lê e a pretensa situação de recepção (GRUSZYNSKI, 2007, p. 175). Para que o livro digital possa ser acessado, são necessários um aparelho (hardware) e um programa41 (software). Estes figuram decisivamente para a boa recepção do conteúdo da obra, porém muitas vezes limitam as possibilidades que poderiam ser exploradas na diagramação efetivada na organização do texto e, ainda, nas possíveis interatividades disponibilizadas ao leitor através do artefato digital. Ao se observar as especificidades de cada aparelho e software, é necessário relativizar suas características materiais com seu uso, levando em consideração onde será usado, os aparatos necessários para assessorar a utilização do aparelho etc. (DOURISH, 2004) 42. O estudo da materialidade do livro digital é de grande valia para a área da comunicação e informação, pois que as características não verbais que podem ser atribuídas ao texto auxiliam o leitor a se preparar para a leitura, inserindo-o "sobre um sistema de expectativa" e inscrevendo-o "numa trajetória previsível" (VIGNER, 198843, p. 33 apud GRUSZYNSKI, 2007, p. 130), onde poderá confirmar suas hipóteses ou ser surpreendido por uma abordagem diferenciada. A apresentação do texto “pode contribuir para uma ampliação do repertório do leitor e/ou comprometer a percepção da mensagem” (GRUSZYNSKI, 2007, p. 130). Sendo assim, pode-se dizer que “a forma do objeto escrito dirige sempre o sentido que os leitores podem dar àquilo que leem” (CHARTIER, 1999, p. 128). Por consequência, pressupõe-se que, a cada nova reedição, formato ou versão de um mesmo texto, a obra não será 41 No caso dos aparelhos móveis, a mídia convencionou chamar os programas do mesmo de aplicativos (apps). Em virtude de sua igual função, neste trabalho os termos “programa”, “software” e “aplicativo” serão tratados como sinônimos. 42 Este trabalho enfoca o artefato, diferente de Dourish, que traz uma abordagem mais relacionada aos usos do mesmo. Em trabalhos futuros, pensa-se em trazer um olhar mais voltado para a utilização dos livros digitais, alinhado à perspectiva de Dourish. 43 VIGNER, Gerard. Inter-textualidade, norma e legibilidade. In: Galves, Charlotte et al (Ed.). O texto: escrita e leitura. Campinas, SP: Pontes: 1988, p. 31-31. 49 a mesma, pois carregará outros significados (CHARTIER, 1999), “cada reencarnação de um texto tem por público-alvo um novo público, cuja participação e expectativas são dirigidas não apenas pelos autores, mas por estratégias de publicação, ilustrações e tantos outros aspectos físicos do livro” (LYONS, 1999, p. 10). Gumbrecht (1998, p. 359) também mencionou a possibilidade do leitor atentar para “as qualidades sensoriais em que os significantes da linguagem transcendem sua função tradicional de transmitir significado44”, sugerindo a atenção ao layout e ao próprio ritmo imposto pelo texto, que se faz presente mesmo em uma leitura silenciosa. No caso do livro impresso, o processo de produção de uma edição culmina em um objeto com cópias consideradas idênticas; portanto todos os leitores de uma ou outra edição terão acesso ao “mesmo” livro. Já ao pensar no livro digital, o próprio equipamento do leitor, que permitirá a visualização e interação com o exemplar, por possuir características específicas, pode apresentar-se de forma diferente a cada leitor, conforme o aparelho que este utilizar. Além disso, Landow (2006) mostrou que depois da passagem do manuscrito para o livro, a mudança para o meio digital foi o grande acontecimento na sua história. O autor separou esses dois momentos em dois grandes grupos: de “texto rígido” (hard text) e de “texto flexível” (soft text), caracterizando o primeiro como rígido e fixo pelas características do papel e da tinta, já que depois de impressos ou escritos, o texto não poderá mais ser modificado e, o segundo, tratou como flexível, já se referindo ao digital, pois como sua informação é feita por códigos que podem ser alterados, possibilita a “multiplicidade da impressão, mas não a fixidez, confiabilidade e estabilidade dos textos escritos ou impressos” 45 (LANDOW, 2006, p. 34, tradução nossa). Sabe-se que uma nova tecnologia emerge de um contexto cultural, a partir do remodelamento (refashion) de outra mídia e é incorporada no mesmo contexto ou em contextos similares, modificando também as mídias existentes anteriormente (BOLTER; GRUSIN, 2000). Para referir-se a esse fenômeno, Bolter e Grusin (2000) criaram o conceito de remediação (remediation) para falar justamente dessa lógica 44Citação original: […] because it directed the reader's attention to sensual qualities in which the signifiers of language transcend their traditional function of conveying meaning. 45 Citação original: “multiplicity of print, it does not the fixity – and hence the reliability and stability – of either written or printed texts” 50 formal que uma nova mídia se apropria das anteriores, repetindo-as ou alterando-as. Para os autores, a mescla dessas mídias – da nova com a antiga – pode acontecer de diferentes formas, dando-se ênfase à mídia antiga, buscando deixar a nova mídia mais transparente, buscando um contato direto com a mídia anterior através da nova, o que seria chamado de imediação (immediacy); ou enfatizando as características da nova mídia, o que eles definiram como hipermediação (hipermediacy). Muitas vezes a imediação e a hipermediação estão presentes no mesmo artefato, alternando de acordo com a observação do usuário. No caso do livro digital visto no tablet, ora a atenção pode ser despertada pela simulação do livro impresso (imediação), ora pelo próprio aparelho que promove essa visualização e que também promove a percepção de materialidade, diferente do livro impresso (hipermediação). Ao longo deste trabalho, a remediação do livro impresso no digital foi abordada de diferentes maneiras. A partir da constatação da importância da materialidade na construção do sentido, a próxima seção trata sobre as características do livro a partir da sua configuração como objeto. Logo a seguir, entra-se na história do livro percebendo as suas alterações e como elas foram transformando o livro até a inserção da tecnologia digital, com o e-book. 3.1. O LIVRO IMPRESSO A PARTIR DE SUA MATERIALIDADE Dadico (2011) aplicou o “método fisiognômico”, desenvolvido e utilizado por Theodor Adorno46 para analisar o rádio, a fim de observar o livro impresso. A autora tentou observar a materialidade do livro, ou seja, as características iminentes ao suporte e não ao seu conteúdo, chegando a cinco particularidades: “a) a ilusão de proximidade; b) a conservação temporal; c) a ubiquidade relativa; d) a semi-padronização; e) a unidade portabilidade-fluidez” (DADICO, 2011, p. 63); as quais serão explicadas nos próximos parágrafos. Dadico (2011) afirmou que o leitor inclina-se a sentir uma ilusão de proximidade do autor, através do livro, como se este, por intermédio daquele texto, se dirigisse a ele, ao leitor, como indivíduo. Essa característica pode ser ilustrada 46 ADORNO, T.. Current of music: elements of a radio theory. Frankfurt: Suhrkamp, 2006. 51 pelas palavras de Manguel (1997, p. 106): “O livro em minha estante não me conhece até que eu o abra, e, no entanto tenho certeza que ele se dirige a mim e a cada leitor”. Contraditoriamente essa ilusão é intensificada, “pelo caráter não imediato do livro” (DADICO, 2011, p. 64, grifo da autora), já que, ao ler, o leitor atualiza aquele conteúdo, trazendopara o seu presente o que foi escrito no passado. Vale lembrar que principalmente no caso do livro impresso, o texto sempre terá sido escrito em um tempo consideravelmente anterior ao processamento da leitura, tendo em vista todo seu processo de revisão, produção e distribuição. A ubiquidade relativa estaria relacionada ao fato de que, apesar de existirem vários exemplares de um mesmo livro, estes não seriam consumidos em um mesmo momento por diversos leitores. Ao mencionar a semi-padronização, a autora referiu-se tanto à produção do livro quanto à ampliação do público para o best-seller. “Os conteúdos do livro, ainda que impelidos para a padronização, sobretudo no caso dos best-sellers, dependem do empenho do leitor para serem consumidos, de modo que só alguma medida é possível forçar uma estandardização – ou nivelação pela média” (DADICO, 2011, p. 69). Ao tratar da condição unidade portabilidade-fluidez, Dadico (2011) reuniu os atributos de portabilidade, que é relacionado ao livro, e fluidez, que considera inerente à sua leitura. Ao agregar esta última característica, ela pensou mais especificamente no modelo de leitura distraída47, o qual considerou bastante emblemático no cenário atual. A portabilidade estaria relacionada à possibilidade de o leitor levar um livro de um lugar para outro e a fluidez ao controle de seu ritmo de leitura. A partir das propriedades do papel, da tinta, da qualidade da encadernação etc., o livro impresso possui uma conservação temporal. “Esse caráter de durabilidade torna o livro passível de uso repetido e continuado. Sua leitura pode acontecer anos depois do tempo que foi escrito ou editado” (DADICO, 2011, p. 65). A autora viu essa “imutabilidade” como uma das particularidades que confere autoridade ao livro, já que o autoriza a servir como testemunho material de um discurso de seu autor, que pode então ser conservado intacto no tempo. Nielsen (2000, p. 4) percebeu como uma desvantagem da publicação impressa, a incapacidade “de reimprimir e distribuir imediatamente este livro caso 47 Leitura sem concentração, na qual o leitor pula trechos (DADICO, 2011). 52 seja preciso atualizar qualquer erro ou avanços tecnológicos”. Tal observação corrobora com o aspecto da conservação temporal, apontada por Dadico (2011). O meio digital com sua possibilidade de atualização, pode induzir a uma publicação mais rápida, tendo em vista que à medida que as incorreções vão sendo percebidas, podem ser alteradas e atualizadas mais facilmente. No entanto, outra faceta do setor editorial que emergiu nos últimos anos foi a impressão sob demanda, onde o arquivo é armazenado digitalmente, para ser impresso e encadernado quando solicitado pelo leitor, reconfigurando a possibilidade de correções e atualizações no meio impresso. A impressão sob demanda existe desde 1997 nos Estados Unidos. “A tecnologia aprimorou-se com o passar do tempo, e os livros impressos sob encomenda são atualmente indistinguíveis da maioria dos volumes” (COSTA, F., 2012, online). No Brasil, os empreendedores Índio Brasileiro Guerra Neto, Ricardo Almeida e Anderson de Andrade criaram o site Clube de Autores, em 2009, no qual “Quem quiser divulgar qualquer tipo de livro, a qualquer hora, pode fazê-lo sem qualquer custo [para o autor]. […] A edição pode ser feita a qualquer momento, sem necessidade de criar outro volume ou esperar esgotar as versões impressas” (LIMA, 2013, online). Diante dessa possibilidade de atualização tanto no impresso como no digital, o confronto entre estabilidade vs. instabilidade e fixidez vs. fluidez pode ocorrer em qualquer instância, inclusive nos documentos em papel. Sendo assim, deve-se seguir um padrão convencionado que estará ligado ao ritmo de fixidez e de fluidez, ou seja, necessita-se definir “qual a informação que se mantém fixa, quando pode ser alterada e por quem” (LEVY, 200148, p. 36-37 apud FURTADO, 2006, p. 130). O documento em papel pode deixar de ser validado em função da expedição de outro mais novo, mas se deve lembrar que o papel original, mesmo depois de alterado, provavelmente deixará rastros do seu conteúdo, como um palimpsesto. O mesmo não ocorre com o arquivo digital, uma vez que, a menos que se tome um cuidado de registrar que o mesmo foi alterado, parecerá sempre um novo arquivo. Furtado (2006, p. 130) explicou que a “capacidade para fixar a fala, para garantir a sua repetibilidade, encontra-se na base da cultura humana” e, pelas palavras de Dadico (2011) e Gomberg (2006) – que serão vistas a seguir – pode perceber-se que a ideia 48 LEVY, D. M. Scrolling Forward: making sense of documents in the digital age. New York: Arcade Publishing, 2001. 53 de fixidez está arraigada ao livro em papel. Com o manuscrito e o impresso, “o livro foi valorizado por sua capacidade de preservação e de exibir estruturas fixas” (BOLTER, 2001, p. 9749).Vale salientar que “Por milhares de anos, foi associado com o impresso o ideal de estabilidade: o impresso supostamente preserva e promove uma estável, autoritária e ainda, vital, cultura literária” (BOLTER, 2001, p. 20850). Colaborando com a ideia da propriedade de conservação temporal do livro, Gomberg (2006, p. 96) afirmou que “um texto impresso sob a forma de livro sempre remeterá a um tempo e a um espaço próprios, de onde ele surgiu e se constituiu como uma obra literária” . O autor demonstrou, em sua análise, uma visão romântica sobre o objeto, o que, aliás, condiz com sua proposta de pesquisa: a aura do livro impresso apesar de sua reprodutibilidade técnica. Em seu trabalho ele observou que esse tipo de publicação – diferentemente da obra de arte analisada por Benjamin (193351) – ao ser copiado, ainda cumpre uma função ritual, portanto possui uma aura. Entre os quesitos que o levam a essa conclusão, ele ressaltou a temporalidade congelada existente no livro (como foi comentado no parágrafo anterior), o público seleto de cada livro, os processos de avaliação do texto antes do mesmo ser publicado, a existência de um ritual de lançamento e, por fim, a consagração de um lugar de culto (a biblioteca). Gomberg (2006) afirmou que o público é relativamente seleto, já que nas publicações nacionais, “cada tiragem é feita de, em media, dois mil exemplares, iguais uns aos outros” (Gomberg, 2006, p. 88) e, considerando que o Brasil em 2012 tinha 199,2 milhões de habitantes (IBGE, online), dois mil exemplares realmente atingiriam uma fatia muito pequena da população brasileira; porém, levando-se em conta o caso dos best-sellers, o livro poderia ser visto como uma mídia de grande alcance e, historicamente, foi de fato a primeira mídia a conseguir atingir um grande público (MCLUHAN, 1964; 1972). Nestas e em outras observações de Gomberg (2006), percebe-se que ele se baseou apenas em um modelo idealizado de livro, leitor e leitura, quando na verdade existem vários, inclusive o abordado pelo autor. Chartier explica que: 49 Citação original: “the book was valued for its capacity to preserve and display fixed structures”. 50 Citação original: “For hundreds of years, we had associated with print an ideal of stability: print was supposed to preserve and promote a stable, authoritative, and yet vital literate culture, […].” 51 BENJAMIN, W. [1933] (1985) A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo: Brasiliense. 54 Todos aqueles que podem ler os textos, não os lêem[sic] da mesma maneira, e a diferença é grande entre os letrados virtuosos e os leitores menos hábeis, […]. [Existem] Contrastes, também, entre normas e convenções de leitura que definem, para cada comunidade de leitor, utilizações legítimas do livro, modos de ler, instrumentos e processos deinterpretação. Contrastes, finalmente, entre as expectativas e os interesses bastante diferentes […] (1997, p. 14-5). Roger Chartier (1997) questionou as ações contraditórias impostas pela existência do objeto livro, visto que se, por um lado, o leitor possui uma série de obrigações e instruções para ler “da forma correta” aquele conteúdo, por outro, ele pode subverter aquilo que está escrito ou que é instruído, lendo por entre as linhas. Dadico (2011) tratou dessa autonomia do leitor utilizando o termo fluidez e com essa palavra a autora se refere ao ritmo da leitura, ditado por aquele que está lendo. Para Chartier (1997), o livro sempre tenta instaurar uma ordem em algum sentido – uma ordem de como deve ser entendido, de sua decifração ou aquela determinada por quem encomendou a obra – “No entanto, essa ordem […] não detém o poder absoluto para anular a liberdade dos leitores” (CHARTIER, 1997, p. 6). Sendo assim, o livro impõe uma ordem, que pode ser seguida ou não pelo seu leitor, quer seja no meio impresso ou no meio digital. No impresso essa sequência é induzida pela paginação e pelo sumário, no meio digital pode ser explorada de outras formas, como será abordado no capítulo 5.2A prática hipertextual: múltiplos caminhos para um leitor. 3.2. A CONSTITUIÇÃO DO LIVRO: DO MANUSCRITO AO IMPRESSO (RESGATE HISTÓRICO) Os primeiros materiais que surgiram para servir à escrita foram a argila, o papiro e o pergaminho/velino. A argila existia em abundância na Suméria, o que possibilitou a utilização do material para fazer inscrições, através de um estilete de junco. Após as incisões ela era posta para secar ao sol ou em um forno, adquirindo a dureza de uma rocha (MEGGS; PURVIS, 2009). Normalmente, as tabuletas de argila cabiam na palma da mão. “Um livro consistia de várias tabuletas, mantidas talvez em uma bolsa ou caixa de couro” (MANGUEL, 1997, p. 149). Apesar de ser portátil, à medida que aumentava a necessidade de mais folhas, tornava-se demasiadamente pesada e pouco prática. Os mais antigos registros escritos são tabuletas de Uruk, datadas 55 em 3.100 a. C (MEGGS; PURVIS, 2009). O rolo em papiro – também chamado de volumen – foi inventado no Egito, já sendo utilizado três mil anos antes de Cristo e era produzido com hastes secas e divididas, extraídas da planta Cyperus papyrus (uma espécie de junco) que crescia às margens do rio Nilo. A utilização desse material também era facilitada pela grande quantidade da matéria-prima que a natureza da região providenciava. “A folhas mais altas de papiro mediam 49 centímetros e até vinte folhas podiam ser coladas umas sobre as outras e enroladas, com a face recto voltada para dentro” (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 29).Um livro poderia estar inscrito em 20 rolos ou mais e, para ser possível sua leitura, fazia-se necessário a utilização das duas mãos do leitor, de modo que enrolasse [com] uma enquanto desenrolava [com] a outra. A navegação, para usar um termo contemporâneo, era bastante dificultada, dado que para ir do início ao fim do texto era preciso enrolar/desenrolar todo o rolo. A leitura deveria ser sequencial, sendo impossível folhear ao acaso, ir e vir, como fazemos com o livro contemporâneo. Além da navegação, destaca-se a dificuldade de transporte dos rolos, sua péssima portabilidade (GONÇALVES, 2009, p. 86). Em função do preço do papiro comercializado pelo rei do Egito (MANGUEL, 1997; MEGGS, PURVIS, 2009), por volta de 190 a.C. começou a ser utilizado o pergaminho ou o velino, ambos provindos de peles de animais, sendo o primeiro particularmente de bezerros, carneiros e cabras e, o segundo, que é “o mais refinado, é feito da pele macia de bezerro recém-nascido” (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 47). O pergaminho apresentava problemas ao ser usado como rolo, pois a emenda, que era necessária para aumentar o comprimento das folhas, ficava muito grotesca. A solução encontrada para aproveitar esse material foi usá-lo dobrado, surgindo assim o códex52, sendo que a cada número de dobras feitas, o produto recebia um nome diferente: “dobrado uma vez, o pergaminho tornava-se um fólio; dobrado duas vezes, um in-quarto; dobrado mais uma vez, um in-octavo” (MANGUEL, 1997, p.152). Após serem dobrados, “eram costurados e combinados em códices com páginas como as de um livro moderno” (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 47). O que os contemporâneos da época perceberam é que a dobra apresentava uma melhor solução do que o rolo, pois diante da necessidade de serem adicionadas mais informações, tornava-se mais fácil acrescentar um caderno, do 52 Alguns autores preferem utilizar a grafia codex e outros utilizam o termo traduzido para o português, códice. 56 que acrescer um rolo. “Com a nova materialidade do livro, gestos impossíveis tornavam-se comuns: assim, escrever enquanto se lê, folhear uma obra, encontrar um dado trecho” (CHARTIER, 2002, p. 106). A nova configuração transformou a relação do leitor com o texto, uma vez que o livro podia repousar em uma mesa enquanto era lido, mantendo-se as mãos livres para tomar notas, já que elas só seriam requisitadas para a finalidade de dar continuidade à leitura, no final de cada página, quando se faria necessário folheá-la para dar acesso ao prosseguimento na narrativa (CHARTIER, 1999; MEGGS, PURVIS, 2009). Mesmo possibilitando novos usos, as mudanças ocorridas nas representações do antigo livro da época – o rolo – ainda se mantinham presentes (da mesma forma que hoje em dia ainda quando se pensa em livro, a associação direta é ao modelo impresso e não ao digital). Chartier (1997) mostra que Santo Agostinho, em Cidade de Deus, por exemplo, utilizava o termo codex para se referir ao objeto físico que carregava o texto e a palavra liber (livro) servia para marcar as divisões da obra; assim, neste exemplo, Cidade de Deus contém vinte e dois liber, cada um correspondente à quantidade de texto que podia conter em um rolo; “mantendo a memória da antiga forma, visto que o “livro”, se transformou aqui em unidade de discurso” (CHARTIER, 1997, p. 145). À medida que o códex se afirmava como livro, “os autores integraram a lógica de sua materialidade na própria construção de suas obras” (CHARTIER, 2002, p. 108), transformando o conteúdo que antes era contido em vários rolos, partes ou capítulos de um mesmo discurso, em uma única obra. No entanto, essa transição foi lenta. Com a possibilidade de se utilizarem os dois lados da folha para gravar o conteúdo, houve uma grande redução no custo de fabricação deste tipo delivro, “mas não foi acompanhado por outras possíveis economias: diminuição do módulo da escrita, encolhimento das margens, etc.” (CHARTIER, 1997, p. 144). A possibilidade do códex de reunir grande quantidade de texto em um volume menor só veio a ser incorporada a partir do século IV e V, período em “que os códex aumentam, absorvendo o conteúdo de vários rolos” (CHARTIER, 1997, p. 144). A partir da sua configuração, foi possível desenvolver-se uma sinalização mais fácil, viabilizando-se um melhor manuseamento do texto, já que se “torna possível a paginação, a criação de índice e de índice alfabético, a comparação de uma 57 passagem com outra, ou ainda a travessia do livro por inteiro pelo leitor que o folheia” (CHARTIER, 1997, p. 144). Assim como a possibilidade de se utilizar o códex para agrupar maior quantidade de texto não foi explorada inicialmente, a ideia que se tem hoje dos livros “como unidades textuais dotadas de uma identidade própria” (CHARTIER, 2002, p. 110) surgiu apenas por volta dos séculos XIV e XV. Chartier (2009) frisou essa mudança evidenciando o surgimento do libro unitário. Essa nomenclatura sugere que uma única obra, autor ou textos, que fossem relacionados a um mesmo tema, seriam reunidos em uma mesma encadernação. Tal ato significava romper com a tradição segundoa qual o livro manuscrito é uma junção, uma mistura de textos de origem, natureza e datas diferentes, e onde, de forma alguma, os textos incluídos são identificados pelo nome próprio de seu autor. Para que exista um autor são necessários critérios, noções, conceitos particulares. O inglês evidencia bem esta noção e distingue writer, aquele que escreveu alguma coisa, e o author, aquele cujo nome próprio dá identidade e autoridade ao texto (CHARTIER, 1999, p. 32). Portanto, a definição do livro modificou-se, “para nós, é ao mesmo tempo um objeto dos outros objetos da cultura escrita e uma obra intelectual ou estética dotada de identidade e coerência atribuídas ao autor” (CHARTIER, 2009, p. 41-42). Antes da possibilidade de impressão, os livros eram manuscritos, ou seja, copiados à mão. Esse fator humano, agregado a este tipo de produção, impedia que houvesse uma padronização rigorosa. No mosteiro, o livro era tratado primeiramente como um bem patrimonial da comunidade e representava o acúmulo do saber, mas a finalidade de sua confecção não era a leitura e, sim, o registro dos hábitos religiosos: “a ruminatio do texto, verdadeiramente incorporado pelo fiel, a meditação, a oração” (CHARTIER, 1997, p. 138-9). Em função da tecnologia e cultura da época, havia um isolamento regional e uma dificuldade de viajar muito grande, que “resultavam numa disseminação muito lenta de inovações e influências” (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 64). A partir do século XII, com as escolas urbanas tudo muda: […] o local da produção do livro […], as formas do livro […], já não é participação no mistério da palavra, mas sim decifração regulada e hierarquizada da letra (littera), do sentido (sensus) e da doutrina (sementia) (CHARTIER, 1997, p. 138-9). Outra característica presente nos dias de hoje é a padronização entre os exemplares de uma mesma edição. A instituição de um padrão só foi possível com a prensa tipográfica, onde então as páginas eram impressas a partir da mesma matriz 58 (MCLUHAN, 1972). O papel e a impressão foram inventados na China e durante o período medieval se disseminou lentamente para o Ocidente, chegando à Europa quando começava o renascimento. Esse período de transição da história europeia começou na Itália do século XIV e foi marcado por uma redescoberta do conhecimento clássico, um florescimento das artes e os primórdios da ciência moderna. Tudo isso contou com a ajuda da impressão (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 62). Em meados do século XV, foi inventada a prensa de impressão com os caracteres móveis e, consequentemente, “a cópia manuscrita deixa de ser a única fonte disponível para garantir a multiplicação e a circulação dos textos”. (CHARTIER, 1997, p. 133). O tipo móvel entalhado em madeira foi inventado na China, mas o grande alfabeto desse país, composto por mais de 44 mil caracteres, prejudicava o uso disseminado dessa técnica. A mecanização da produção de textos foi buscada por gráficos na Alemanha, Holanda, França e Itália. Embora haja controvérsias, historicamente se atribui a Johan Gutenberg o ato de reunir “pela primeira vez os complexos sistemas e subsistemas necessários para imprimir um livro tipográfico por volta de 1450” (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 95). Seu primeiro livro impresso com tipos foi a Bíblia, com 42 linhas por página. Como se pode perceber, ao longo da história, quando surge uma nova tecnologia, a anterior é incorporada de alguma forma, acontecendo uma remediação (BOLTER; GRUSIN, 2000). Dessa maneira, Gutenberg e os outros impressores tentaram imitar a arte dos escribas, o que pode ser constatado na maioria dos incunabulas, os quais possuem aparência de manuscrito (MANGUEL, 1997, LYONS, 1999, CHARTIER, 1997, BOLTER, 2001). Bolter (2001) afirmou que a única forma de perceber que esses primeiros livros eram produtos de um processo mecânico seria analisando o espaçamento e as hifenizações, já que “mesmo um bom escriba não conseguiria alcançar resultados tão regulares como aqueles obtidos com a prensa” 53 (BOLTER, 2001, p. 7). Chartier (1997) ainda complementou que o livro impresso, além de imitar todos os detalhes do manuscrito, deveria “ser terminado a mão: a mão do iluminador […], do revisor […], do leitor […]” (CHARTIER, 1997, p. 133). 53 Citação Original: Gutenberg's Bible can hardly be distinguished from the work of a good scribe, except perhaps that the spacing and hyphenation are more regular than a scribe could achieve. 59 Eisenstein (198354, p. 20 apud BOLTER, 2001, p. 14) notou que “a aparente falta de mudança no produto foi combinada com uma completa mudança nos métodos de produção” e por não haver uma ruptura na forma como o livro era apresentado, a mecanização tornou-se mais palatável ao grande público, apresentando, paradoxalmente, uma “aparente continuidade com uma mudança radical” (EISENSTEIN, 198355, p. 20 apud BOLTER, 2001, p. 14). A Bíblia de Gutenberg, como os outros manuscritos da época, ainda “era comprada em folhas reunidas e encadernada pelos compradores em grandes e imponentes tomos” (MANGUEL, 1997, p.160). Como se expôs anteriormente, o livro ainda não era um objeto único dotado de unidade textual, sendo essa tarefa reservada ao próprio leitor, que encadernava os livros que lhe pertenciam, muitas vezes agrupando vários cadernos adquiridos sem que necessariamente discursassem sobre o mesmo assunto ou fossem de um mesmo autor. Aos poucos, os editores adquiriram maior controle sobre a produção dos livros, proporcionando um produto mais padronizado. Com a popularização da ideia de libro unitario, as encadernações passaram a ser feitas a priori, mas no início ainda era necessário pedir ajuda ao próprio leitor para finalizar a edição adquirida, convidando-se o dono da obra “a fornecer seus próprios meios auxiliares de leitura, pedindo-lhe que este numerasse as páginas, marcasse letras maiúsculas em vermelho e acrescentasse sua própria pontuação” (LYONS, 1999, p. 14). Entre os séculos XVI e XVIII, a organização visual do texto começou a mudar; a página foi ganhando mais espaços em branco, o que é perceptível “através da multiplicação dos parágrafos que quebram a continuidade ininterrupta do texto e a das alíneas que tornam imediatamente visíveis, pelos recuos e formação dos parágrafos, a ordem do discurso” (CHARTIER, 1997, p. 25). Por intermédio dessa nova apresentação, os editores ofereceram uma nova leitura dos mesmos textos reeditados, “uma leitura que fragmenta os textos em unidades separadas e que reencontra na articulação visual da página a leitura, intelectual ou discursiva, do argumento” (CHARTIER, 1997, p. 25). Um dos pioneiros dessa nova apresentação dos textos, foi o humanista italiano Aldus Manutius. Descontente com os livros produzidos até então, em 1453 54 EISENSTEIN, E. The printing revolution in early-modern Europe. Cambridge: Cambridge University Press. 1983. 55 Ibid. 60 ele resolveu criar sua própria editora para produzir os exemplares que eram necessários aos cursos que ministrava. Seus volumes, que em grande maioria eram reedições de clássicos greco-romanos, primavam pela simplicidade e elegância; sua diagramação priorizava a legibilidade do texto e não as ornamentações como as publicações contemporâneas da época (MANGUEL, 1997). As mudanças das configurações visuais, ocorridas na passagem do século XVII para o século XVIII, puderam ser percebidas na edição das peças de William Congreve. Ao analisar esses exemplares, o pesquisador D. F. McKenzie56 conseguiu mostrar como alterações formais aparentemente insignificantes (a passagem do in-quarto para o in-octavo, numeração das cenas, a presença de um ornamento entre cada uma delas, a indicação na margem do nome daquele que fala, a referência das entradas e das saídas) tiveram efeito importante no estatutodas obras. Uma nova legibilidade fora criada, pelo formato mais manejável e pela paginação que restituíram no livro um pouco do movimento da encenação, quebrando assim convenções antigas que imprimiam as peças sem nada restituir da sua teatralidade. Uma nova maneira de ler o mesmo texto, portanto, mas também um novo horizonte de recepção (CHARTIER, 1997, p. 23-4). As alterações na organização visual do texto foram ocorrendo aos poucos, à proporção que alguém percebia a necessidade de eliminar as possíveis ambiguidades que poderiam surgir no momento da leitura. Em determinado momento da história, por exemplo, o texto não era pensado para ser lido em silêncio. As pausas da leitura não eram indicadas visualmente, nem mesmo as palavras eram separadas, sendo que para que se efetivasse a compreensão do que o autor tencionava transmitir com aquele texto, deveria o leitor proceder a leitura em voz alta o que o levava invariavelmente a escutar a sua própria voz, facilitando assim a compreensão da mensagem transmitida. A mudança para uma leitura possivelmente silenciosa e visual começou com “a introdução da separação entre as palavras pelos escribas […] e os seus efeitos são extremamente importantes, abrindo a possibilidade de ler mais rapidamente, portanto de ler mais textos, e textos mais complexos” (CHARTIER, 1997, p. 136). Além do ato de ler em voz alta para ouvir a si próprio, era comum realizá-lo para uma plateia, principalmente porque naquela época, a grande maioria da população era analfabeta. Bolter (2001) percebeu que o contador da história ainda teria uma vantagem frente ao autor contemporâneo: por estar em contato imediato com seu público, poderia manter a expectativa da audiência e deixá-la em suspense 56 McKENZIE, D. F. , Bibliography and the sociology of texts. London, The British Library. 1986. 61 por mais tempo, já que a plateia não saberia quando iria acabar a história. Já em uma leitura individual de um livro impresso, a sensação da virada da página e a percepção de que o livro está chegando ao seu final, poderia alterar essa expectativa. Além disso, o contador de história teria a possibilidade de dar uma nova versão à narrativa, a partir da reação e expectativa do público, o que seria impossível no livro impresso, o qual não pode se adaptar aos desejos dos seus leitores. O que pode ocorrer na leitura do livro é que o leitor, apesar de estar consciente de que o livro conduz a uma ordem preferencial, altere o caminho da leitura a seu critério, pulando trechos ou capítulos inteiros, ou relendo-os posteriormente. Com a popularização da leitura individual, os livros começaram a se transformar para atender melhor esse público. Se outrora não havia nem espaçamento entre as palavras uma vez que eram feitos para ser lidos em voz alta e ouvidos, nesse novo momento as informações ganharam mais ênfases visuais, como letras capitulares, índices, hierarquia de informações – através da diferenciação do tamanho da fonte etc. (BOLTER, 2001) “As poesias heroicas e líricas eram destinadas à performance e as enciclopédias medievais, era projetadas para serem consultadas por leitores individuais” 57 (BOLTER, 2001, p. 105). Através desse pequeno resumo da história do livro, percebe-se que as transformações ocorreram aos poucos, ao longo dos anos. As inovações foram sendo incorporadas, tornando-se características cada vez mais próprias do livro e da leitura. Houve a modificação do suporte (do volumen para o codex), do modo de produção (manuscrito para impresso), da configuração visual (arejamento da página) e da relação conceitual entre o objeto e a obra (construção da ideia do libro unitario). Ao longo desse percurso, surgiram outras tecnologias e materiais, que foram sendo adotados na cadeia de produção e distribuição, gerando alterações no livro e nos seus recursos. Hoje em dia, “as tecnologias eletrônicas penetraram já em todos os aspectos do processo de publicação. […] Em suma, a maior parte dos aspectos e das atividades envolvidas na edição moderna é eletrônica” (BORGMAN, 200058, p. 83 apud FURTADO, 2006, p. 36-7). Contudo, essas modificações não causaram tantos questionamentos ou exclamações por parte do leitor, o que veio a acontecer 57 Citação original: “Heroic and lyric poetry was destined for performance, and medieval encyclopedias, like their ancient counterparts, were designed to be consulted by single readers” 58 BORGMAN, C. L. From Gutenberg to the Global Information Infrastrutucture: Accesss to Information in the Networked World. Cambridge (mass.): The MIT Pres, 2000. 62 quando essas mudanças deixaram de ser associadas apenas ao lado da produção impressa e atingiram o consumidor final com a viabilização do livro digital. 3.3. A INSERÇÃO DA TECNOLOGIA DIGITAL E A REMEDIAÇÃO DO LIVRO Toda a mudança gera conflito e implica em etapas de adaptação, apresentando diferentes níveis de dificuldade para diversas pessoas. Para Bolter (2001), as mudanças que não são conceituais ficam mais fáceis de serem compreendidas. O autor sugeriu que para a confecção do livro, o computador “não desafiaria a noção de escrita convencional e o objetivo dos autores. O processador de texto serviria para realizar cópias impressas e o objetivo final continuaria o mesmo: tinta sobre papel59” (BOLTER, 2001, p. 9). Outras etapas do livro, como, por exemplo, a diagramação do miolo ou o design da capa, também eram feitas no computador, para então serem encaminhadas à gráfica, onde o volume seria impresso, encadernado, costurado etc.. Os produtores das diversas etapas de construção do livro tiveram que aprender a lidar com essas mudanças tecnológicas, mas o consumidor comum seguia recebendo um objeto muito semelhante ao que estava acostumado. Nesse sentido, o uso do computador no processo de produção do livro impresso foi inserido da mesma forma como ocorreu com a prensa tipográfica: o modo de produção alterou-se, mas o produto permaneceu o mesmo (Eisenstein, 198360 apud BOLTER, 2001). Portanto conclui-se que o livro impresso não é um produto isento da utilização da tecnologia digital, já que quase todo o processo de produção editorial atualmente é mediado pelo uso da computação gráfica. Como lembrou Castedo (2012, p. 5): “é preciso levar em conta a tecnologia empregada em sua produção específica, que define em grande parte o processo de transformação do texto em um objeto a ser lido, neste caso, um livro”. Desse modo um dos paradigmas que diferenciam o livro impresso do digital é o uso da tecnologia, sendo que o primeiro a utiliza antes deste chegar ao leitor e o segundo, em todas assuas etapas (produção, distribuição e consumo). 59 Citação Original: “most writers have enthusiastically accepted the word processor precisely because it does not challenge their conventional notion of writing. The word processor is an aid for making perfect printed copy: the goal is still ink on paper”. 60 Ibid. 63 Com a popularização dos computadores pessoais, a leitura digital foi introduzida por meio dessas máquinas, criando-se a seguir um modo de ler em que o texto se movimenta verticalmente, através do scroll (barra de rolagem), que faz com que este vá subindo e o avanço da leitura se processe de forma semelhante ao ocorrido nos tempos do rolo em papiro (CHARTIER, 1999). Outras características também foram incorporadas a esse modelo, como a utilização do mouse para clicar nas palavras – e/ou nas setas – para avançar na leitura e a adaptação do usuário a uma postura imposta pela escrivaninha e a cadeira de escritório (normalmente utilizada junto ao computador). Somando-se todas essas características, construiu-se uma imagem de que o computador não seria o local ideal para esse tipo de leitura.Em 2009, um ano antes do lançamento do iPad, Grunzynski (2009), questionou-se a respeito de onde o livro eletrônico poderia ser encontrado, apontando, então, para os blogs e sites especializados, os quais ofereciam conteúdos para serem baixados ou lidos online. A mudança de posicionamento frente aos livros digitais ficou clara ao comparar-se o posicionamento de três autores, cujas pesquisas foram produzidas em períodos diferentes. Mello Jr. (2006), cuja pesquisa é anterior ao lançamento do e-reader Kindle, concluiu que o livro digital não iria se popularizar. O autor demarcou alguns fatores que corroboraram em prol de sua conclusão: os padrões de softwares adotados, que inviabilizavam a leitura de um mesmo arquivo em diversos aparelhos; os conteúdos disponibilizados que eram de domínio público e de fácil acesso no modo impresso e, ainda, a inexistência de uma segurança para o mercado editorial oferecer seus produtos nesse formato. Já no estudo de Lazzari (2012), concluído seis anos após o trabalho de Mello Jr. (2006), verificou-se que o cenário traçado já se tornava relativamente otimista com relação ao mercado editorial brasileiro, para os próximos cinco anos, tanto para os livros digitais como para os impressos. Alguns dos problemas apontados por Mello Jr. (2006),em 2006, mostraram-se solucionados em 2012, como a facilidade de acesso e a portabilidade dos arquivos, o que foi ilustrado na pesquisa de Ludwig (2012). Como foi comentado anteriormente, durante esse período de 2006 a 2012 houve o lançamento do iPad e de tablets de outras marcas. Cruzando as conclusões desses três pesquisadores, pode-se inferir que um dos diferenciais do tablet sobre o e-reader é a multifuncionalidade. O referido aparelho, assim como o computador e o 64 notebook, é direcionado para uma vasta gama de consumidores que podem fazer diversos usos dessa tecnologia, inclusive ler livros digitais. Com a possibilidade de um maior acesso a este aparelho, que mostra uma tecnologia com a potencialidade de um computador e a mobilidade de um livro, foi superado um dos empecilhos apontados por Mello Jr. (2006), que era a baixa venda de aparelhos. No entanto, a multifuncionalidade, que é positiva para aumentar o número de vendas, pode ser transformada em fator negativo para leitura, ao se levar em consideração uma das conclusões de Conceição (2007), a qual observa que, em função dos diferentes tipos de entretenimento ofertados na rede, a concentração e a imersão do leitor podem ficar comprometidas, principalmente quando houver a necessidade de ele realizar uma leitura mais longa e profunda. Com os resultados dessas pesquisas, pôde-se constatar o impacto que o Kindle e o iPad tiveram na história do livro eletrônico. A ideia de um aparelho digital móvel de leitura originou-se no início dos anos 1970, com a apresentação do projeto Dynabook de Alan Kay (KAY, 1972) e sabe-se que o primeiro aparelho eletrônico dedicado à leitura foi produzido em 1998,o Rocket eBook, lançado pela Nuvo Media Inc.(BOLTER, 2001, p. 80), porém foi somente no final da primeira década dos anos 2000 que todos os outros fatores – sociais, econômicos e culturais – permitiram que o livro digital se expandisse. Para Procópio (2010) os e-readers de primeira geração não se popularizaram em virtude de que o modelo de negócio era ineficiente, isto porque, apesar dos aparelhos serem muito semelhantes aos que são divulgados atualmente, ainda não existiam muitos conteúdos de qualidade disponíveis, ou estes eram de difícil acesso. “Sem conteúdo todos esses hardwares são máquinas vazias, como uma folha de papel em branco, não servem em nada para os leitores” (PROCÓPIO, 2010, p. 77). A mobilização dessas grandes empresas internacionais, tomando à frente no setor de comercialização dos aparelhos móveis – Amazon e Apple – e o aumento do número de livros digitais de qualidade disponíveis61para aquisição de forma gratuita ou não, alavancou o crescimento deste segmento dentro do mercado. Cabe ressaltar que tanto o Kindle quanto o iPad disponibilizam lojas virtuais próprias nos 61 “A Amazon estreou no Brasil [em dezembro de 2012] com mais de 13 mil e-books em português, sendo que mais de 1,5 mil são gratuitos. A Companhia das Letras chegou à Amazon com 500 títulos, e a Globo Livros com 1 mil livros digitais. O usuário brasileiro pode ainda comprar os mais de 1,4 milhão de títulos em outros idiomas, agora disponíveis com preços em reais”(G1, 2012, online). 65 seus aparelhos, respectivamente a Amazon e a iBookstore, para fornecer os livros digitais, facilitando a compra para os usuários. Além dos aparelhos e dos conteúdos disponibilizados para consumo que já foram mencionados, o aumento da concorrência de marcas de hardwares e softwares de leitura também vieram em prol da manutenção dos preços e da criação de novas soluções, que visam melhorar a experiência de leitura como um todo. Procópio comentou que até o final da edição do seu livro, em 2010, contabilizou “cerca de 50 equipamentos diferentes, disponíveis no mercado [específicos] para a leitura de livros eletrônicos” (PROCÓPIO, 2010, p. 49). A familiarização, por intermédio do ato da leitura neste novo display, auxilia os leitores a criarem uma expectativa positiva quanto à absorção dos livros digitais. “A função social dos objetos portadores de texto se traduz […] por hábitos de apresentação, de formato, de paginação, cujo reconhecimento é a primeira etapa de construção do sentido" (CHARMEUX, 199462, p. 78 apud GRUSZYNSKI, 2007, p. 136). Dessa forma, os aparelhos móveis despertam no indivíduo uma antecipação de ideias, projetando-o para relacionar-se com o que lhe será disponibilizado. “Na cultura impressa, uma percepção imediata associa um tipo de objeto, uma classe de textos e usos particulares” (CHARTIER, 2002, p. 109), ou seja, o leitor se prepara de maneira distinta para ler uma carta, um jornal, uma revista, um livro etc., o que ocorre também com a utilização do computador, onde é criada uma expectativa baseada na experiência de leitura nessa tecnologia. Como a maioria dos sites oferece textos curtos, hipertextuais, fragmentados e multimidiáticos, a expectativa criada para ler nesse aparato é distinta daquela cultuada em torno do livro, que, como explicou Bolter (2001, p. 21), “não é apenas a materialidade da mídia impressa que acomoda bem o texto linear, mas também a nossa cultura, que cria a expectativa de que ali tenha um texto linear63” (BOLTER, 2001, p. 21). Portanto, enfatizar a semelhança com o livro impresso e “inscrever-se num contrato de leitura familiar” (FURTADO, 2006, p. 60) pode ter sido o grande diferencial desses aparelhos móveis, que promovem a remediação do livro e prometem a sua imediação. Nas divulgações do livro digital, como será exemplificado no decorrer do texto, é perceptível uma tentativa de evidenciar o livro e apagar o aparato 62 CHARMEUX, Eveline. Aprender a ler: vencendo o fracasso. São Paulo: Cortez, 1994. 63 Citação original: “Linear writing is appropriate to print technology both because the printed page readily accommodates linear text and because our culture expects that printed prose should be linear”. 66 tecnológico que disponibiliza o seu acesso. “O desejo pela transparência é uma característica arraigada na consciência humana, sendo uma escolha histórica e cultural” (BOLTER; GROMALA, 2003, p. 35), perceptível no uso da perspectiva na Renascença, no design modernista do início do século XX e dentro da área do design de interação, desde o início da história das interfaces gráficas. Em 1981, a Xerox introduziu o sistema 8010 ‘Star’ que “consistia em deixar o computador o mais ‘invisível’ possível para os usuários” (PREECE, ROGERS, SHARP, 2005, p. 74) e para isso imaginaram a interfaceque eu tinha escrito e, mesmo eu dizendo que já estava bom, tu davas um jeito de deixar ainda melhor. Eu sei que posso contar contigo para qualquer coisa, desde achar uma agulha no palheiro (e eu sei que se precisar tu acha) até para ir a Porto Alegre, descer minhas coisas de corda pela janela do terceiro andar. Sou muito grata por tudo na minha vida que tu e o pai me proporcionaram, eu não seria nada sem vocês. Te amo mais que o infinito. Ter um e-book é bom. Ter um livro impresso é bom. Ter todos é ainda melhor. Cory Doctorow SEHN, Thaís Cristina Martino. As possíveis configurações do livro nos suportes digitais. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Informação) – Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. RESUMO Esta pesquisa foi efetivada com a finalidade de mapear os artefatos que são atualmente denominados 'livros digitais', caracterizando-os a partir do cruzamento dos recursos próprios do meio digital com as principais especificidades dos livros impressos. A metodologia utilizada abrangeu revisão bibliográfica e observação do objeto de estudo. Para alcançar o objetivo proposto, realizou-se um resgate histórico, identificando as características associadas à noção de 'livro', levando em consideração as modificações ocorridas a partir de sua materialidade. Após esse estudo, foi possível compreender a remediação dos livros impressos nos e-books, principalmente naqueles que podem ser acessados através de e-readers e tablets. Outro recorte abordado por esta pesquisa focaliza a identificação e o registro dos recursos que vêm sendo explorados nas produções que estão sendo chamadas de livros digitais. Efetuada a revisão bibliográfica, foram estudadas as potencialidades do hipertexto, da multimídia e da interatividade dentro do livro eletrônico. Ademais, foram comentadas diferentes maneiras de o leitor se aproximar e interagir com o conteúdo da obra, através da utilização dos recursos citados. Antes de se realizar a análise dos artefatos em questão, foi necessário, ainda, aprender mais sobre a materialidade dos mesmos, percebendo como o hardware, o software e o conteúdo interagem entre si, restringindo, assim, as possibilidades que podem ser ofertadas ao leitor. Na tabela final de análise foram avaliadas as particularidades das seguintes macrocategorias: Identificação, Acesso, Funcionalidades, Potencialidades do meio digital, Aproximação da ideia de livro impresso (remediação) e Projeto gráfico. A partir do estudo teórico e empírico realizado, percebeu-se que o livro é um artefato com propriedades flexíveis, decidindo-se, por isto, propor uma série de princípios que, juntos, possam ser utilizados para caracterizar esse tipo de publicação, independente de ela ser digital ou impressa. Logo, chegou-se a conclusão de que o e-book é um conteúdo digital com as mesmas características de um livro e que pode explorar, além do texto e da imagem, recursos da mídia digital, tais como interatividade, som, vídeo e animação. Através das características predominantes dos artefatos analisados, foram identificados os seguintes tipos de livros digitais: customizável, PDF, digitalizado, multimídia e interativo. Palavras-chave: Comunicação, livro digital, livro eletrônico, e-book, design editorial, história do livro, aparelhos móveis, tablet, e-reader, remediação, hipertexto, multimídia, interatividade. SEHN, Thaís Cristina Martino. The possibilities of the book’s configurations in digital format. Dissertation (Master in Communication & Information) – Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. ABSTRACT This research has as its purpose to map out the artifacts so-called ‘digital books’ nowadays. They were characterized from a crossing between printed books main specificities and those related to digital environment very own resources. The research methodology applied to it was of two kinds: literature review and an observational study of the object of study. A historical overview was unearthed in order to achieve the intended purpose, identifying the characteristics linked to the notion of ‘book’, taking into account changes that have taken place stemming from its materiality. Given this perception it was possible to understand the remediation of the print book proposed in e-books, the ones accessed through e-readers and tablets mainly. Identification and registration of the latest developments in digital books resources were another point covered in this work. From a literature review standpoint, interactivity, multimedia and hypertext potentialities were cross-examined. Moreover, there had been discussed some of the alternatives to offer readers proximity and different ways to interact with the work content through the use of cited resources. Still, before realizing the artifact analysis, a more in-depth study of e-book materiality was needed. That is, to perceive how hardware, content and software interact among themselves restricting the possibilities that might be made available to the reader. The singularities of the following macro categories: Identification, Access, Functionalities, Potentialities of the digital environment and the approach of the printed book concept (remediation) to graphic project were evaluated in the table analysis. After an empirical and theoretical study, it was realized that book is an artifact with flexible properties, thus, a definition was set forth based upon a series of principles that together characterize this type of publication, regardless of being in printed or digital form. Therefore, we came to the conclusion the e-book is a digital content with the same features of a printed book and the former can exploit digital media resources such as sound, video, animation and interactivity besides virtually text and image. We were also able to identify through the artifacts primary features that were under analysis the following types of digital books: customized, PDF, digitized, multimedia and interactive. Keywords: Communication, digital book, electronic book, e-book, editorial design, book history, mobile devices, tablet, e-reader, remediation, hypertext, multimedia, interactivity. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Ler virou outra história (site do iBooks-Apple) .......................................... 68 Figura 2 - Visualização do modo Livro no iBooks ...................................................... 69 Figura 3 - Histórico de versões do iBooks ................................................................. 71 Figura 4 - Visualização das miniaturas de livros no iBooks, antes e depois da atualização 3.2 ............................................................................. 73 Figura 5 - Menu de configuração do iBooks, antes e depois da atualização 3.2 ....... 74 Figura 6 - Página de leitura do iBooks, com o modo de rolagem desativado, na versão 3.2 .................................................. 74 Figura 7 - Lombada descendente e ascendente ....................................................... 80 Figura 8 - O ladrão do fim do mundo ......................................................................... 85 Figura 9 - The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore ................................. 89 Figura 10 – Memex ................................................................................................. 107 Figura 11 – XanaduSpace ....................................................................................... 111 Figura 12 - Amostra da obra Glas de Derrida.......................................................... 115 Figura 13 – SocialBook ........................................................................................... 116 Figura 14 - Criando um link no comentário no SocialBook ......................................como um ambiente de escritório, criando os ícones que representavam pastas, arquivos etc. como continuam sendo disponibilizados até hoje. Na metáfora de interface é oferecido um mecanismo familiar para orientar os usuários e facilitar seu aprendizado sobre o sistema. No entanto, pode ser um erro pensar com relação à “metáfora de interface que ela se pareça e se comporte literalmente com a entidade física que está representando” (PREECE, ROGERS, SHARP, 2005, p. 78), já que esta expectativa pode neutralizar as vantagens do novo meio. Furtado (2006) acrescentou ainda, que a utilização de sumários, índices e números de páginas nos livros digitais “permitia aos leitores recorrerem a modelos mentais conhecidos e à sua experiência anterior com livros impressos, reduzindo desse modo o peso cognitivo da navegação e aquisição de informação” (FURTADO, 2006, p. 61). Com a constituição da cultura impressa se estabeleceu o hábito de adquirir o livro e, assim, interagir com ele de várias formas: grifando partes especiais, carregando-o para diversos locais, marcando a parte em que se interrompeu uma leitura para reiniciar daquele pontoem uma próxima vez etc. Ao se deparar como livro digital, o leitor não quer perder essas vantagens e, ainda – em virtude da novidade tecnológica – quer ganhar outras. De acordo com Bar et. al (2007) existe um ciclo do uso tecnológico, que se inicia quando os usuários optam por adotar uma nova tecnologia para dar suporte às atividades sociais. Após esse primeiro momento de adoção, eles começam a apropriar-se dessa tecnologia de diferentes modos, adaptando a ferramenta às suas necessidades: experimentam, testam, tentam outras possibilidades e modificam suas características iniciais. Na terceira fase ocorre uma reconfiguração, na qual uma nova plataforma tecnológica é produzida, incorporando muitas das adaptações feitas pelo usuário na segunda fase, iniciando-se, assim, um novo ciclo. É 67 interessante observar que, após esse momento de distanciamento da leitura no computador, alguns elementos que foram inicialmente rejeitados justamente por estarem associados a ele, retornam, possivelmente por incorporar as práticas efetuadas pelos usuários em situações semelhantes, agora realizadas nos aparelhos móveis. Esse movimento pode ser observado através da campanha de marketing (site e apresentação do iPad por Steve Jobs64) e do histórico de atualizações65 do aplicativo de leitura da Apple, o iBooks. Percebe-se que a Apple se propôs a fazer com que a transição do livro impresso para o eletrônico se realizasse de forma mais suave, salientando a semelhança entre os possíveis usos de ambas as tecnologias (impressa e digital), e, assim, levando o público a aceitar mais facilmente esta última, priorizando o dispositivo móvel ao invés do computador, para realizar esse tipo de leitura. 64 Iinformação verbal, disponível em Acesso em 13 jan 2013. 65 Todas as observações feitas sobre as modificações do software, foram retiradas do texto vinculado ao mesmo, presente na loja virtual da Apple, o iTunes. 68 Figura 1 - Ler virou outra história (site do iBooks-Apple) Fonte: Apple, 2013. No site de divulgação do aplicativo de leitura iBooks, o programa também era apresentado a partir de uma oscilação entre a ênfase na transparência e o enfoque sobre o diferencial do aparelho. O subtítulo “Ler virou outra história” (Figura 1) sugere uma mudança da leitura tradicional para a leitura no iBooks, mas a primeira frase enfoca a leitura tradicional: “Ler no iPhone, iPod touch ou iPad é como ler um livro de verdade” (APPLE66, 2013, grifo nosso), seguido da frase que volta novamente a destacar a melhoria efetuada no novo display: “E quando você começar, vai perceber que é ainda melhor” (APPLE, 2013, grifo nosso). Neste equipamento, até a última atualização, a versão padrão sempre mostrou o livro digital coma aparência de um volume impresso, disposto em uma estante de madeira, para, a partir dali, ser selecionado para uso. Cabe salientar a semelhança do digital com aquele, por possuir uma capa, páginas e, inclusive, ter sido apresentado na primeira versão com uma simulação que ativava o virar de páginas através do deslizamento dos dedos sobre o suporte (movimento semelhante ao do livro impresso), portanto, o texto era acessado simulando a maneira como seria com 66 Disponível em: http://www.apple.com/br/apps/ibooks/. Acesso em 28 jun. 2013. Em janeiro de 2014 o site foi redesenhado, alinhando seu conceito à proposta do sistema IOS7, que será visto a seguir. http://www.apple.com/br/apps/ibooks/69 o livro impresso (Figura 2) e, até mesmo permitia ao usuário grifar trechos e fazer anotações. Não existia o avanço do texto através da barra de rolagem, como era utilizado no computador. Figura 2 - Visualização do modo Livro no iBooks Fonte: http://www.3dissue.com/how-to-publish-your-content-to-ibooks-part-2-blog-and-rss-to-ibooks/ Acesso em 18 dez. 2013. Bolter (2001) analisou o e-reader Rocket eBook. No Brasil, o aparelho – como outros e-readers contemporâneos – não emplacou nas vendas (Mello Jr., 2006), como já foi comentado anteriormente, mas as características principais do mesmo são encontradas nos que estão no mercado atualmente, como o iPad e o Kindle, o que possibilita trazer este autor para falar das características dos aparelhos atuais, utilizando um texto produzido antes dos seus lançamentos. Uma das primeiras características ressaltadas por Bolter (2001, p. 80) foi a forma de acesso ao material disponibilizado no aparelho, que “tenta[va] imitar a presença física do códex”67. No entanto, salientou que, apesar de manter várias semelhanças com o livro impresso, foram introduzidas melhorias no livro digital, que os diferenciavam, como: a busca por palavras ou frases específicas, que podia ser feita de maneira automática por todo o documento “transformando qualquer texto em um hipertexto68” 67 Citação original: “imitate the physical presence of the codex”. 68 Citação original: “turns any text into a hypertext”. http://www.3dissue.com/how-to-publish-your-content-to-ibooks-part-2-blog-and-rss-to-ibooks/70 (BOLTER, 2001, p. 80), e a analogia do aparelho de leitura como um portal que possibilitava o acesso do leitor a um mundo de conhecimento e informação. Diferente do livro impresso, que pode conter apenas um texto já pré-estabelecido e concretizado no papel, o digital pode ser recarregado e reconfigurado. Como pôde ser percebido na apresentação do Rocket eBook, pelo mesmo autor, “A remediação envolve tanto reverência quanto rivalidade pela mídia anterior, assim como muitos recursos são copiados outros são criados através da nova mediação”69 (BOLTER, 2001, p. 23). O percurso percorrido pelo Rocket eBook também foi realizado no aplicativo iBooks. Através do histórico de atualizações, foi possível detectar quando as características presentes no software e descritas acima foram implementadas. Segundo o texto oferecido na loja virtual de aplicativos iTunes70, a versão 1.0 foi lançada em 2 de abril de 2010, no mesmo ano de lançamento do iPad, e desde então já foram feitas 25 atualizações71, das quais se podem destacar algumas que serão descritas no texto a seguir. 69 Citação original: “Remediation involves both homage and rivalry, for the new medium imitates some features of the older medium, but also makes an implicit or explicit claim to improve on the older one”. 70 Disponível em: . Acesso em 10 ago. 2013. 71 No período de 2 de abril de 2010 até 17 de dezembro de 2013. https://itunes.apple.com/br/app/ibooks/id364709193?mt=871 Figura 3 - Histórico de versões do iBooks Tela capturada da loja virtual da Apple. Fonte: a autora. Em junho de 2010 foi disponibilizada a sincronização entre os aparelhos iPad, IPhone e iPod (equipamentos portáteis da mesma fabricante), o que vai rebater as críticas apontadas pelos pesquisadores, que ressaltavam a importância da portabilidade do conteúdo para um maior uso dos livros digitais (MELLO, 2006; LUDWIG, 2012; MORAES, 2012). Em dezembro de 2011 – quase dois anos depois do lançamento do iBooks – foi oferecido os modos de leitura “noturno” e “tela cheia”. O modo noturno é caracterizado pela exibição de letras brancas sobre um fundo preto, como forma de contornar o possível incômodo que a luz emitida pela tela possa causar. A leitura em tela cheia é a possibilidade de o leitor visualizar apenas o texto, “sem nada para distrair a sua atenção” (APPLE, 2013),conforme o próprio fabricante anunciou no site de divulgação 72 do aplicativo, ou seja, não se visualizariam mais os botões do aplicativo no entorno da página, tampouco a representação do volume das páginas encadernadas. Nesta função a imediação proposta oferece acesso direto ao texto e não mais à simulação de um livro. A versão 2.0 foi lançada em janeiro de 2012. Suas novas características foram mais voltadas para os recursos do aparelho (hipermediação), trazendo o comando multi-toque e prometendo mais interatividade com vídeos, objetos 3D, galeria de imagens e o que foi nomeado de ‘Cartão de Estudos’ (Study Cards), que seria um atalho para exibir as notas, palavras destacadas e glossário. Na versão 2.1, de março de 2012, o livro digital poderia receber a mesma numeração de páginas de sua versão impressa. Com essa mudança, percebe-se uma crença na coexistência dos livros digitais e impressos, cada qual servindo a um público específico e permitindo que ambos os livros possam dialogar entre si, já que ao abordar determinada passagem, esta será referenciada no mesmo número de página, independente desta fazer parte do livro digital ou do impresso. A versão 3.0, oferecida no final do ano de 2012, começou a voltar-se mais para os recursos do meio digital, ofertando aos usuários a possibilidade de compartilhar trechos do texto com amigos e colegas, via Facebook, Twitter, E-mail e mensagem. Outra vantagem dessa versão sobre o impresso é que esta permite a atualização gratuita do livro comprado, quando este for reeditado ou complementado, o que não é possível no caso do impresso em papel, onde o leitor, caso queira ter acesso a essas novidades, deverá realizar nova compra do mesmo título, em edição atualizada. E, por fim, nesta atualização, foi lançado o novo modo de visualização do livro: o Rolo, já descrito anteriormente. Após toda a divulgação da imediação do livro e da metáfora de folhear a página utilizando um gesto semelhante à ação no papel, retoma-se novamente a forma de rolagem (scroll), que foi utilizada desde o início da metáfora do desktop implementada na interface do computador e que foi negada no lançamento do livro digital pelo iPad. Contudo a mudança mais radical aconteceu na versão 3.272, que surgiu para acompanhar o novo design do sistema operacional móvel da Apple, o IOS 773.Nesta atualização, foi proposto um layout mais simples, em que “Tudo o que era excessivo 72 Lançada em 14 de novembro de 2013. 73 Lançado em 18 de setembro de 2013. 73 foi eliminado” (APPLE, 2014, online), todo o sistema foi redesenhado, inclusive os ícones e, consequentemente, o aplicativo iBooks também fez parte desse processo. A representação do livro na tela do aparelho, antes enfatizada, passou a aparecer de forma mais discreta. As prateleiras que, outrora imitavam uma estante de madeira, foram representadas de forma sutil, na cor cinza (Figura 4). Figura 4 - Visualização das miniaturas de livros no iBooks, antes e depois da atualização 3.2 Visualização da estante antes e depois da atualização 3.2. Fonte: a autora. O modo de visualização das páginas, que antes possuía as opções de Tela Cheia, Livro, ou Rolo, mudou, dando destaque à rolagem de tela, a qual poderia ser ativada ou não (Figura 5). Em caso negativo, a página voltaria a ser folheada, sendo apenas esta a alusão ao livro impresso que foi conservada. O volume de páginas do livro(Figura 2)também não é mais simulado na imagem estática (Figura 6). 74 Figura 5 - Menu de configuração do iBooks, antes e depois da atualização 3.2 Menu do iBooks em janeiro de 2013, quando o tema Rolar era recente e a ênfase era dada no tema Livro, e o novo menu, dando destaque à rolagem. Fonte: a autora. Figura 6 - Página de leitura do iBooks, com o modo de rolagem desativado, na versão 3.2 75 Print Screen da página de leitura no iBooks, com orientação horizontal e dividido em duas colunas. Fonte: a autora. Partindo-se da análise das atualizações do iBooks, pôde verificar-se um movimento que vai da reprodução das características do livro impresso – enfatizando o objeto tradicional - para a hipermediação do livro digital, agora com ênfase nos fatores tecnológicos. Nas primeiras versões, os primeiros recursos disponibilizados, em sua maioria, procuravam satisfazer o hábito de ler já existente, simulando ações que o leitor estava acostumado a realizar no livro impresso, acrescidas de algumas facilidades do meio digital. Assim, tornou-se possível grifar um trecho do livro, folhear e marcar uma página e, somando-se a isso a praticidade de realizar a busca de termos específicos ao longo do texto e armazenar vários livros em um único suporte. A partir dessas observações, percebe-se que o potencial da mídia digital estava sendo direcionado para aumentar a fidelidade da representação do livro e da página de papel (a animação da página sendo folheada, acompanhada por seu som característico e, ainda, o gesto que deveria ser feito para ativar essa ação). Nas atualizações seguintes, foram sendo implementadas a mistura de outras linguagens, diferentes daquelas que já faziam parte da mídia impressa (texto e imagem estática), vindo a ser explorados recursos como vídeos, sons, animações e ações desencadeadas pelo próprio usuário. Foi retomada a rolagem, que era um recurso próprio do meio digital para avançar no conteúdo, e, ainda, foi disponibilizada a atualização de conteúdos dos volumes adquiridos virtualmente, sem a necessidade de ter que se efetivar nova compra a cada “nova edição”, como seria feito no impresso, além da incorporação de ações já populares na internet, como o compartilhamento de conteúdo nas redes sociais. Essa nova configuração pode ser interpretada como a terceira fase do ciclo do uso tecnológico desse artefato, visto que nela foram incorporadas ações previstas para serem ativadas pelo próprio usuário, ações essas que já haviam sido desenvolvidas na fase de adaptação (BAR et. al, 2007).É interessante perceber que, após uma primeira fase de adequação, começaram a ser exploradas para o ato da leitura as potencialidades do meio digital, e estas, apesar de já utilizadas em outras atividades realizadas no computador, ainda não haviam sido direcionadas para a leitura de um livro. Esta 76 leitura no suporte digital, por sua vez, remetia à experiência tradicional que era realizada com o livro impresso. Assim como a Apple, diversas empresas foram desenvolvendo softwares e arquivos com o fim de suprirem as necessidades do leitor, porém ainda não foi estabelecido um padrão para tais produtos, fazendo com que o consumidor tenha que possuir vários aplicativos para poder acessar os diversos tipos de arquivos existentes. A falta de um padrão trouxe à tona questionamentos sobre as convenções e tradições estabelecidas historicamente para o livro impresso; portanto, antes de entrar especificamente nas possibilidades que o meiodigital oferece ao livro, ainda é necessário fazer uma reflexão sobre o que caracteriza um livro hoje em dia, desde os seus aspectos gráficos até os conceitos atribuídos pelos pesquisadores da área. 4. O LIVRO HOJE: CONSTRUINDO PARÂMETROS DE IDENTIFICAÇÃO E DEFINIÇÃO O livro hoje é um daqueles objetos tão comuns e com tantas possibilidades que sua definição acaba por tornar-se uma tarefa muito árdua. Ao mesmo tempo em que se busca traçar princípios que o diferenciem de outros objetos, tenta-se manter um conceito amplo, podendo, assim, abarcar todos os diferentes tipos já produzidos ou que venham a ser criados. Como se pôde ver, ao longo da história, o livro se transformou e, apesar do rolo de antigamente ser considerado um livro, este hoje em dia, não se realiza mais naquele formato e tampouco o leitor adquire textos de diferentes gêneros e assuntos, agrupando-os sob uma mesma encadernação, como era feito outrora (salvo exemplos que queiram apresentar-se em um formato diferenciado, porém em caráter de excentricidade, uma vez que inexiste a utilização desse formato na atualidade). Ao perceber a carência existente de uma definição atualizada do que é ou do que poderia vir a ser um livro, foi feita essa revisão teórica observando o que os autores e pesquisadores enxergaram como sendo características inerentes a essa mídia. A partir dessa referida revisão foi proposto um conjunto de parâmetros para pensar o livro – digital ou impresso – podendo este contribuir para que, em trabalhos futuros, seja criada uma definição para este artefato, que abarque todas as suas possibilidades. É interessante perceber que muitas dessas reflexões sobre o livro impresso foram despertadas pelo digital. Como explica Lucia Santaella, “a mídia emergente vai se espremendo entre as outras [e] gradativamente encontrando seus direitos de existência ao provocar uma refuncionalização nos papéis desempenhados pelas anteriores” (SANTAELLA, 2007, p. 232). A partir dessa reacomodação das mídias, tanto o livro quanto o e-book se modificaram e vêm suscitando essas discussões, para (re)afirmar o espaço de cada meio. 78 Esta seção foi dividida em três partes, primeiramente abordando as convenções atreladas à estrutura de organização visual do próprio livro; na segunda parte fez-se um levantamento das definições dadas por órgãos e instituições do livro; na terceira, foram levantadas as características inerentes ao livro impresso apontadas pelos autores da área, e, assim como outros pesquisadores, a discussão também abrangeu o digital. No final desse capítulo se propôs uma série de princípios que talvez possam delimitar o que seria um livro tendo como base a revisão teórica sobre o mesmo, abordada até o momento. 4.1. A CONFIGURAÇÃO GRÁFICA DO LIVRO Ao longo do tempo, foi sendo construída uma noção de livro cuja estrutura, por repetição, se tornou familiar ao leitor, que já sabe onde encontrar as informações desejadas; assim, quando quiser informar-se mais sobre o autor, buscará as orelhas para ler a sinopse desejada, a contracapa para saber a opinião de algum especialista; saberá que a editora acompanha o título e que o nome do autor estará situado na capa e na lombada. Justamente por serem esperadas, é que essas convenções de design editorial podem ser transgredidas no intuito de surpreender o leitor, mas, de um modo geral, quando se fala genericamente em livro impresso, alguns tipos de conteúdos são associados a certas partes constituintes do mesmo. Isto não acontece com o e-book, pois estese apresenta de forma diferente, não está fixado entre capas, é visualizado em uma tela na qual a imagem se transforma em cada página virada, é sempre bidimensional e pode ser acionada por cliques, toques ou apertos de botões. Ao se observar que não existe mais uma encadernação, surgem reflexões sobre como essas informações – que eram atreladas a esses elementos físicos do livro – devem ser apresentadas em um e-book e como interferem na constituição e identidade do livro. Analisando elementos no impresso, observa-se que a capa geralmente é feita de um material mais resistente que as páginas do miolo, a fim de proteger e estruturar melhor o volume. Segundo Fernandes (2001), as primeiras capas que foram feitas para o códex eram de madeira e sua principal função era proteger o conteúdo e manter as folhas – que eram feitas em pergaminho – esticadas. Este componente do livro facilitou, também, o armazenamento dos volumes, que eram 79 empilhados horizontalmente para evitar que se estragassem com a umidade ou que ocorresse a queda de algum líquido sobre os mesmos. Além de assumir essa função estrutural, esta passou a ser decorada e servia também para identificar o livro mais rapidamente. Como a capa, provavelmente será um dos primeiros contatos do leitor com o livro, ela serve como uma forma de divulgação de seu conteúdo e é um espaço para conquistar de leitores. Ela pode ser acompanhada de uma cinta, sobrecapa ou cantoneira. Esses elementos são mais efêmeros que o livro e são colocados também para fins publicitários, no intuito de atrair a atenção de um possível leitor para um determinado livro. A função da sobrecapa é proteger a encadernação (HASLAW, 2007; FERNANDES, 2001, HENDEL, 2006); a cinta “pode ser usada para anunciar o conteúdo ou uma nova edição” (HASLAW, 2007, p. 22); e a cantoneira é um espaço que torna possível avisar sobre uma nova edição do produto, adicionar uma informação ao livro após sua produção, ou avisar sobre algo que possa ser descartado pelo leitor (HASLAW, 2007). Usualmente os livros são armazenados em estantes, deixando visível apenas a lombada. Para Satué (2004, p. 20) "a lombada é um dos elementos mais característicos e peculiares do exterior do livro. Historicamente foi o primeiro e principal elemento a ser decorado". Por ser normalmente um espaço reduzido, percebe-se a utilização desta área para as informações essenciais de identificação de um volume: “o título e o autor da obra; a editora, frequentemente sob a forma de logotipo; pode-se incluir, em se tratando de uma coleção, o número do volume e/ou título da coleção” (SAUTÉ, 2004, p. 20). Poder-se-ia, ainda, neste local, fazer uso de uma imagem no intuito de estabelecer uma relação entre a lombada e a capa do livro. O título do livro, quando inserido em lombadas maiores, pode ser escrito horizontalmente, mas na maioria das vezes o texto é rotacionado 90° para a direita ou para a esquerda, o que pode fazer com que o texto possa ser lido de cima para baixo ou de baixo para cima, respectivamente. Segundo Lupton (2006), nos Estados Unidos é mais comum o texto estar posicionado para a leitura de cima para baixo, apesar disto não ser imposto. A norma NBR 12225 (2004) da ABNT recomenda o título da lombada descendente (de cima para baixo), para que este texto fique com a orientação horizontal normal, legível quando a frente do documento estiver virada para cima. Caso contrário, quando o texto é posicionado de baixo para cima, nessa 80 mesma situação, o texto acaba ficando de “cabeça para baixo”. Ambos os casos podem ser visualizados na Figura 7. Figura 7 - Lombada descendente e ascendente O livro de Alberto Manguel, Uma história da leitura, com a escrita da lombada de baixo para cima, e o livro de Robert Bringhurst, Elementos do estilo tipográfico, com a escrita de cima para baixo. Fonte: a autora. A contracapa é um segundo espaço de exposição do livro e serve para que o leitor tenha acesso ao seu conteúdo. Ela se torna muito importante quando o livro se apresenta empacotado em plástico transparente, impedindo o usuário de folheá-lo, pois será apenas ela que ficará visível externamente e que poderá dar mais informações sobre aquele volume. Em função disso, é comum encontrar-se ali uma sinopse ou descrição do conteúdo ou, ainda,algum material promocional. Os elementos obrigatórios da contracapa são o número ISBN e o código de barras, para facilitar as tarefas dos livreiros e bibliotecários na identificação do volume e automatização o processo (HASLAW, 2007). As orelhas não são encontradas em todos os livros e, dependendo do tipo de encadernação, elas são essenciais ou dispensáveis. Exemplificando, nas capas de papel mais fino as orelhas evitam que estas se retorçam com a umidade do ar; já nos livros de capa dura, em função de o papel ter uma gramatura alta, esse reforço se torna desnecessário, podendo o vinco das orelhas, inclusive, prejudicar a 81 resistência do mesmo. Portanto, as informações que são vinculadas às orelhas, como biografia do(s) autor(es) com foto, descrição do conteúdo, opiniões da crítica especializada e lista de publicações anteriores são normalmente reposicionadas na contracapa ou dentro do miolo do livro, no seu início ou fim. Nas Tabela 14 e Tabela 15 podem ser observadas as informações que normalmente são vinculadas aos elementos estruturais da capa, elencados por Haslaw (2007) e pelas normas NBR 6029 (2006) e NBR 12225 (2004) da Associação Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT): Tabela 14- Elementos da capa e da lombada CAPA LOMBADA Haslaw ABNT Haslaw ABNT Nome do(s) autor(es) Nome completo do(s) autor(es) Nome do(s) autor(es) Nome do(s) autor(es) Título Titulo do livro por extenso, além de subtítulo quando for o caso Título Título do livro (por extenso ou abreviado) Nome, logotipo ou símbolo da editora74 Nome, logotipo ou símbolo da editora Nome, logotipo ou símbolo da editora Nome, logotipo ou símbolo da editora Imagem Imagem Elementos alfanuméricos de identificação de volume, fascículo e data, se houver Texto de orelha (sinopse/ descrição/ promoção) Texto adicional da capa Fonte: a autora. 74 No Brasil, os programas governamentais exigem que o logotipo da editora figure na primeira capa. (N. E. p. 161 HASLAW). 82 Tabela 15 - Elementos da contracapa e orelhas CONTRACAPA ORELHAS Haslaw ABNT Haslaw ABNT ISBN e Código de barras ISBN e Código de barras Biografia do(s) autor(es) Biografia do(s) autor(es) Texto de orelha (sinopse/ descrição/ promoção) Resumo do conteúdo (opcional) Descrição do livro Comentários sobre a obra (opcional) Lista dos outros títulos da coleção Endereço da editora (opcional) Opiniões da crítica especializada Público a que se destina a obra (opcional) Opiniões da crítica especializada Lista de publicações anteriores Outras informações (a critério do editor) Biografia do(s) autor(es) Fotografias do autor Imagem Indicação dos principais temas do livro Fonte: a autora. No caso do livro digital, não existe uma estrutura já definida que o identifique enquanto unidade, que o proteja e possa servir de espaço para informações. No entanto, estes dados precisam aparecer de alguma forma, pois fazem parte da ideia de livro, informam sobre o vínculo editorial, explicitam a autoria e ajudam o leitor a selecionar aquilo que deseja ler. De um modo geral, os livros digitais são vendidos em sites e lojas virtuais específicas (bookstore). A lombada, que seria o modo “resumido” e prático de identificar o livro, poderia transferir sua função para a miniatura da capa juntamente com sua legenda (quando existir). A capa segue presente como um modo de comunicação e marketing, contudo seus elementos tendem a ser repensados para o meio digital, que também apresenta título, autor, editora e imagem. Outros elementos publicitários podem ser realocados em outros espaços, já que o tamanho da imagem de visualização pode variar, tanto de um aparelho para outro como de um site para outro, e esses elementos extras poderão poluir mais do que contribuir para a visualização clara da capa. As informações vinculadas à contracapa e às orelhas se misturam no meio digital, sendo comum encontrá-las no site/bookstore, ao se selecionar um título (miniatura) para obter mais dados sobre o mesmo, ou ainda, dentro do livro, situando-se entre os elementos pré-83 textuais ou pós-textuais deste, como ocorre com os livros impresso que não possuem orelha em sua encadernação. A diferença entre o texto rígido e o flexível (Landow, 2006) é mais perceptível no miolo do livro, principalmente nos formatos digitais que permitem ao leitor a customização de seus livros. Essa possibilidade, num primeiro momento, causa a impressão de que tudo que foi valorizado, em termos de design, no impresso, será invalidado nessa nova situação de leitura, contudo o que se percebe é que se abriu um leque maior de opções ao leitor e o design pré-concebido pela editora está dentro dele, inclusive a customização poderia ser agregada ao projeto gráfico, permitindo ao leitor adaptar o livro às suas necessidades sem perder as informações visuais agregadas pelo design. O design editorial foi percebido por muitos tipógrafos e designers como uma arte invisível (HENDEL, 2006), que deveria desaparecer para que tivessem mais destaque as palavras e ideias do autor. De fato, talvez em função desse objetivo, ele se tornou invisível para muitas pessoas, principalmente para aquelas que não eram designers nem tipógrafas. Em muitos casos, a atenção à diagramação do miolo do livro se resumia ao tamanho da letra utilizado; porém, em outros casos, as pessoas apreciavam uma diagramação bem feita, que facilitasse seu ato de ler, não como um fator que definisse sua compra, mas como um elemento que aumentaria o prazer de realizar a leitura (SEHN, 2009). Apesar dessa pretensa invisibilidade, abarcando-se o lado do profissional que projeta o livro, “mesmo o detalhe mais aparentemente trivial precisa ser decidido, e são exatamente essas minúcias que tornam bem-sucedido um design” (HENDEL, 2006, p. 33). Assim, será feito um pequeno levantamento de outros elementos existentes no projeto gráfico editorial, com o fim de propiciar um maior embasamento para a discussão do livro digital. Os elementos do livro impresso podem variar de um para outro autor, mas compilando o que diz Haslaw (2007), Hendel (2006) e Fontoura (2007), basicamente este é constituído de: - Elementos preliminares/pré-textuais: fólio branco; falsa folha de rosto; frontispício/folha de rosto; página de créditos; dedicatória; agradecimentos; epígrafe; apresentação; prefácio; sumário e introdução. - Corpo do texto/Elementos textuais: seções e capítulos. 84 - Adendo/Pós-textuais: notas de fontes; bibliografia e leitura recomendada; apêndice (adendo/matéria de apoio); índice; créditos e agradecimentos referentes às fontes das imagens, fotografias e ilustrações; agradecimentos do autor aos conselheiros, editores e colaboradores; e posição alternativa para inserção da dedicatória e da página de créditos; colofão (ou colófon). Os elementos pré-textuais são vistos, por alguns, como uma continuação da capa, uma vez que devem ambientar e preparar o leitor para o que virá a seguir. As primeiras páginas que recepcionam o leitor são a de anterrosto ou falsa folha de rosto, seguida da folha de rosto. A falsa folha de rosto foi inventada quando os livros eram vendidos sem a capa, uma vez que o volume podia ser identificado e a folha de rosto permaneceria mais bem conservada até o momento em que fosse feita a encadernação. Hoje passou a existir apenas como um elemento de design, visto que todos os livros são vendidos encadernados. “A página de rosto é um desenvolvimento das páginas de abertura de capítulo. Os elementos e as relações criados dentro do livro devem estar presentes aqui sob o melhor aspecto possível” (BULLEN, 2006, p. 101), como uma mostra dinâmica do que vem pela frente (Figura 8). Ela “deve refletir o design do livro em todos os seus aspectos,mas não necessariamente imitá-los” (SCOTT, 2006, p. 183). 85 Figura 8 - O ladrão do fim do mundo Primeiras páginas do livro digital O Ladrão do Fim do Mundo. Fonte: a autora. A página de crédito ou copyright é o “anúncio legal de quem é o proprietário do texto” (HENDEL, 2006, p. 57) e normalmente a ficha de dados internacionais de catalogação é exibida nesta página. Apesar de muitas editoras estabelecerem um padrão para o design dessa folha, Hendel (2006) recomendou que inclusive nesses elementos seja respeitado o projeto gráfico do livro. A página da dedicatória também tem suas particularidades, pois é uma página inteira para poucas palavras. A maneira como o design a apresenta pode fazer toda a diferença, transformando-a “numa linha de texto vulgar ou num cartão de presente para a pessoa” (HENDEL, 2006, p. 57). A diagramação das páginas de epígrafe, prefácio ou agradecimento depende do que é dito e de sua extensão. Se for uma escrita mais longa, o design “relaciona-se facilmente com o do texto principal do livro” (HENDEL, 2006, p. 57), mas se for mais curta, pode ter uma diagramação diferenciada, da mesma forma que foi feita na dedicatória. O sumário precisa identificar a hierarquia do texto, seus capítulos e subtítulos. Pode-se ainda inserir o recurso de separar por seções, ou diferenciar visualmente a matéria pré e pós-textual do texto. Para a confecção desta página o ideal é que o designer se preocupe com a clareza das informações, pois o leitor que consulta o sumário espera localizar o conteúdo desejado e não ficar perdido em um 86 mundo de informações confusas. Normalmente este começa em uma página ímpar, mas se seu conteúdo for muito extenso, abre-se a possibilidade de começar em uma par, de modo que o leitor tenha toda a informação em duas páginas dispostas lado a lado. O sumário, no livro impresso, não fará sentido se não houver o fólio, ou seja, o "Número de página impresso na página de texto" (HENDEL, 2006, p. 214), que é omitido normalmente nas aberturas de capítulo. A matéria pós-textual costuma conter notas, bibliografia e índice. Como esse conteúdo normalmente é composto por listas e não por parágrafos, uma particularidade desse material é o alinhamento à esquerda, evitando os espaços maiores e desproporcionais entre as palavras que poderiam se formar com a manutenção do texto justificado. Outros tipos de alinhamentos utilizados são o centralizado e o alinhado à direita. No livro impresso um fator determinante no design é o formato do papel. O mais comum é o retangular na orientação vertical (retrato), mas também pode ser utilizado no sentido horizontal (paisagem) ou quadrado. Contudo, os fabricantes de papel já o produzem com as fibras no sentido próprio para a confecção de livros no formato retrato, o que encarece a exploração de outros formatos. Além do limitador econômico, existe também um limite ergonômico: “Os livros precisam ser de fácil manejo. [...] Não é fácil pôr na estante ou mesmo armazenar livros que medem mais de 25 cm de largura” (TSCHICHOLD, 2007, p. 213). No livro digital, a proporção da página e o peso do livro serão dados pelo aparelho que o leitor estiver utilizando, o qual poderá oferecer a imagem do livro em tela cheia ou dentro de uma janela/margem que pode alterar a sensação do tamanho da mesma. Alguns livros digitais possuem layouts fixos, apresentando-se somente no formato retrato ou apenas em paisagem, porém há outros em que essa apresentação é cambiável, de acordo com a preferência do leitor. No meio impresso, as margens são um elemento importante a ser definido. Convencionalmente, quando o livro possui uma leitura contínua, procura-se produzir páginas espelhadas (simétricas uma a outra), criando uma unidade quando o livro está aberto. Por conseguinte, muitas vezes as margens internas (medianiz75), localizadas na parte central do livro, são pequenas, o que pode agradar alguns que vêm a possibilidade de transformar, visualmente, as duas páginas em uma 75 "Margens internas da página, que ficam ao lado da costura, próximas à lombada" (HENDEL, 2006, p. 215). 87 (BRINGHURST, 2005), e desagradar a outros, que se deparam com certa dificuldade para a leitura dos finais de frases da página par e para os inícios da página ímpar (HENDEL, 2006). Segundo Hendel (2006), estas páginas normalmente são configuradas assim: a superior menor, exterior maior, interna menor, inferior maior de todas (origem no renascimento, polegares). As margens criam a mancha do texto, que é a “parte impressa do texto, por oposição às margens" (HENDEL, 2006, p. 215). Alguns elementos podem ser posicionados fora da mancha, ou seja, “além da margem externa normal da página de texto. Por exemplo, as aspas de abertura podem ficar na margem, fora da mancha" (HENDEL, 2006, p. 215). Para Bringhurst, as margens têm três tarefas: amarrar, emoldurar e proteger, o que se pode perceber em suas palavras: Elas precisam amarrar o bloco de texto à página e amarrar as páginas opostas uma à outra com a força de suas proporções. Em segundo lugar, devem emoldurar o bloco de texto de um modo que se ajuste ao seu desenho [da tipografia]. Finalmente, precisam proteger o bloco de texto, facilitando a visualização do leitor e tornando o manuseio conveniente (noutras palavras, deixando espaço para os polegares) (BRINGHURST, 2005, p 181. Grifos do autor). Pensando nas configurações das margens nos livros digitais, no caso da utilização de aparelhos com tela sensível ao toque, por exemplo, as margens não serviriam para "apoiar os polegares", como afirmou Bringhurst (2005), já que ao tocar na tela, o leitor pode acionara troca de página ou algum menu, atrapalhando a sua leitura se a ação for feita de modo involuntário. Alguns softwares oferecem ao usuário, a opção de selecionar o tamanho de margem desejado, o que, além de proporcionar um maior conforto visual, pode ser considerado como um recurso para controlar o número de caracteres por linha. Vale salientar que, para esse controle, outro fator que deve ser levado em consideração é o tamanho da letra, que também poderá ser alterado pelo usuário, modificando o número de caracteres por linha. Muitos leitores aproveitam o espaço das margens no livro impresso para fazer anotações sobre a leitura, função essa que, no caso do digital, é praticamente inexistente. É relevante destacar que muitos softwares oferecem, como alternativa para suprir essa vontade do leitor, ferramentas próprias que lhe possibilitem fazer destaques e comentários no texto. 88 A tipografia do texto “é a base de todo resto” (HENDEL, 2006, p. 35). Hendel (2006) ensinou que podemos relacionar a tipografia com o conteúdo, de três formas: a neutra (sem marcar época ou lugar), a alusiva (trazendo o sabor de um tempo passado) ou a nova (disponibilizando o texto de forma única). Além do estilo, no momento da escolha da tipografia, o designer deve levar em consideração as necessidades impostas pelo texto; por exemplo, se o autor costuma grifar muitas palavras, a fonte eleita deve ter um bom itálico; se o texto possui muitos níveis de subtítulo, um bom negrito; se tiver muitos numerais ou muitas siglas deve possuir esses caracteres bem-feitos; enfim, a família tipográfica deve suprir todas as necessidades impostas por aquele material. Bringhurst (2005, p 25) brincou que: Em um livro mal desenhado, as letras, pulverizadas, postam-se como cavalos famintos no campo. Em um livro desenhado mecanicamente, elas assentam como pães mofados e carne de terceira na página. Já em um livro bem-feito, no qual designer, compositor tipográfico e impressor fizeram, todos, o seu trabalho, as letras estão vivas, não importa quantos milhares de linhas e páginas tenham de ocupar. Elas dançam em seus lugares. De vez em quando, levantam-se e dançam nas margense nos corredores. Em um livro digital é possível fazer a tipografia dançar de verdade e não apenas metaforicamente falando, como pode ser visto no livro digital do The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore (Figura 9), no qual o texto tem animações que interagem com as histórias e personagens. Dependendo do tipo de livro digital acessado, a tipografia pode se manter fixa para todos os leitores ou pode ser alterada por cada um, dentre um grupo de opções incorporadas no software. Além destas, é possível programar um livro digital com uma tipografia específica e, mesmo que esta não conste no sistema do aparelho do leitor, ela pode ser incorporada no arquivo do e-book. Quando isto ocorre, normalmente essa opção recebe um nome que faz alusão à editora, como “Fonte da editora” ou “Padrão da editora”, que mantém as especificações tipográficas que acompanham o arquivo. 89 Figura 9 - The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore Captura de tela de uma ‘cena’ do livro. Fonte: a autora. Vale lembrar que mesmo que o livro digital altere as suas configurações visuais, a hierarquia do mesmo deve ser mantida, pois “É difícil para o leitor se orientar num livro em que as aberturas de capítulos não se destacam” e todos os elementos são compostos “exclusivamente no corpo da fonte básica”. (TSCHICHOLD, 2007, p. 214). O autor ainda completa: Páginas de abertura sem nenhuma capitular, páginas que começam abruptamente no canto superior esquerdo e parecem-se com qualquer página de texto aberta casualmente. A gente pensa que está vendo uma página qualquer e não uma inicial. A abertura de um capítulo deve ser marcada por um largo espaço em branco acima da primeira linha, por uma letra capitular ou por algo que a diferencie (TSCHICHOLD, 2007, p. 213-4). Haslaw (2007) destacou a abertura e fechamento de capítulos, sendo que na primeira pode figurar o título deste (algumas vezes numerado em números romanos), o subtítulo, as citações, as imagens (que podem incluir legenda) e geralmente ocorre a omissão do número da página (o que, para o autor, não é tão benéfico, posto que se nestas a numeração permanecesse, facilitaria sua busca pelo início dos capítulos). Já o fechamento do capítulo muitas vezes é indicado por um espaço em branco, indicando que o próximo inicia-se na página a seguir. Ao invés do espaço em branco ou em conjunto com ele, pode-se incluir todos os elementos da abertura de capítulo, e/ou, ainda, notas de fonte, curta bibliografia (principalmente quando é um livro composto de texto de vários autores) e lista de imagens (que também pode ser inserida no adendo). 90 É a aplicação consistente de estilos e espaçamentos que caracteriza o design do livro. Na diagramação deve ser mantido um padrão em todas as páginas para caracterizar os títulos, subtítulos, notas etc. deixando claro ao leitor a qual hierarquia aquele conteúdo pertence. Dessa forma os títulos merecem mais destaque do que os subtítulos, que por sua vez, se destacam mais que os títulos correntes76. Estes últimos, como aparecem em diversas páginas, devem ser discretos, estando disponíveis para quando o leitor necessitar deles, mas sem tirar sua atenção do texto. O parágrafo serve para marcar uma pausa (não tão longa quanto ao final de um capítulo), introduzindo um novo assunto (HENDEL, 2006, TSCHICHOLD, 2007, BRINGHURST, 2005). Existem diversas formas visuais de indicar essa mudança, sendo que a mais comum no meio impresso é o recuo interno no início da primeira linha. "Há apenas um lugar onde um recuo é desagradável ao olhar e não faz sentido algum: embaixo de um título centrado. O primeiro parágrafo deve começar sem recuo" (TSCHICHOLD, 2007 p. 138). Outro tipo de parágrafo utilizado é o francês, que costuma funcionar melhor em notas de referência. Nele, a primeira palavra ou numeral que indica a frase é o elemento procurado, portanto nesse tipo de parágrafo, a primeira linha é recuada para fora do texto, saindo da mancha do mesmo. Essa pausa do parágrafo, entre outras formas, também pode ser marcada por um espaço maior entre os parágrafos (muito comum nos sites e blogs) ou, ainda, pela impostação de um símbolo no começo da mesma, mantendo-se a continuação do texto na mesma linha. Alguns parágrafos recebem nomes diferentes dependendo do autor. Na Tabela 16 é possível perceber as nomenclaturas encontradas em Hendel (2006), Haslaw (2007) e Lupton (2006): 76 “Título corrente” é o nome dado ao título do livro/capítulo que aparece no cabeçalho (normalmente) das páginas do miolo do livro. 91 Tabela 16 - Marcações de parágrafo Exemplo: Hendel (2006) Haslaw (2007) Lupton (2006) Este parágrafo é um exemplo. Este é o segundo parágrafo de exemplo. Recuo (largura M) Entradas de paragrafo (indents) Recuo e quebra de linha Este parágrafo é um exemplo. Este é o segundo parágrafo de exemplo. Outdents (parágrafo francês) Parágrafo avançado (ou enforcado) Recuo saliente (parágrafo francês) Este parágrafo é um exemplo. ¶ Este é o segundo parágrafo de exemplo. Símbolo (caldeirão ou pé-de-mosca) Continuidades com símbolos (não usa espaço em branco para marcar) Símbolo sem recuo ou quebra de linha Este parágrafo é um exemplo. Este é o segundo parágrafo de exemplo. - Linhas recuadas (o parágrafo começa onde terminou o anterior, mas na linha abaixo) Espaço adicional na linha, sem quebra Este parágrafo é um exemplo. Este é o segundo parágrafo de exemplo. Espaço entre parágrafos Espaço maior entre parágrafos Quebra de linha e 1/2 entrelinha adicional Este parágrafo é um exemplo. Este é o segundo parágrafo de exemplo. Sem entrada, alinhado à esquerda (depois de títulos) - Quebra de linha sem recuo As linhas horizontais indicam as marcações que são equivalentes. Fonte: a autora. A legibilidade é outro fator essencial. Muitos acreditam que letras com serifa ajudam na leitura, entretanto têm muitos estudos que provam o contrário. “O mais correto é que lemos com mais facilidade quaisquer formas de letras que estamos acostumados a ver” (HENDEL, 2006, p. 19). Nesse sentido, o leitor poderia optar por utilizar sempre a mesma tipografia para todos os seus livros digitais, otimizando a sua leitura, mas perderia as nuances de sentido indicadas pelo design gráfico. Dentre as escolhas tipográficas permitidas, também se pode optar por algarismos alinhados ou antigos. Comumente os algarismos antigos são usados no interior do texto e são projetados para se “disfarçar” no meio deste, possuindo um desenho com ascendentes e descendentes da mesma forma que as letras caixa-baixa, mantendo a mancha de texto da página uniforme. Os algarismos alinhados, como o nome já diz, ficam alinhados entre si e são aqueles que a maioria das 92 pessoas conhece, todos do mesmo tamanho, equiparando-se, em altura, às letras maiúsculas. Da mesma maneira que existe uma “etiqueta” tipográfica para os algarismos, existem também para outros detalhes, como para o uso do hífen, do travessão, das aspas, das versais ou versaletes etc. Sobre as citações, elas podem ser vistas como um problema, pois elas precisam se integrar ao texto (sem que sejam “puladas” pelos leitores) e também se diferenciar das palavras do autor que as menciona, ocorrendo também dúvidas sobre sua melhor localização e tipografia (HENDEL, 2006). Dependendo do tipo de conteúdo do livro, são muitas as minúcias que podem ser exploradas pelo designer, tipógrafo e diagramador. Outros elementos que podem habitar o livro e que também necessitam de um design diferenciado são as tabelas, gráficos, diagramas, imagens e suas legendas, listas e linhas do tempo. A inserção desses elementos em um livro digital customizável deve ser ainda mais cuidadosa, pois a alteração da letra e do seu tamanho, por exemplo, nãopodem desestruturar esses elementos citados. Uma solução utilizada por alguns designers para evitar esse tipo de problema é a incorporação desses elementos como imagem, abrindo mão de ações que o leitor poderia fazer, caso estes fossem vinculadas diretamente ao que o software recebe como texto. As notas podem ser notas de rodapé, de margem/lateral ou de fim. No meio digital as notas de rodapé e as notas de fim se tornam híbridas, pois normalmente elas são listadas no fim do capítulo ou do livro – como as notas de fim do livro impresso – mas existe a vantagem de poderem ser acessadas através do hiperlink de forma rápida e imediata – tal qual ocorre com as notas de rodapé. Com essa revisão bibliográfica é possível perceber uma série de convenções que caracterizam visualmente a estrutura do livro e influenciam na ideia do mesmo, construída por cada leitor. Na próxima seção, parte-se para as definições já instituídas que definem o livro a partir de diferentes parâmetros. 4.2. DEFINIÇÕES SANCIONADAS De acordo com o Art 2° da lei brasileira nº 10.753, que instituiu a Política Nacional do Livro, no Brasil, “Considera-se livro, para efeitos desta Lei, a publicação de textos escritos em fichas ou folhas, não periódica, grampeada, colada ou costurada, em 93 volume cartonado, encadernado ou em brochura, em capas avulsas, em qualquer formato e acabamento” (BRASIL, 2003, online). A partir dessa definição, percebe-se a importância dada à forma física com que o livro é apresentado, o que se torna perceptível pela menção à encadernação do volume, abrangendo também diferentes tipos, formatos e acabamentos, mantendo-se este conceito fiel ao modelo tradicional de livro. Também é evidenciada a exclusão, dentro dessa nomenclatura, de outros materiais que são publicados periodicamente, evitando que, pelos formatos/conteúdos destes, possam ser equivocadamente nomeados da mesma forma. Além disso, também se tornou “obrigatória a adoção do Número Internacional Padronizado, bem como a ficha de catalogação para publicação” (BRASIL, 2003, online). A menção ao livro em formato digital é feita, entretanto, com a ressalva de ser este para uso exclusivo de pessoas com deficiência visual, ficando claro que o modelo preferencial é o impresso. Para a UNESCO (1964, p. 144, tradução nossa) “um livro é uma publicação impressa não periódica com no mínimo 49 páginas77, excluindo as capas, publicado em um país e disponível ao público” 78. Enquanto a lei brasileira destaca a presença de texto escrito como uma das características essenciais do livro, a UNESCO deixa esse ponto em aberto, prevendo a existência de obras cujo principal conteúdo tenha caráter imagético. A restrição imposta pela norma, quanto ao número mínimo de páginas, deixa clara a importância dada ao conteúdo, diretamente relacionado ao tamanho do volume. Deve-se levar em consideração que o documento da UNESCO está buscando parâmetros que diferenciem os livros dos periódicos, de modo a tornar possível a reunião e comparação dedados estatísticos internacionais relacionados à produção educacional, científica, cultural e institucional (UNESCO, 1964). Para isto, destaca os aspectos que os diferenciam, como, por exemplo, o número de páginas. Entretanto, vale dizer que a regra que abrange o número de páginas, pode ser facilmente burlada através do projeto gráfico, que pode manipular o tamanho da página, a tipografia, as margens, o espaçamento entre as linhas etc., pois um mesmo texto pode ocupar em um projeto 20 páginas e, em outro, 150. Também deve ser levado em consideração que existem gêneros de livros cuja proposta nem sempre é compatível com essa norma, apresentando, às vezes, uma 77 Entre 5 e 28 páginas é considerado livreto. 78 Citação Original: “A book is a non-periodical printed publication of at least 49 pages, exclusive of the cover pages, published in the country and made available to the public”. 94 quantidade de páginas inferior a 49, o que não os exclui dessa nomenclatura. Outro detalhe interessante da definição da UNESCO é a exigência de que tenha sido publicado em algum país e que esteja disponível a um público, ou seja, não basta uma pessoa produzir uma obra e deixá-la guardada em casa, ou distribuí-la apenas aos amigos; ela deve ser levada ao conhecimento do público, ficando disponível. Nas normas da ABNT, a definição da UNESCO é incorporada junto à atribuição de um número ISBN à publicação, dessa forma, conceituaram o livro como: “Publicação não periódica que contém acima de 49 páginas, excluídas as capas, e que é objeto de Número Internacional Padronizado para Livro (ISBN)” (ABNT NBR 6029, 2006, p. 3). O ISBN (International Standard Book Number) “é um sistema internacional padronizado que identifica numericamente os livros segundo o título, o autor, o país, a editora, individualizando-os inclusive por edição” (ISBN, online). Esse sistema foi criado por editores ingleses em 1967 e oficializado como norma internacional em 1972 pela International Organization for Standartization –ISSO 2108 – 1972. O ISBN otimiza e simplifica a busca e a atualização bibliográfica, mas não é usado exclusivamente para livros, já que outros tipos de publicações também recebem esse número de catalogação. “O ISBN deve ser atribuído a publicações impressas com no mínimo cinco (05) páginas além de softwares e livros eletrônicos”(ISBN, online). Vale ressaltar que dentro do ISBN não existe ainda uma definição objetiva que delimite rigorosamente o que é ou não um livro, o qual, em geral, é trabalhado com um conceito mais amplo. Além disso, cabe destacar que não são somente os livros que são passíveis de receber ISBN, mas também outras publicações como catálogos, guias, álbuns para colorir, agendas..., possuindo, no entanto, algumas ressalvas para alguns desses materiais, como, por exemplo, as agendas, que devem conter “grande predominância de texto e/ou texto e fotografias (muito mais texto/conteúdo do que espaço para anotações, que tem que ser ínfimo, ou seja, quase nenhum)” (ISBN, online, grifo do autor); ou o caso de “cadernos, diários, álbum de bebê, livro de bebê... SOMENTE RECEBERÃO ISBN SE CONTER [contiverem] TEXTOS SIGNIFICANTES E EXPLICATIVOS. (é obrigatório o envio de tais publicações para análise da Agência)” (ISBN, online, ênfase do original).Para solicitar o ISBN basta preencher um formulário específico para tal fim e incluir os dados da Folha de Rosto, que deve conter: Autor, Título e Subtítulo (se houver), Edição, Local, Nome do Editor e Ano da publicação (ISBN, 95 online). Para receber o ISBN não é preciso que o livro seja analisado, a menos que a Agência julgue necessário. Neste caso, solicitará que lhe sejam enviadas as 15 primeiras páginas da obra ou a obra completa, para que seja efetivada a referida análise (ISBN, online). Se tratando de uma publicação eletrônica, a Agência Brasileira de ISBN considera que um livro eletrônico, em CD ROM ou disponível na internet, receberá ISBN desde que: Contenha texto; Esteja disponível ao público; Não haja nenhuma intenção de que a publicação seja um recurso continuado. Tais publicações podem ser também compostas de figuras e sons. Material de link como por exemplo, hipertexto, só será considerado coberto pelo mesmo ISBN se fizer parte da publicação. Ao se observar esses documentos que versam sobre livros, redigidos por órgãos públicos e instituições, percebe-se que todos foram criados para resolver algum tipo de problema. A lei brasileira n° 10.753 destaca a variedade de encadernações e formatos que os livros podem ter, mas esquece daqueles que são constituídos basicamente por imagens. A UNESCO, ao criar sua definição, estipulou um número mínimo de páginas para que, agrupadas, possam constituir-se em um livro. Dessa forma restringiu a sua definição, excluindo outrosmateriais impressos, que também poderiam ser não-periódicos e erroneamente nomeados como “livros”. Não se sabe como a UNESCO chegou a esse número, mas analisando que foi estabelecido um número mínimo e não um número máximo de páginas, a principal característica do livro, seria o tamanho da publicação, que deveria superar, em quantidade de folhas, as outras publicações. A exigência do número ISBN pela lei brasileira e pela norma da ABNT visa facilitar a busca por determinada edição de uma publicação, sendo esta função a mais importante e que causa maior preocupação a essa Agência. Vale ressaltar que entre os dados solicitados para o requerimento desse número está o nome do editor, o que leva a crer que exista uma preocupação com a “qualidade” do material enviado, uma vez que, na editora, deve existir alguém que analise o produto antes de seu encaminhamento, além do seu próprio autor, o que, de certa forma, impediria a autopublicação. Outro dado interessante é que as informações solicitadas pelo ISBN conferem confiabilidade ao conteúdo catalogado, já que de posse das mesmas se pode chegar até a origem da publicação, tendo em vista que o autor deve 96 informar o ano e o local em que o material foi produzido, se é a primeira vez que ele é publicado e quem foi o editor que concordou com a publicação do mesmo. Por fim, nas normas da ABNT, a definição da UNESCO e a utilização do ISBN são revalidadas. Se as quatro definições encontradas nessas instituições do livro (Lei n° 10.753, UNESCO, ISBN, ABNT) forem mescladas, o livro seria um artefato: • Majoritariamente textual; • Não-periódico; • Relativamente grande (mínimo de 49 páginas); • Sem padrão específico de encadernação (mas devendo ser físico); • Destinado e disponível a um grupo de pessoas; • Encontrável/referenciável (com ISBN); • Confiável (revisado por outra pessoa, além do autor). 4.3. PARALELOS E APROXIMAÇÕES ENTRE O IMPRESSO E O DIGITAL: DEFINIÇÕES EM REVISÃO BIBLIOGRÁFICA As divergências de opiniões acerca do livro digital foram levantadas por diversos autores, como Furtado (2006), Ribeiro (2012), Moraes (2012), Oliveira (2013), entre outros. Furtado (2006) demarcou a falta de padrão para o próprio termo que define o livro eletrônico, onde menciona que são “[…]usados indistintamente: ‘edição on-line, edição digital, documento eletrônico ou digital, livro eletrônico, livro digital, livro virtual, e-book, livro desmaterializado’” (FURTADO, 2006,p. 42-3). A palavra mais utilizada comercialmente é e-book, que é uma abreviação de "electronic book" (livro eletrônico). Além da falta de consenso para a denominação do artefato em questão, Moraes (2012) pontuou que também existiam dúvidas em torno do que seria um livro digital: para alguns se tratava de um software e, para outros, um hardware. Ressaltou ainda, que cada grupo – de acadêmicos, leitores, editores, jornalistas… – criou um conceito diferente, muitas vezes causando conflito, pois que o posicionamento de um grupo era incompatível com o de outro. Desse modo, ao falar sobre o livro, muitos autores sentiam a necessidade de definir a qual tipo estariam 97 se referindo ao longo de seus textos. Moraes (2012) mostrou dois exemplos que retratam essa situação dentro da mesma editora universitária, a Oxford Press, que apresentam definições distintas para falar de livro. O norte-americano Ted Striphas deixou claro que ao usar a palavra livro, estaria fazendo menção ao volume impresso e utilizou, inclusive, a expressão p-books (print-books) traduzida como “livros impressos”, para se referir a estes. Já Alan Jacobs afirmou que, para ele, o livro seria determinado pelo conteúdo, independente da forma com que se apresentasse. Moraes percebeu que “Os autores se dividem entre considerar que a materialidade representa o livro em si ou ponderar que há um conteúdo independente do meio” (MORAES, 2012, p. 25). Ao abordar especificamente o livro eletrônico, Moraes (2012) apontou a existência de dois paradigmas para a interpretação do e-book: um evolutivo, onde o meio eletrônico seria um substituto natural do papel; e outro, histórico-cultural, onde o meio digital não seria uma mera transposição de conteúdos, e sim, uma gama de novas possibilidades para o leitor apreender o que lhe foi disponibilizado para leitura. Ressaltou que essa mudança de conteúdos e recursos no livro, não depende exclusivamente da mídia e sim de uma série de processos históricos e sociais. O pesquisador ainda afirmou que uma das táticas para definir o livro digital seria demarcar suas fronteiras e o primeiro limite apresentado seria o próprio livro impresso, já que o antecede historicamente. Ao aplicar o termo “livro” ao texto eletrônico, este último “passaria a ser tanto menos significativo quanto mais se distanciar[distanciasse] do universo conceitual do livro impresso ao qual está[estaria] originalmente vinculado” (MORAES, 2012, p. 39), ou seja, um texto eletrônico só deveria ganhar a condição de livro após ser legitimado através de alguma das estruturas herdadas da era do impresso. Entretanto o próprio livro impresso é motivo de debate, já que pode ser abordado por seu conteúdo, por seu aspecto morfológico ou por seu impacto na prática cultural. Haslam (2007, p. 9) tentou abarcar esses três aspectos ao apresentar sua definição: “Livro: um suporte portátil que consiste de uma série de páginas impressas e encadernadas que preserva, anuncia, expõe e transmite conhecimento ao público, ao longo do tempo e do espaço”. O autor destacou em sua definição a morfologia do livro impresso (páginas impressas encadernadas), seu conteúdo (conhecimento) e o impacto na prática cultural (preservação ao longo do tempo e do 98 espaço). Quando Haslam (2007) construiu essa definição, o cenário tecnológico ainda não apresentava boas opções de leitores digitais comercialmente viáveis e, inclusive, na 2ª edição do livro, o editor adicionou a nota “Em 2010 o cenário mudou com os novos dispositivos eletrônicos de leitura” (HASLAM, 2007, p. 12). Ao buscar um conceito para livro digital, Mello Jr. (2006) também realizou esse movimento de buscar uma definição institucionalizada de livro (impresso) e partiu da definição dada pela Unesco, conceituando o livro eletrônico como: arquivos em TXT, PDF, HTML, e qualquer outro formato que suporte textos escritos. Armazenados em disquetes, CDs, DVDs, HDs, Palms, e-books79 (suportes dedicados especificamente ao armazenamento e leitura de livros eletrônicos), cujos conteúdos e forma de organização correspondam ao de no mínimo 49 páginas no formato impresso (p. 13-4). Entretanto, ele relativizou esses parâmetros com a sua experiência pessoal como editor, questionando a influência do projeto gráfico na quantidade de páginas que um livro poderia ter e buscou ser mais específico, concluindo sua definição com as seguintes especificações: - Edição não periódica; - Composta de no mínimo por 100.000 caracteres (uma página impressa no formato 14x21 – com mancha composta por 30 linhas de 70 caracteres sem espaço); - Presença de índice e paginação; - Elemento declaratório que caracterize o texto eletrônico como livro (MELLO JR. 2006, p. 15). A partir do questionamento do autor sobre o número de páginas, percebe-se a mesma observação feita na seção anterior quando foi apresentada a definição da UNESCO. Existe um parâmetro que envolve o tamanho do conteúdo armazenado em um livro, mas a maneira de apontar esse critério não abarca todas as possibilidades. Afinal, muitos livros possuem um número de páginas inferior a 49 ou, um total menor de 100.000 caracteres e possuem ISBN, o que leva a crer que esse limite não é tão rígido ou que dentro do universo dos livros existem segmentos com características específicas. Para Kelly (2011, e-book), um livro é um “corpo de conhecimento que leva mais de uma hora paraser lido. Um livro é completo no sentido de que ele tem seu próprio começo, meio e fim”. Pensar o tamanho do livro relativizado com o tempo que levaria para ser lido poderia ser uma saída, mas novamente existem 79 Neste trecho ele utiliza o termo e-book para referir-se ao que chamamos de e-reader ao longo da dissertação. 99 peculiaridades que não foram previstas nesse conceito operacional, como, livros constituídos majoritariamente por imagens, que poderiam ser consumidos em menos tempo(e seguem sendo chamados de livros) e velocidade de leitura, que é uma atividade pessoal e, assim, um mesmo livro pode ser lido em um dia por uma pessoa e em um ano por outra. Alguns aplicativos de leitura digital já possuem a ferramenta que calcula quanto tempo o leitor irá demorar para ler, em função do tempo que consome o conteúdo de cada página e ao invés de informar que faltam X páginas, informa que faltam X horas e minutos para o término do livro. Em função de tantas variantes, mantém-se uma definição de livro, a qual afirma que este seria um material relativamente grande, porém com peculiaridades, ou exceções, dentro de um conjunto de fatores. Na avaliação de seu conteúdo, pode-se priorizar um critério em detrimento de outros. Outro detalhe apontado por Mello Jr. (2006) que merece destaque é a necessidade de existência de um “elemento declaratório que caracterize o texto eletrônico como livro”. Essa colocação é interessante, pois, no meio digital, muitos conteúdos diferentes podem possuir configurações visuais semelhantes, o que dificulta a identificação do material. Levando-se em consideração que a forma como o texto é apresentado ao leitor influencia em sua construção de sentido (GRUSZYNSKI, 2007; CHARTIER, 1999), ao se exigir que o conteúdo disponibilizado se autodeclare como livro, evita-se que o leitor atribua uma postura errônea para a leitura, que pode levá-lo a confundir um blog ou um site com um livro digital e vice-versa. Da mesma forma que Mello Jr. (2006) relacionou o impresso com o digital para construir uma definição, a construção do significado livro também incorporou mudança de suporte (do rolo para o códex) ao longo de sua história, como mostrou Chartier (1997), com o exemplo de Santo Agostinho, em “Cidade de Deus”, onde é percebido que inicialmente a quantidade de texto que era permitido incluir em um rolo passou a ser unidade de discurso, definindo o tamanho das seções da obra referida. Pensando na caracterização do livro digital por seu conteúdo, Furtado (2006, p. 51-2) comentou que “um e-book tem sido geralmente descrito como um corpo de conteúdo monográfico que é “publicado” com o design e com a intenção de ser acessado eletronicamente”. Da mesma forma a Association of American Publishers 100 define o livro digital como uma obra literária com um conteúdo monográfico, apresentada como um objeto digital, que possui padrões de identificação e metadados, sendo destinado a ser publicado/acessado digitalmente (FURTADO, 2006). Ludwig (2010) buscou inicialmente várias definições retiradas de dicionários impressos e digitais, para posteriormente pensar no livro digital: o livro é uma reunião de folhas ou cadernos, soltos ou cosidos, ou por qualquer outra forma presos por um dos lados, e enfeitados ou montados em capa; obra literária, cientifica ou artística que compõem, em regra, um volume; registros para certos tipos de anotações, sobretudo comerciais; é um volume transportável, composto por páginas encadernadas, contendo texto manuscrito ou impresso e/ou imagens e que forma uma publicação unitária (ou foi concebido como tal) ou a parte principal de um trabalho literário, cientifico ou outro; é um produto intelectual e, como tal, encerra conhecimento e expressões individuais ou coletivas; um produto de consumo, um bem e sendo assim a parte final de sua produção é realizada por meios industriais (impressão e distribuição) (LUDWIG, 2010, p. 39). A pesquisadora também definiu o livro digital a partir do seu conteúdo, semelhante ao impresso: E-books são na verdade livros, com a única diferença de estarem no formato digital e não em papel como no livro tradicional. Um e-book pode ser lido na tela de um computador, em um laptop, aparelhos celulares, aparelhos próprios para lerem e-books como o e-book reader, ou, ainda, impressos em papel comum, por meio de uma impressora (LUDWIG, 2010, p. 45). A autora ainda citou a classificação de Bonezi (2007)80 que define os livros digitais a partir dos seus formatos, considerando os que não podem ser alterados pelo leitor ou que foram concebidos para e-readers, como e-books genuínos81, introduzindo no meio digital a característica de fixidez mais própria do impresso. Não obstante, observa-se que a autora deixa a desejar ao não abordar outras características que poderiam ser mais bem exploradas no meio digital. Mesmo adotando vários parâmetros análogos ao livro impresso, Ludwig (2010) se mostrou aberta às possibilidades de mistura de linguagens e à exploração 80 BONEZI, Luciane Adami. Usabilidade dos livros eletrônicos: um estudo de caso com os alunos do curso de biblioteconomia da UDESC. Trabalho de Conclusão de Curso. Orientação: Noêmia Schoffen Prado. Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Ciências Humanas e da Educação, Departamento de Biblioteconomia e Gestão da Informação: Florianópolis, 2007. 81 Assim deixou de fora arquivos em formato ASCII, EXE (executáveis em geral), DOC (MS Word), HTM ou HTML, XML, RTF (RichText Format), FLASH (arquivos Macromedia Flash), TXT (Bloco de Notas), XHTML e ZIP (arquivo compactado). Logo, para Bonezi (200781 apud. LUDWIG, 2010), os arquivos genuínos seriam eBook Pro (Executável), KML (hiebook), Libros em Red (Executável), LIT (MS Reader), NetLibrary Reader, PDB (MobiPocket Reader), PRC (PalmReader), PDF (Acrobat eBook Reader), RB (RocketEdition), Soft Book Edition, Reb 1100 (baseado em rb) TK3 (TK3 Reader), WineBook (executável) e Galss Bookreader (baseado em PDF). 101 do hipertexto no livro digital. Como seu objeto de estudo era do gênero infantil, ela sentiu a necessidade de excluir histórias animadas em DVD, que, por conterem legenda, também possibilitariam a leitura. No entanto, ela percebeu que, no caso de filmes e desenhos animados, a legenda se caracteriza como complemento de ajuda e não como objeto central, como acontece no livro e, consequentemente, no livro eletrônico. Mesmo que o objeto deste trabalho não esteja centrado no livro infantil, essa argumentação da pesquisadora envolvendo o conceito em si diferenciando o que seria o conteúdo principal do material e o que seria complementação, pode ser interessante na definição de alguns gêneros de livros, principalmente quando são exploradas linguagens que estão mais associadas a outras mídias, como televisão, cinema, jogos etc., e não aquelas mais recorrentes nos livros impressos (texto e imagem). A pesquisadora estipulou, ainda, que para um conteúdo ser considerado como um livro digital, alguns itens devem ser observados, como: a possibilidade de se efetivar a leitura em um suporte digital, sem fazer distinção entre os possíveis aparelhos que podem ler a linguagem multimídia, como celulares, computadores, e-readers , dvds etc.; a existência de um texto e/ou imagem, excluindo-se publicações apenas sonoras; e compreensão total da história, excluindo-se amostras de livros onde são disponibilizadas apenas algumas páginas ou os primeiros capítulos. Ribeiro (2012) afirmou que a mudança da materialidade do livro impresso para o digital não interfere na configuração mais geral do livro. Diz que apesar do livro digital necessitar de um software e de um hardware para ser lido, diferente do similar impresso que se constitui em um objeto único, ambos os artefatos têm amesma finalidade e guardam arquiteturas semelhantes, portanto um objeto que serve para (1) conservar a memória da criação intelectual humana, especialmente a textual, cujo formato seja (virtualmente ou não) o de (2) páginas e cadernos organizados e divididos, tendo natureza (3) analógica ou digital, muito provavelmente será um livro (RIBEIRO, 2012, p. 7). A definição de Ribeiro (2012) apontou para um livro digital que se aproxima da ideia do impresso, mantendo sua configuração muito semelhante ao mesmo. Ao longo desta dissertação surgirão alguns exemplos de obras que vêm sendo chamadas de livros digitais, mas que não são claramente percebidas como tal. Com base nesta revisão bibliográfica, criou-se uma tabela para averiguar os pontos em comum existentes nas definições e características do livro apontadas 102 pelas instituições e autores estudados (Apêndice E). A partir da análise desses dados, observou-se que não existe uma unanimidade nos parâmetros que definem o livro. Alguns autores generalizam em demasia, deixando margem para que outros conteúdos sejam também categorizados como livro, e outros se esquecem de delimitações básicas que deveriam ser incluídas. Sendo assim, concluiu-se, após reflexões realizadas, que o livro em si pode assumir diferentes formas de apresentação e construção e, portanto, não se deve forjar um princípio totalizante que não abranja essas nuances, mas sim relacionar uma série de aspectos que devem ser levados em consideração. Ao se avaliar as considerações apontadas até então, foram elencados parâmetros a serem considerados na constituição de um livro. Delimitaram-se alguns itens que obrigatoriamente deveriam constar em uma publicação para que esta possa ser considerada de fato um livro (impresso ou digital) e outros que seriam desejáveis e, por isto, podem ser relativizados em função da proposta da obra. Assim, salienta-se que o livro deve possuir, obrigatoriamente, os seguintes quesitos: 1) Constituir-se de uma publicação não-periódica; 2) Ser publicado (tornado público), estando disponível para ser adquirida e/ou acessada por um grupo de pessoas ou instituição; 3) Possuir identidade própria, ou seja, ser uma unidade completa em si, dotada de começo, meio e fim; 4) Deve haver, após a publicação da obra, um cuidado especial com a sua preservação. O seu conteúdo deve se manter inalterado, caracterizando uma edição; 4.1) Caso seja alterado/atualizado, e essas alterações não modificarem suficientemente o conteúdo para caracterizar uma nova edição, deve haver um registro público das mesmas mostrando o texto anterior e indicando as suas modificações. 5) Existir um número ISBN referente à obra, juntamente com metadados sobre a mesma, de modo a possibilitar que esta seja identificável e referenciável, devendo ainda indicar, no mínimo: 5.1) um responsável pela obra (autor, grupo, instituição, empresa); 5.2) um título que identifique a publicação; 103 5.3) o ano em que a edição foi publicada; 5.4) a editora responsável pela publicação; 5.5) o país de origem da publicação. 6) Haver responsabilidade na transmissão do conteúdo, ou seja, este deve ser revisado buscando a minimização de erros; 7) Possuir um elemento declaratório que o caracterize como livro (ficha catalográfica ou outra indicação textual). Os parâmetros desejáveis, mas não obrigatórios, para que um livro seja considerado como tal são: 8) um tamanho relativamente grande, se comparado com os outros tipos de publicações editoriais; 9) um conteúdo que possua como elemento principal o texto escrito; 10) uma estrutura de organização do seu conteúdo composta por elementos pré-textuais, textuais e pós-textuais; 11) a possibilidade de ser consumido em diferentes locais, podendo ser transportado fisicamente ou virtualmente de um aparelho para outro. No início desta pesquisa imaginava-se que seria necessário descartar as definições encontradas e criar algo totalmente novo, contudo se presou pelo bom senso e se observou que cada uma delas possuía algo de essencial na caracterização deste artefato cultural e técnico, tornando-se mais adequado, no momento, efetuar uma compilação dos quesitos julgados mais adequados para que se possa fazer um recorte que favoreça uma futura definição de livro mais abrangente, abarcando o impresso e o digital. 5. DISTANCIANDO-SE DO IMPRESSO Até este momento o livro digital foi tratado como um análogo ao impresso. As explorações apresentadas até então buscam um denominador comum entre os dois meios, respeitando as especificidades de cada um. A partir desta seção se começa a explorar mais potencialidade do meio digital, afastando-se, assim, das convenções associadas ao papel. Esse percurso inicia com o hipertexto, resgatando sua história e mostrando que, apesar de sua origem anteceder em muitos anos a possibilidade de vir a existir uma tecnologia semelhante à digital, foi justamente no computador que este começou a ser mais bem compreendido e utilizado, dando a falsa impressão de ser um recurso nativo do meio eletrônico. Após esse resgate histórico, passa-se então para as possibilidades narrativas criadas a partir do hipertexto. Dentro destas, é oferecido ao leitor a sensação de ser mais dono de sua leitura, podendo escolher, dentro das opções disponíveis, como conduzir a história que está sendo lida. Dentro das alternativas oferecidas pelo meio digital o livro não precisa mais ser um objeto encerrado em si mesmo. Pode servir de plataforma para a interação entre leitores e autores, que podem discutir a partir do texto lido, coletivamente, como será mostrado no SocialBook, de Bob Stein (2013).Tampouco é necessário estabelecer uma única ordem de leitura através da organização do texto disposto em páginas sequenciais como é realizado no impresso. Também são mostrados exemplos, citados por Meyers (2011), de formas com que o conteúdo poderia ser exibido ao usuário, dando maior liberdade para o leitor decidir o caminho de leitura a ser seguido. E, por fim, neste capítulo, apresentam-se duas iniciativas de exploração de texto no meio digital, nas quais os grupos defendem a ideia de se criarem textos que não possam ser realizados no papel sem perda de significados. 105 5.1. HIPERTEXTO A ideia do hipertexto sempre esteve presente na história do livro de diferentes maneiras. Chartier (2002), por exemplo, comentou sobre os marginalia (anotações feitas nas margens dos livros/códex), os índices e notas de rodapé, assim como a estrutura e organização dos textos de enciclopédias, nos séculos XVI e XVII. Landow lembrou que Michel Foucault já apontava para o fato de as fronteiras do livro não serem claramente demarcadas, já que existia um sistema de referências para outros volumes, textos, sentenças, tornando-se, assim, um nó em uma rede de ideias e referências (LANDOW, 2006). O mesmo autor também mostrou como Roland Barthes descrevia uma forma de textualidade que combinava textos compostos por blocos de palavras ou imagens, conectados eletronicamente por múltiplos caminhos, sequências ou trilhas, incidindo em uma aberta e permanente não-acabada textualidade (LANDOW, 2006). Contudo, todas essas explicações eram muito abstratas. Landow (2006) percebeu que para ensinar seus alunos a entender realmente o que significava essa rede de conexões, seria necessário fazer com que eles experimentassem uma leitura hipertextual feita no computador. Apesar da origem remota, foi apenas em 1965 e já relacionadas ao formato digital, que essas propostas receberam o nome de hipertexto (NELSON, 1965). Ao cunhar o termo hipertexto, Nelson (1965) se referia a um novo modo de publicação, uma forma não sequencial de escrita, um texto que permitisse escolhas ao leitor em uma tela interativa. O autor utilizou a palavra/prefixo “hiper” para caracterizar a expansão117 Figura 15 - The making of Life of pi ......................................................................... 122 Figura 16 – A Árvore dos sonhos ............................................................................ 123 Figura 17 –How to cook everything ......................................................................... 124 Figura 18 - Projeto experimental do aplicativo Um livro diferente para cada leitor, uma ajuda diferente para cada leitura ......................................... 126 Figura 19 - Aplicativo Os elementos ....................................................................... 127 Figura 20 - Exemplo de exploração não-linear de linha do tempo .......................... 128 Figura 21 - Exemplo de narrativa clarificada com linha do tempo ........................... 129 Figura 22 – Sumário da Bíblia (aplicativo) ............................................................... 130 Figura 23 - Prezi ...................................................................................................... 130 Figura 24 - Projeto experimental do aplicativo ê-Cordel .......................................... 132 Figura 25 - Livro lido no aplicativo TED Books ........................................................ 133 Figura 26 - Electronic Literature Collection, volume 2 ............................................. 137 Figura 27 - Projetos de literatura digital para web ................................................... 137 Figura 28 - Tríade que forma o e-Book ................................................................... 140 Figura 29 - Esquema proposto para compreensão do e-book ................................ 141 Figura 30 - Rocket eBook ........................................................................................ 143 Figura 31 - Esquema visual dos primeiros e-readers .............................................. 145 Figura 32 - Funcionamento da tela e-Ink (1) ........................................................... 146 Figura 33 - Funcionamento da tela e-Ink (2) ........................................................... 146 Figura 34 - Funcionamento da tela e-Ink (3) ........................................................... 147 Figura 35 - Tela e-Ink vs. LCD ................................................................................ 148 Figura 36 - Foto de tela e-Ink com iluminação ........................................................ 149 Figura 37 - Funcionamento da iluminação da tela e-Ink .......................................... 150 Figura 38 - Diferença na interface de software para smartphone e tablet. .............. 151 Figura 39 - Selos do aplicativo Kobo ....................................................................... 157 Figura 40 - Menu de configurações do Bluefire Reader .......................................... 158 Figura 41 - Ferramentas do software Adobe Reader .............................................. 159 Figura 42 - E-book com tipografia padrão diferente ................................................ 162 Figura 43 – Elementos que formam o conteúdo do livro digital ............................... 163 Figura 44 - Projeto Gutenberg ................................................................................. 165 Figura 45 - Diferença entre EPUB/MOBI e PDF ...................................................... 168 Figura 46 - Alice for iPad e A menina do nariz arrebitado ....................................... 169 Figura 47 - Livro digital com indicação de suporte .................................................. 175 Figura 48 - Vida Peregrina ...................................................................................... 181 Figura 49 - A Princesa e o Sapo ............................................................................. 191 Figura 50 - Little Red Riding Hood .......................................................................... 192 Figura 51 – Color Uncovered .................................................................................. 193 Figura 52 - The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore ............................. 194 Figura 53 - Quem soltou o pum? ............................................................................. 195 Figura 54 - Dragoberto ............................................................................................ 195 Figura 55 - 18:30 ..................................................................................................... 197 Figura 56 - Dois palitos ........................................................................................... 198 Figura 57 - Almanach de Pelotas de 1913 .............................................................. 200 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Identificação I ........................................................................................... 28 Tabela 3 - Identificação II .......................................................................................... 28 Tabela 4- Identificação III .......................................................................................... 29 Tabela 5 - Acesso ..................................................................................................... 30 Tabela 6 - Funcionalidades I ..................................................................................... 31 Tabela 7 - Funcionalidades II .................................................................................... 32 Tabela 8 - Funcionalidades III ................................................................................... 33 Tabela 9 - Potencialidades do meio digital I .............................................................. 34 Tabela 10 - Potencialidades do meio digital II ........................................................... 35 Tabela 11 - Potencialidades do meio digital III .......................................................... 35 Tabela 12 - Aproximação da ideia de livro impresso (remediação) ........................... 37 Tabela 13- Projeto Gráfico de Interface .................................................................... 38 Tabela 14– Corpus: artefatos analisados .................................................................. 41 Tabela 15- Elementos da capa e da lombada ........................................................... 81 Tabela 16 - Elementos da contracapa e orelhas ....................................................... 82 Tabela 17 - Marcações de parágrafo ........................................................................ 91 Tabela 18 - Softwares que utilizam Adobe SDK e Webkit ....................................... 161 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 15 1.1. Proposta e contextualização da pesquisa .......................................................... 20 2. METODOLOGIA ................................................................................................... 24 2.1. Procedimentos ................................................................................................... 26 2.2. Corpus ................................................................................................................ 39 2.3. Estado da Arte .................................................................................................... 44 3. O LIVRO IMPRESSO: MATERIALIDADEE HISTÓRIA........................................ 47 3.1. O livro impresso a partir de sua materialidade ................................................... 50 3.2. A constituição do livro: do manuscrito ao impresso (resgate histórico) ............. 54 3.3. A inserção da tecnologia digital e a remediação do livro .................................... 62 4. O LIVRO HOJE: CONSTRUINDO PARÂMETROS DE IDENTIFICAÇÃO E DEFINIÇÃO ..................no espaço, para definir os objetos incapazes de ocupar espaços lineares. Assim, “‘Hipertexto’ significa um corpo de material escrito ou pictórico interconectado de uma forma tão complexa que não poderia ser convenientemente apresentado ou representado no papel82" (NELSON, 1965, p. [99?]). Apesar de o termo ter sido criado por Nelson (1965), o primeiro uso desta tecnologia para registrar as redes complexas de ideias e associações que caracterizam a forma como pensamos, foi feito por outro pesquisador – Vannevar 82 Citação original: “’Hypertext’ to mean a body of written or pictorial material interconnected in such a complex way that it could not conveniently be presented or represented on paper”. 106 Bush – em quem Nelson se baseou para criar a sua proposta. Bush apresentou o texto “As we may think” (1945), para discorrer sobre seu projeto de máquina da memória, a qual nomeou de Memex. A motivação de Bush (1945) para inventar algo novo foi a sua frustação com as normas de indexação utilizadas nas bibliotecas, onde as informações estavam localizadas em apenas um local, organizadas conforme uma série de regras, através de códigos alfanuméricos, classes e subclasses nem um pouco intuitivos. O título de seu texto “As we may think” (Da forma como pensamos) resume o conceito principal de organização proposto pelo autor. Bush (1945) observou que a mente humana opera por meio de associações. “Quando um elemento está ao seu alcance, [o pensamento] salta instantaneamente para o próximo sugerido pela associação de pensamentos, de acordo com uma emaranhada rede de atalhos contida nas células do cérebro” 83 (BUSH, 1945). Com esse objetivo em mente ele projetou o Memex, que tinha a finalidade de armazenar e resgatar vários tipos de documentos: livros, fotografias, filmes, programas de televisão, assim como sons e gravações de fala, todos seriam indexados pela lógica da associação e não da indexação por classes e subclasses. Bush (1945) e Nelson (1965) concordaram no sentido deque as formas de classificação e categorização existentes no meio impresso não deveriam ser descartadas, porque elas se faziam eficientes para encontrar os volumes em determinadas situações. No entanto tinham consciência de que um mesmo tópico poderia gerar diferentes associações e, em função disso, pretendiam suprir essa necessidade em seus projetos. Infelizmente, o Memex não chegou a ser produzido de fato, mas existem vídeos84 e ilustrações (Figura 10) disponíveis na internet que ilustram como ele poderia ter sido, seguindo as especificações que Bush (1945) realizou em seu artigo. No entanto, seu projeto inspirou muitos cientistas e teóricos, como o próprio Ted Nelson, cujas obras serão abordadas ao longo desta dissertação. 83 Citação original: “With one item in its grasp, it snaps instantly to the next that is suggested by the association of thoughts, in accordance with some intricate web of trails carried by the cells of the brain”. 84 Disponível em: . Acesso em 15 ago. 2013. http://youtu.be/q3R8sXTOvrY107 Figura 10– Memex Ilustração de como seria o Memex. Fonte: Telecollaboration: Beyond Memex and NLS, Disponível em: , acesso em 9 set. 2013. Nas palavras de Bush (1945), o Memex seria como um escritório, que permitiria a uma pessoa armazenar todos os seus livros e arquivos de uma forma mecanizada, o que possibilitaria localizá-los e consultá-los com rapidez e flexibilidade. Ao se deparar com a descrição do Memex é inevitável não associá-lo ao uso atual que se faz do computador e por isso, inclusive, muitos pesquisadores o veem como um antecessor do mesmo (DIJCK, 2007). De acordo com a tecnologia da época, o autor projetou algo que seria parecido com uma mesa de escritório onde na parte superior existiriam telas translúcidas inclinadas – cujo material empregado consistiria em um microfilme, onde se visualizaria a imagem do material consultado – e um teclado com uma série botões e alavancas. Os documentos poderiam ser buscados através do sistema tradicional de indexação das bibliotecas onde, ao se inserir o código pelo teclado, a capa do livro seria projetada em um dos seus visores. Através das alavancas, seria possível folhear o livro com diferentes tipos de velocidade, análogos ao movimento que o leitor faria na alavanca (movimentos vagarosos mudariam página por página; mais rápidos, avançariam dez páginas de cada vez e, mais rápidos ainda, cem páginas; ressaltando que movimentos para a direita conduziriam à progressão da leitura e, para a esquerda, a retrocederiam até o início). Bush (1945) também projetou um botão especial para exibir a primeira página do índice rapidamente. http://cs.brown.edu/stc/resea/telecollaboration/story.html108 As funcionalidades do Memex apresentadas até aqui já apresentavam melhorias na busca e consulta de um livro, com ações mais rápidas do que se fossem efetuadas por uma pessoa em meio a livros físicos nas estantes da biblioteca (principalmente porque os livros em questão poderiam estar localizados muito distantes uns dos outros). Contudo, o grande diferencial do Memex – e que inspirou tantos pensadores – é o que acabou se chamando de hipertexto, ou seja, o processo de aproximar/conectar dois elementos diferentes através de um ponto em comum, fazendo associações entre os documentos, sejam eles textuais, sonoros ou visuais. Durante a consulta aos materiais, o leitor poderia criar uma trilha de associações entre os textos, utilizando o teclado e as imagens exibidas nas telas e, ao gravar a conexão entre dois conteúdos, esta ficaria adicionada visivelmente no arquivo, como um índice, podendo ser examinada em outras buscas. O usuário estaria apto a inventar uma trilha associativa e batizá-la com um nome e um código, os quais seriam inseridos através do teclado. A qualquer momento, ele teria a possibilidade de selecionar um trecho e conectá-lo a um determinado código referente a uma trilha. Bush (1945) também se preocupava com a possibilidade de inserir notas e comentários ao longo dos materiais consultados, como em uma página de papel. Para Landow (2006) esse recurso estaria associado à concepção de processo de leitura do visionário, processo este que envolveria a escrita. Além de todos esses recursos, as bibliotecas “pessoais” de cada Memex, juntamente com suas notas e associações, poderiam ser compartilhadas com outros leitores. Inspirado pelo texto “As we may think”, Nelson (1965) também projetou um artefato com o objetivo de organizar as informações. Diferentemente do Memex, que foi idealizado para ser utilizado por qualquer pessoa, o Xanadu – programa projetado por Nelson – foi criado para auxiliar escritores e professores a organizarem suas ideias durante o processo de criação de aulas e textos. Como foi dito anteriormente, a adição do termo “hiper” agregava ao conceito o significado de “espaço”. Nelson (1965) julgava o papel como um suporte que servia de camisa de força, mantendo o documento preso dentro daquele limite imposto por sua característica física. O autor tinha a necessidade de expandir a escrita pelo espaço, permitindo que a informação tomasse a forma que fosse 109 necessária para um melhor entendimento de seu conteúdo. Mesmo se preocupando com as conexões entre os textos, sua maior inquietação era com a maneira com que essa rede de ideias seria apresentada. Para facilitar a compreensão desses pontos de contato entre os diversos materiais – textuais, imagéticos, sonoros etc. – questionava-se sobre qual seria a estrutura necessária para visualizar esse emaranhado de ideias. Nelson iniciou seu trabalho em 1960, sem a ajuda de ninguém (NELSON 1965). Seu objetivo era criar umatécnica para ajudá-lo a organizar seus arquivos pessoais e manuscritos em que estava trabalhando. Ele queria fazer isso de forma fácil e simples, da mesma forma que fazia com cartões, tesoura, fita adesiva e máquina de xerox. Ao projetar seu programa dos sonhos, o Xanadu, toda a complexidade necessária para concretizar essa rede de informações seria mantida com o máximo de simplicidade possível. O autor idealizava uma manipulação e indexação de textos, que poderiam ser pequenos (como anotações) ou grandes (como livros inteiros). Com isso, definiu que seu programa funcionaria como um quadro negro infinito, uma vez que poderia se expandir e abranger o tamanho que fosse necessário, permitindo acrescentar-se outras informações à medida que o processo fosse avançando e tornando-se mais complexo. Observando as tarefas de um escritor, percebeu que o ato de escrever se constitui em um processo lento de rearranjar e reprocessar informações, o que exige milhares de revisões até ficar pronto. “Intelectualmente eles [os textos] são ponderados, justapostos, comparados, adaptados, transpostos, e julgados; mecanicamente eles são copiados, sobrescritos com marcas e revisões, reorganizados e copiados novamente”85 (NELSON, 1965, p. 135, tradução nossa). O ciclo tende a se repetir muitas vezes, ocasionando, portanto, a necessidade de que programa pudesse lidar com uma estrutura que poderia ser modificada e rearranjada. Todas essas anotações deveriam estar disponíveis por todo o período de construção do texto, desde o começo do esboço – quando se tem apenas fragmentos, anotações, frases e ideias confusas – até o momento da finalização do documento. 85 Citação original: “Intellectually they are pondered, juxtaposed, compared, adapted, transposed, and judge; mechanically they are copied, overwritten with revisions markings, rearranged and copied again”. 110 Nelson (1965) também se preocupou com a indexação, para sanar a dificuldade encontrada nas bibliotecas físicas, onde um mesmo arquivo/tópico poderia estar indexado sob ilimitadas categorias. O sistema deveria permitir manipular os termos indexados, através de “dynamics outlining” ou “dynamics indexing”(linhas guia dinâmicas ou indexação dinâmica), fazendo com que as modificações inseridas em parte de um texto, alterassem automaticamente o restante. Pontuou, ainda, que deveriam ser mantidas diferentes versões do documento como um todo, para possibilitar a comparação entre a versão atual de um texto e uma mais antiga. Preocupou-se, sobretudo, com que a disponibilização de todos os recursos não tornasse a utilização do programa complicada. A ideia de Nelson foi baseada no que ele chamou de ELF (Evolutionary List Files, o que poderia ser traduzido por Lista Evolucionária de Arquivos), a qual possuía três elementos básicos: entries, lists e links (entradas, listas e conexões), sendo que a entrada era uma unidade discreta designada ao usuário, a lista consistia na execução de entradas pela ordem determinada pelo operador e a conexão era a passagem que possibilitava conectar duas entradas. O ELF poderia ser pensado como um local, um equipamento de escritório composto de muitas pequenas partes que poderiam ser movimentados de um lugar para outro; e não ser visto apenas como uma máquina. A ideia seria a facilidade de aprendizagem, a simplicidade de uso e a liberdade oferecida para que as pessoas pudessem utilizá-lo da forma que achassem melhor, sem necessariamente existir uma forma correta de utilização do sistema. Entretanto ele sabia que o alto custo, o pequeno senso de necessidade e a incerteza sobre o design do sistema seriam obstáculos claros para a viabilização de seu projeto. Naquela época, os computadores ainda eram vistos como uma ferramenta utilizada apenas por grandes corporações que precisavam fazer cálculos científicos complicados, mas Nelson apostava na possibilidade dessas máquinas fazerem o trabalho “sujo” para as pessoas, organizando essas notas de um modo mais fácil. Até hoje, houve quatro tentativas de implementação: Hypertyper, 1972 (protótipo); Xanadu Green, 1979 (protótipo); Xanadu Gold, 1992 e Xanadu Space, 2008 (protótipo) (Figura 11). Vale salientar que esta última versão pode ser vista no 111 site do Projeto Xanadu86, através da demonstração apresentada pelo próprio Ted Nelson. Figura 11 – XanaduSpace Duas páginas na linha de frente e outras páginas com os hipertextos visíveis. Fonte: NELSON; SMITH, s/n. Disponível em: , acesso em 8 set. 2013. Após essas iniciativas e ao ser incorporado ao meio eletrônico, o hipertexto ganhou destaque, pois foi nas páginas web que ele ficou mais bem realizado nos moldes originais de criação e conexão, conforme imaginado por Bush (1945). No trabalho de Aquino (2007), o hipertexto foi tratado como uma escrita com links, ou seja, “uma escrita construída com elementos que conectam diferentes pedaços de informação” (AQUINO, 2007, p. 20), sejam eles eletrônicos ou impressos. A pesquisadora ainda mostrou que para Nelson (198187, online apud AQUINO, 2007) o hipertexto presente na web não era o mesmo imaginado no seu Projeto Xanadu: A estrutura de links entre documentos forma, para Nelson (1981, online), um fluxo de linhas invisíveis que mantém os pensamentos unidos. Com a quantidade de documentos escritos em todo lugar, tendemos a não enxergar alguns links. O que estamos acostumados a lidar é com um documento individual e não conseguimos enxergar a totalidade de suas conexões, mas elas estão lá. (AQUINO, 2007, p. 21) 86 O Projeto Xanadu está sitiado em http://www.xanadu.com/ e o vídeo de demonstração está disponível em http://www.youtube.com/watch?v=En_2T7KH6RA. Acesso em 28 ago 2013. 87 NELSON, Teodor H. Proposal for a universal eletronicpublishing system andarchive. 1981. Disponível em: http://www.manovich.net/vis242_winter_2006/New Media Reader all/30-nelson-03.pdf. Acesso: 10 maio 2006. http://xanadu.com/XanaduSpace/btf.htmhttp://www.xanadu.com/http://www.youtube.com/watch?v=En_2T7KH6RAhttp://www.manovich.net/vis242_winter_2006/New%20Media%20Reader%20all/30-nelson-03.pdf112 Na concepção do projeto Xanadu, seria possível ver as alterações no momento em que estivessem sendo processadas por outros usuários e revisitar as versões anteriores a essas transformações. Tal característica foi chamada pelo autor de armazenamento prismático, tendo em vista que cada parte do documento poderia ser prismaticamente retratada quando se passasse de uma versão para outra. Desse modo, seria impossível apontar uma versão como sendo a principal, já que existiria um acúmulo de pedaços e alterações, fazendo com que cada hipertexto, dependendo do interesse do leitor, pudesse ser considerado a parte central do documento. Existem diversas iniciativas que propõem a criação de um programa que organize as informações de um modo diferente, mais visual, e que permitam essas conexões entre os textos. Aqui abordaremos o Storyspace, como um exemplo bem-sucedido desse tipo de programa. O Storyspace foi criado em 1987 como uma ferramenta para auxiliar a escrita hipertextual e, desde então, distribuído comercialmente. Ele é importante, pois através dele foram criadas muitas obras literárias que utilizaram hipertextos (em prosa e poesia), como Afternoon, a story (de Michael Joyce, 1992) e Patchwork Girl (de Shelley Jackson, 1995). É possível compreender melhor as obras e o programa através da tese de Raquel Longhi (2004), que abordou ambos com profundidade. Longhi (2004) afirmou que a literatura eletrônica se divide em duas linhas, uma relacionada à forma impressa do hipertexto – que diz que este somente seria mais bem realizado no meio eletrônico – e outra que busca novos conceitos para dar conta do quepode vir a ser a literatura através dos meios digitais. Dentro da primeira linha estariam autores como Landow, Bolter e Joyce e, na segunda, Aerseth, Hayles e Glazier. O programa Storyspace é “composto por espaços de escrita que podem ser conectados por links. […] Estas visões podem ser em forma de árvore, sublinhados ou mapas. […] a ferramenta está mais centrada no processo de escrita do que na apresentação visual, embora os mapas de visualização sejam ao mesmo tempo, uma forma de visualizar a narrativa e uma forma visual de organização do hipertexto” (LONGHI, 2004, p.25). Além da visualização do caminho da narrativa, o programa permite links multidirecionais, possibilitando ao autor programar, por exemplo, que a cada “x” visualizações de um link, este direcione o leitor para B ao invés de A, e que, de 113 acordo com as escolhas desse mesmo leitor, a história possa mudar de trajeto, como explica Machado (199688, p. 180 apud LONGHI, 2004, p. 41): “As poéticas digitais, portanto, têm na sua gênese a característica da combinatória entre seus elementos” transformando a ação da troca em uma característica significativa. O texto não é apenas a criação de um sujeito, mas o resultado da atualização de um campo por possíveis leitores ou usuários. Tendo em vista que a obra somente se realiza no ato da leitura, a cada opção escolhida pelo leitor, ele seria conduzido para uma continuação diferente que, no caso dos contextos digitais, estaria inscrita no potencial dado pelo algoritmo. Uma das desvantagens normalmente atribuídas aos meios digitais é a questão da preservação. Neste ponto o Storyspace se diferencia de outros programas e produtos, pois possui obras que “com mais de quinze anos, se mantêm objeto de fruição e de estudos, especialmente por sua qualidade e pioneirismo” (LONGHI, 2004, p.16). Após a obra concluída e adquirida pelo leitor, este “pode não só ler, como também fazer anotações, utilizando a obra como uma espécie de ‘modelo’, um original que pode ser alterado” (LONGHI, 2004, p.21-2). Alguns escritores utilizaram o Storyspace como ferramenta auxiliar de criação, para não se perderem entre os links e telas da história que estavam criando. Talvez seja por isso que Longhi (2004), no final de sua tese, sugeriu que o programa fosse usado também para criação de roteiros de filmes interativos e games. Em sua conclusão, a autora atribuiu uma das causas do sucesso do programa ao suporte de uma casa editorial, no caso, a Eastgate Systems, que é responsável pela divulgação, comercialização e disponibilização desses produtos, ainda hoje, para leitores e pesquisadores. 5.2. A PRÁTICA HIPERTEXTUAL: MÚLTIPLOS CAMINHOS PARA UM LEITOR A prática hipertextual altera o modo de escrita e leitura e, citando Chartier (2002), pode-se dizer que o hipertexto eletrônico é responsável por uma revolução no suporte da escrita e nas práticas de leitura em diferentes aspectos. A simples apresentação no formato eletrônico pode eliminar a contextualização do conteúdo 88 MACHADO, Arlindo. Máquina e imaginário. 2.ed. São Paulo: Edusp. 1996. 114 para a leitura, porque, uma vez aberta a possibilidade do usuário navegar em diferentes textos conectados pelas associações de conceitos, pode também direcioná-lo a diversos pontos do documento, fazendo-o perder a noção de unidade do mesmo. Ao pensar em um livro, com suas notas de rodapés e referências bibliográficas (hipertexto com estrutura axial), pode-se afirmar que o livro é o texto principal e que após a leitura das notas, retoma-se sua leitura linear. No entanto, o mesmo não ocorre com o hipertexto no meio digital, posto que, se sua estrutura for organizada em rede, o leitor será conduzido de um documento para outro, ficando muitas vezes sem saber qual deles seria o principal. Essa falta de hierarquia clara entre os textos foi trazida por Derrida, ao propor seu livro Glas89, no qual a intertextualidade e não linearidade eram exibidas em folhas de papel (Figura 12). Ao entrar em contato com a obra de Derrida, Bolter (2001, p. 110) observou que esse modelo proposto em um impresso, caracterizaria um ‘antilivro’, contudo, ao ser transposto para o meio digital ele não causaria tanto estranhamento “porque ele não iria contra nossas expectativas do meio digital”90. O leitor ao entrar em uma apresentação organizada em rede não consegue detectar o início e término da leitura, já que as bordas do texto não são identificáveis, em função dos múltiplos pontos de contato com outros escritos (LANDOW, 2006). Com essa configuração não existe mais um elo entre o texto e o objeto que o contém, portanto a materialidade é redefinida em cada suporte em que o texto é acessado e a cada conexão efetuada pelo leitor. O que possibilita uma leitura não-linear e de criação coletiva, proporcionadas pelo hipertexto eletrônico (CHARTIER, 2002). 89 Derrida, J. (1974). Glas. Paris: Éditions Galilée. Derrida, J. (1976a). Glas (J.P. Leavey, Jr., & R.Rand, Trans.). Lincoln, NE: University of Nebrasca Press. 90 Citação original: An antibook like Glas would no longer be an antibook in an electronic edition, because it would appear to work with, rather than against, the grain of our expectations of the medium. 115 Figura 12 - Amostra da obra Glas de Derrida Fonte: Desconhecida. 5.2.1. Subvertendo a ordem da leitura: a possibilidade de um leitor coautor A leitura não-linear e a criação coletiva do conhecimento são potencialidades do meio digital. Aquino (2007) analisou sistemas que ofereciam aos usuários a possibilidade de compartilhar entre si seus dados e as páginas que visitavam na web. Esse recurso de trocar trilhas associativas, permitindo o acesso ao conhecimento alheio, já era uma das características idealizadas para o Memex, em 1945. Hoje em dia, alguns softwares de leitura de livros digitais também possibilitam trocas associativas, já que ao ler um e-book é possível ver os trechos marcados por outros leitores quando realizaram a mesma leitura. As possibilidades do meio digital não se atêm apenas a ver esses trechos marcados por outrem, mas também ler em conjunto, comentar e discutir o texto do autor com um grupo fechado ou publicamente. Bob Stein (2013), trouxe essa abordagem para o livro eletrônico ao propor o SocialBook91(Figura 13), que é um 91 Disponível em: . Acesso em 7 maio 2013. http://www.futureofthebook.org/blog/archives/2013/08/socialbook_in_action.html116 site que possibilita a leitura coletiva de um livro (ou vídeo). É possível, para cada leitor, adicionar notas e comentários, assim como ver e comentar as adições feitas pelos outros usuários. Para este autor, o livro digital não precisaria funcionar isoladamente, como seu análogo impresso, posto que poderia ser mais bem explorada a interação entre as pessoas, a qual é propiciada pela internet. Figura 13 – SocialBook Na primeira parte é exibido o grupo de pessoas que está realizando a leitura juntamente com o leitor; na segunda parte está o texto com os destaques feitos pelos diversos leitores; e na terceira parte, são exibidos os comentários feitos sobre o trecho destacado em amarelo. Fonte: STEIN, 2013. Nesse projeto, o livro é percebido como um ponto de encontro, onde os usuários podem discutir e desenvolver um assunto exposto. Dessa forma, o conhecimento se torna mais rico a partir de perspectivas distintas, oriundas de seus atores e contextos, contrapondo-se à postura positivista de ‘um autor’ e ‘uma verdade’. O exercício proposto por Stein (2013) pode ser associado ao que é executado em muitas salas de aula, onde o professor promove um debate acerca de um texto específico. O projeto está emfuncionamento na internet92, é gratuito e para ser utilizado é necessário que seja efetuado um log in. Dentro do sistema são oferecidos livros que já foram adicionados por outros leitores e cada participante pode adicionar o seu. A leitura pode ser feita isoladamente, com um grupo 92Disponível em: . Acesso em 7 maio 2013. 117 específico ou aberto a todos os participantes que estejam interessados. O diferencial dessa proposta é que, ao se selecionar um livro, é possível lê-lo junto com outras pessoas, promovendo a discussão e o enriquecimento do conteúdo. O SocialBook pode ser utilizado tanto com livros como com filmes. Stein (2013) afirmou ter colhido resultados muito positivos dessa experiência de ‘leitura e discussão’, em testes realizados com seus alunos. Mesmo promovendo uma construção de conteúdo emergente, abrangendo vários pontos de vista, o exercício ainda parte de um objeto central – um livro ou um filme – o qual poderia ser caracterizado como uma estrutura axial (Landow, 2006), semelhante à estrutura de um livro e suas notas de rodapé; contudo, através dos comentários podem ser inseridos textos, imagens e links (Figura 14) para qualquer site disponível na internet, o que poderia levar a leitura centrada no livro para outros caminhos. A maior inovação do SocialBook se encontra na maneira de interagir com o livro, com o ambiente digital e com os outros leitores. Figura 14 - Criando um link no comentário no SocialBook Leitura no Social Book, mostrando em segundo plano os comentários com imagens e a janela para inserir um link no comentário. Fonte: a autora. No caso do SocialBook, por um lado existe uma construção coletiva emergente de conhecimento e o registro dessa construção, que permite o armazenamento no sistema daquilo que foi discutido, o que possibilita ser revisitado posteriormente, o que não ocorre em uma discussão presencial. Por outro lado, os 118 comentários e caminhos permanecerão restritos a esse grupo, não atingindo a novos leitores e tampouco alterando o conteúdo do livro. O que pode ocorrer é que um desses leitores que participaram da discussão, crie seu próprio livro e exponha suas ideias baseando-se nos comentários lá realizados, reiniciando, assim, um novo processo. Vale salientar que, mesmo que os leitores estejam dialogando entre si, toda a interação se dá através das possibilidades que o sistema permite. Lemos (2002) defende que ao realizar uma leitura hipertextual, o leitor, que escolhe por qual caminho seguir independente da ordem prevista pelo autor, estaria ‘escrevendo lendo’, assumindo um papel de coautoria com o autor do texto. Ao realizar o “processo de ‘leitura-navegação’ não-linear e associativo” (LEMOS, 2002, p. 132), este se apropria daquele material de forma personalizada, fazendo ligações que lhe pareçam interessantes naquele momento. Deste modo o livro existiria apenas em caráter potencial, cujo “sujeito enunciador apenas fornece o programa e o sujeito atualizador realiza parte de suas possibilidades” (MACHADO, 1997, p. 183). Chartier (1997) enxergou essa coautoria através das ações às quais o leitor poderia submeter o texto, ao criar um índice, anotá-lo, copiá-lo, dividi-lo, recompô-lo, deslocá-lo, etc. [e, ainda, ao poder tornar-se um ator] de uma escrita com várias vozes ou, pelo menos, se encontra em posição de criar um texto novo a partir de fragmentos livremente recortados e reunidos (CHARTIER, 1997 p. 147), da mesma forma que o leitor do manuscrito reunia em um livro obras com naturezas bem diferentes. Todavia, mesmo ao decidir o rumo de sua leitura e agrupar distintos textos, este leitor ainda não será um autor, pois todas as configurações alteradas e suas tomadas de decisão ao respeitar, ou não, a ordem sugerida pelo texto, só afetarão a si próprio e não aos outros leitores (LANDOW, 2006). Portanto, a ideia de “escrever lendo” de Lemos (2002) encerra-se dentro das ações que constituem a leitura, onde o leitor possui a opção de seguir ou não a ordem sugerida pelo autor (Chartier, 1997). Ainda se pode acrescentar que A ampla gama de narrativas possíveis a partir da interação com complexos jogos de computador ou bem elaboradas obras de hiperliteratura não deixa e nem poderá deixar de estar limitada pelas escolhas a partir das quais foi configurado o próprio sistema que as enuncia. […] A única possibilidade, sempre limitada e finita, é de recombinar elementos, criando um texto midiático que, apesar de previsível, não foi necessariamente previsto (FRAGOSO, 2001, p. 9). 119 Para Bolter (2001), um dos elementos que mais caracteriza/representa essa ordem é o sumário. Nele são exibidas as partes mais importantes do livro, bem como as suas subordinadas e “mostra ao leitor a ordem em que ela ou ele irá encontrar aquelas ideias, caso comece a leitura na primeira página e vá até a última93” (BOLTER, 2001, p. 98). Já nos artefatos da cultura digital94 a estrutura é menos rígida, posto que mesmo que exista uma hierarquia, esta é provisória e não conduz nem obriga o usuário a segui-la linearmente. Em um livro impresso, o autor também poderia utilizar o sumário para seguir ordens alternativas, “mas sua ordem canônica é definida pela paginação, sugerindo que as outras possibilidades seriam subordinadas a esta. O hipertexto precisa estar livre de qualquer ordem fixa”95 (BOLTER, 2001, p. 35). No entanto, não se pode negar que “ler é seguir um caminho sugerido pelo layout do texto”96 (BOLTER, 2001, p. 100). Apesar da leitura diária não envolver apenas o livro, perpassando por diversos tipos de materiais, como jornais, e-mails, revistas, outdoors, atualizações de status do Facebook etc., tem-se a ideia de que o livro deve ser lido do início ao fim. Bolter (2001) sugeriu que a leitura linear existe e talvez se processe dessa forma em função de como se aprende a ler e a usar os livros na escola, onde o aluno deve ler em uma ordem fixa e linear. Justamente por essa ordem estar estabelecida que é possível surpreender criativamente o leitor com sugestões alternativas de leitura. Apesar de parecer que “A escrita eletrônica está adicionando uma estrutura em rede, em uma estrutura visível e operacional”97(BOLTER, 2001, p. 106), essa rede de referências sempre existiu. Bolter (2001) citou o exemplo de Homero, onde já era perceptível uma segunda leitura “nas entrelinhas” do texto, ou seja, as associações sempre estiveram na mente dos leitores e escritores. Contudo agora, com a web, é mais fácil seguir as notas de rodapé e referências através dos links e sistemas de busca. “Cada novo meio promove uma nova estratégia – neste caso a estratégia envolve interatividade e unificação de textos e gráficos – trazendo uma 93 Citação original: also shows the reader the order in which he or she will encounter these ideas in reading from first page to last. 94 Nesse momento o autor refere-se às enciclopédias digitais e aos sites de busca, citando como exemplo o Yahoo. 95 Citação original: Although the canonical order of a printed book is defined by the pagination, and all other suggested orders remain subordinate, a hypertext need not have any canonical order. 96 Citação original: To read is to follow one path from among those suggested by the layout of the text. 97 Citação original: If linear and hierarchical structures dominate current writing, our cultural construction of electronic writing is now adding a third: the network as a visible and operative structure. 120 experiência mais autêntica para o leitor”98 (BOLTER, 2001, p. 45). No meio digital, ele pode navegar intuitivamente através de espaços conceituais e visuais que são diferentes dos espaços do livro. O autor comentou ainda, que neste momento cultural a mídia impressaparece ser mais ‘simples’ e ‘natural’ do que o hipertexto eletrônico, assim como o hiperlink parece estar naturalmente associado à internet, contudo “o hipertexto eletrônico não é o fim da mídia impressa, é, na verdade, a remediação do impresso”99 (BOLTER, 2001, p. 46). 5.2.2. NOVAS POSSIBILIDADES DE APRESENTAR O TEXTO Com a inserção do livro digital, Landow (2007) afirmou ser a primeira vez, dentro de muito tempo, que foi possível assistir uma grande inovação tecnológica na história do livro e, com isso, tornou-se possível desassociar a ideia desse artefato do formato do códex. Bastos (2005, p. 129) observou que as metáforas, representações e relações de similaridade impedem “a investigação de novas possibilidades oferecidas pela digitalização, na medida em que ainda se prende a paradigmas analógicos” (BASTOS, 2005, p. 129). Frente às novas tecnologias, a tensão entre a convenção e a inovação está presente no livro digital, observando que se abre um leque de possibilidades a serem exploradas que não seria possível no papel. No entanto, ao se buscarem esses recursos, corre-se o risco de sair do padrão estabelecido e ir em direção a um novo artefato, o qual já não mais se reconhece como sendo um livro e sim como outra forma de contar uma história ou de apreender um conteúdo. Bastos (2005) propôs justamente a criação de uma nova escrita nas mídias digitais, a qual se dividiria nos termos e-scrita e ex-crita. A primeira seria a escrita eletrônica, “o termo e-scrita atribui uma qualidade ao substantivo escrita; não muda sua essência, apenas indica que a escrita em computador tem atributos que não tinha até então” (BASTOS, 2005, p. 95). Já o termo ex-crita, seria marcado pela tensão entre a possibilidade de escrever de outra forma nas mídias digitais e o apego aos formatos culturalmente aceitos; assim, o 98 Citação original: Each new medium claims to provide a new strategy—in this case the strategy involves interactivity and the unification of text and graphics—for achieving an authentic experience for its reader […] moving through a visual and conceptual space different from the space of the book, although this experience still depends on our intuitive understanding of that earlier writing space. 99 Citação original: In short, electronic hypertext is not the end of print; it is instead the remediation of print. 121 termo ex-crita indicaria a escrita que não é mais, mas que seria marcada pelo que foi. Baseado na reflexão de Bastos (2005) pode-se pensar na possibilidade de serem exploradas diferentes concretizações do livro no meio digital, tanto respeitando as heranças traçadas previamente pelo impresso, quanto criando algo totalmente novo. Meyers (2011) se propôs a pensar nas possibilidades que o meio digital tem para inovar o livro e um dos elementos ao qual dedicou sua atenção foi o sumário, como um dos representantes da ordem de leitura sugerida pelo livro impresso (BOLTER, 2001; HENDEL, 2006). Ao se pensar na organização de temas, o sistema digital pode acomodar tanto um formato tradicional de índice – que foi o que obteve maior sucesso na organização e indexação no meio impresso – bem como explorar outras formas para apresentação de conteúdo (MEYERS, 2011; WEINBERGER, 2007). Desse modo é evidenciado o caráter híbrido (impresso e digital) que o livro pode adquirir. Meyers (2011) comentou sobre “páginas iniciais com um estilo de ’tela inicial’, linha do tempo baseada em sistemas de navegação e mapas imagéticos ou geográficos e objetos tridimensionais hiperlinkado sem um espaço”100 (MEYERS, 2011, e-book). Para o autor, todas essas possibilidades encorajam uma exploração diferente do conteúdo, fornecendo um artefato “zooming”, no qual é possível se aproximar de forma variada de diferentes trechos. Muitas das possibilidades, ele acredita serem potencializadas pela tecnologia touchscreen, principalmente se comparadas com as primeiras gerações do Kindle, cujos botões de navegação dificultavam algumas ações. Mostrou, ainda, diversos exemplos de livros, aplicativos e sites para ilustrar suas ideias, das quais algumas delas serão comentadas a seguir. O livro aplicativo de Al Gore, versão digital do livro Our Choice (A escolha é nossa), lançado em 2011(editora Push Pop Press), é um dos livros digitais que foi muito utilizado durante a divulgação do iPad. Nele se percebe “a união de textos e diversos recursos interativos, com uso de imagens estáticas, imagens em movimento, áudio e inclusive interação por voz/entrada de áudio” (CASTEDO, 2012, INTERCOM). Mesmo explorando esses recursos, ele preservou um layout tradicional de livro, mantendo as estruturas de capítulos e textos. A navegação pode ser feita 100 Citação original: home page-style “start screens”, timeline-based navigational systems, geographic and image maps, and even three-dimensional hyperlinked object spaces 122 através das entradas de capítulos ou avançando de uma página para outra. Na parte de baixo da tela existe uma barra com miniaturas das páginas, miniaturas essas grandes o suficiente para mostrarem sua relação com o design editorial. O ponto positivo apontado por Meyers (2011) desse modo de apresentação é que a navegação pode ser feita rapidamente, assim como nos livros impressos. Esse tipo de navegação “filmstrip” (rolo de filme), que agora está muito comum em revistas digitais (e também em alguns livros digitais, principalmente os disponibilizados na bookstore da Apple), ao se clicar na parte de baixo da tela, as miniaturas das páginas ficam visíveis e para acessá-las, basta escolher uma e tocá-la (Figura 15). “Através desse método, você deixa visível para o leitor os códigos que ele já está acostumado no meio impresso, como cabeçalhos, citações, imagens etc.”101 (MEYERS, 2011, e-book). Esse modo de navegação emergiu do meio digital e parece estar se tornando padrão: a navegação horizontal para acessar os diferentes títulos, e a vertical para leitura aprofundada de cada um deles. Figura 15 - The making of Life of pi Captura de tela do sumário no estilo rolo de filme, da amostra do livro. Fonte: a autora. O modo de apresentação start screen (tela inicial) é mais semelhante ao que usualmente é utilizado em aplicativos e sites, onde são disponibilizadas diferentes entradas para o conteúdo (Figura 16). Estas provêm do agrupamento de assuntos 101 Citação original: You make visble to the reader none of the come-hither signals that make page brownsing so useful in print: headlines, pull quotes, pictures, sidebars, and so on. 123 em ações ou temas, os quais podem ser exibidos de diferentes maneiras (imagens, textos, vídeo). Este tipo de acesso poderia contemplar uma forma de exibir o sumário, com diferentes conexões hipertextuais onde, diferente do meio impresso, não iria sugerir uma ordem preferencial/superior determinada pela numeração da página. Ao optar pela primeira vez por determinado caminho, o usuário não tem como saber, naquele momento, o que está deixando de lado, ou seja, aquilo que constaria se tivesse feito outra escolha. Em um livro impresso, o leitor que descarta a leitura de um capítulo tem noção da dimensão do mesmo e, ao pulá-lo, poderá antes folheá-lo rapidamente e, dessa maneira, ter uma ideia geral daquilo que está deixando de se aprofundar. Portanto, diferente do impresso, no meio digital mesmo uma narrativa hipertextual pode causar a sensação de linearidade. Figura 16 - A Árvore dos sonhos Tela inicial do livro aplicativo. Fonte: a autora. Os livros que se adaptaram muito bem ao índice organizado nos moldes de uma tela inicial são os de culinária e guias de viagem, por serem naturalmente não-lineares. Nestes casos, o sumário tradicional consiste apenas em uma formaartificial de orientar o leitor onde poderia encontrar um artigo específico; por isso Meyers (2011) sugeriu que nesse tipo de livro não haveria necessidade de existir um único sumário, podendo um item estar indexado em mais de uma categoria (MEYERS, 2011; WEINBERGER, 2007). Um exemplo disso seria o caso de uma receita de 124 brócolis, a qual poderia estar na sessão ‘comidas vegetarianas’ e também em ‘pratos preferidos da Maria’. Cabe ressaltar que tanto o editor, o autor ou o leitor poderiam ter a possibilidade de fazer essa organização. Meyers (2011) exemplificou isto que foi dito, através do livro How to cook everything (Como cozinhar tudo), de Mark Bittman’s (Figura 17). A versão impressa desse livro tinha mais de 1000 páginas e muitas pessoas negligenciavam grande parte do seu conteúdo por ser difícil de encontrar o que desejavam, principalmente naqueles momentos que realmente necessitariam usá-lo – quando estavam cozinhando. Mesmo assim, ele confessa que era um livro muito procurado, facilmente encontrado na cozinha de qualquer norte-americano. Sua versão digital transformou-se em um aplicativo para iPad e para iPhone, com um sistema de entrada mais funcional, no qual o usuário poderá navegar pelas categorias ou realizar uma busca exatamente daquilo que queira cozinhar. Figura 17 –How to cook everything Tela inicial do aplicativo. Fonte Peter Meyers (2011). Nesta dissertação, realizou-se uma busca por livros diversos, na loja virtual da Apple e, curiosamente, foi encontrada uma categoria chamada ‘Livros’ e outra de ‘Bebidas e comidas’, o que pode levar a um questionamento se, no meio digital, esse conteúdo seria mais bem exibido através de um formato de livro ou se em outro 125 tipo de artefato (no caso do exemplo colocado por Meyers, o ideal foi um aplicativo). Outro modo de entrada em um conteúdo não-linear, seria a randômica, totalmente aleatória ou com algumas pré-configurações de interesses do leitor, como a ferramenta “Inspire me” (Inspire-me) do aplicativo TED Conferences (MEYERS, 2011). Outra sugestão dada por Meyers (2011) consistiu na colocação de um acesso personalizado no plano de leitura. Para exemplificar isto, apresentou um aplicativo de golfe, que trazia um questionário a ser respondido pelo usuário no intuito de verificar o nível em que este se encontrava, para, logo a seguir, conforme os resultados obtidos, indicar os vídeos tutoriais que o questionado deveria assistir para aprimorar o seu nível. Outro exemplo surgiu durante a pesquisa efetivada para esta dissertação, onde foi identificado um aplicativo que dispõe de um questionário sobre o nível de conhecimento de inglês, a fim de indicar livros para leitura que estariam dentro do âmbito de conhecimento do leitor, prevendo que este teria condições de interpretar o conteúdo exposto naquela obra, no referido idioma estrangeiro. Vale mencionar ainda o projeto experimental Um livro diferente para cada leitor, uma ajuda diferente para cada leitura, realizado pelo aluno Felipe Barroco, do Curso de Graduação em Design Visual da UFRGS no segundo semestre de 2013 (Figura 18). O livro de autoajuda digital seria um aplicativo e, para utilizá-lo, o leitor deveria responder a um questionário que faria indagações sobre diversos aspectos de sua vida e, a partir das respostas dadas, seriam detectadas as áreas que precisariam ser trabalhadas, sendo então gerado um livro com os capítulos necessários para ajudá-lo a resolver os seus problemas pessoais. 126 Figura 18 - Projeto experimental do aplicativo Um livro diferente para cada leitor, uma ajuda diferente para cada leitura Imagens do aplicativo, na primeira tela o leitor optaria por criar um novo livro. Na segunda, é exibido o questionário. Na terceira, o livro está sendo criado. E na última, é simulada uma página do texto do livro criado para o leitor. Fonte: Felipe Barroco. A entrada de conteúdos através das imagens foi chamada por Meyers (2011) de Mapa de objetos (Objetcs Map). Como exemplo de utilização desse recurso, ele apresentou a tela de entrada do aplicativo Os elementos, da TouchPress, que traz a tabela periódica ilustrada, onde cada elemento da mesma é uma entrada ao conteúdo (Figura 19). Mostrou também a imagem tridimensional, 127 visualizada no site The president’s desk102 (O escritório do presidente), que consiste em um arquivo em flash103, baseado na coleção de fotos, vídeos, diários, gravações de telefonemas etc. Cada elemento da imagem pode ser clicado, ocasionando a entrada de um conteúdo diferente, sendo que no layout é encorajada uma navegação mais exploratória, de descoberta. Figura 19- Aplicativo Os elementos Fonte: Touch Press As timelines (linhas de tempo), segundo Meyers (2011) podem ser exploradas de três formas: • Visão de Pássaro (Birdseye views): navegação do livro do início para o fim (Figura 22). • Exploração não-linear (Non-linear exploration): é feita através de linhas de tempo que permitem ao leitor escolher qualquer ponto da linha para começar a ler; é indicada para conteúdos que não precisem ser consumidos ordenados do início para o fim (Figura 20). 102 Disponível emhttp://microsites.jfklibrary.org/presidentsdesk/ 103 Tipo de arquivo que permite a construção de conteúdos animados e interativos. 128 Figura 20 - Exemplo de exploração não-linear de linha do tempo Fonte: Meyers (2011). • Narrativa clarificada (Narrative clarity): constitui-se de uma linha de tempo inserida no início de cada capítulo, a qual ajuda a situar o episódio ali tratado dentro da história como um todo. É indicada para leituras com muitos flashbacks que poderiam deixar os leitores confusos. Por ter a possibilidade de ser um elemento estático, esse recurso funcionaria tanto no livro digital quanto no impresso (Figura 21). 129 Figura 21 - Exemplo de narrativa clarificada com linha do tempo Fonte: Meyers (2011). Outro modo de navegação é oferecido através de camadas que vão se aproximando. Para compreender melhor, pode-se imaginar essa forma de navegação aplicada à bíblia. Na primeira tela teria uma divisão entre o antigo e o novo testamento (Figura 22), tornando possível identificar os diferentes livros existentes dentro de cada um deles e, inclusive, observar a indicação do tamanho de seus conteúdos. Selecionar-se-ia um livro, por exemplo, o Gênesis, e ao acessá-lo seria possível ver todos os títulos que o compõe, selecionar um e iniciar a leitura. Esse modo de navegação do índice é muito semelhante ao que se vê hoje nas apresentações feitas no site Prezi104 (Figura 23). O formato 3D também caberia para esta finalidade, pois, tendo uma imagem semelhante ao projeto Xanadu, o agrupamento das seções ficaria espalhado pelo espaço digital, podendo ser arrastado de um lado para outro. 104 http://prezi.com/explore/popular/ 130 Figura 22–Sumário da Bíblia (aplicativo) Detalhe do sumário sobre o Antigo Testamento (exemplo de visão de linha do tempo do tipo ‘visão de pássaro’), na segunda imagem aparece as partes de texto que compõe o Gênesis, após o zoom sobre o sumário. Fonte: Meyers (2011). Figura 23 - Prezi Exemplo de apresentação na qual cada círculo será aproximado e exibido seu conteúdo. Fonte: Prezi 131 Meyers (2011) também apresentou a ideia de Robert Darton105, que consiste na organização dos livros em camadas, como em uma pirâmide, onde no topo ficariam as informações mais superficiais e na base o conteúdo mais aprofundado. O livro poderia ter diversas camadas e satisfaria diferentes tipos de leitores, tanto os que quisessem uma informação mais resumida, quanto aqueles que buscassem saber mais sobre o assunto. Dois exemplos que ilustram essa possibilidade são o projeto experimental ê-Corde da aluna LauraHaffner Silva do Curso de Graduação em Design Visual da UFRGS, no segundo semestre de 2013, e o aplicativo de livro Ted Books. No caso de Laura, o aplicativo consistiria em uma biblioteca de cordéis digitais que induzia o leitor a lê-los em voz alta, resgatando o costume da oralidade presente na história do Cordel106. Ressalva-se, ainda, que além daqueles que estariam divulgados para aquisição, o leitor também poderia criar seus próprios cordéis e projetar sua capa. Salienta-se que todas as escolhas de design do projeto desse aplicativo foram tomadas a partir do embasamento teórico sobre Literatura de Cordel e, caso o leitor desejasse saber mais sobre essa cultura popular, poderia em tese acessar o trecho do texto que explicaria o elemento específico e, inclusive, ler o artigo/dissertação na íntegra (Figura 24). Neste projeto é possível perceber três camadas de informação: o próprio projeto gráfico do aplicativo, o trecho destacado que explica o porquê daquela escolha e o texto na íntegra. 105 DARTON, Robet. A case for books. Public Affairs, 2009. 106 Cordel é uma forma de poesia, rimada e metrificada. Impressa e distribuída em folhetos, é de forte expressão no nordeste brasileiro. 132 Figura 24- Projeto experimental do aplicativo ê-Cordel Aqui estão apresentadas, respectivamente, a capa do aplicativo, a simulação do leitor clicando no ícone para saber mais sobre o conceito, e, na terceira tela, é exibido o artigo com o trecho destacado. Fonte: Laura Silva. No caso do TED Books há uma segunda camada de informações extras que só são passíveis de acesso através do aplicativo do TED no iPad. Se os livros forem adquiridos em outras lojas e lidos em outros aparelhos/softwares de leitura, esses recursos não poderão ser ativados. Ao ler o material no aplicativo do TED Books, o leitor ainda pode escolher se deseja fazer uma leitura com ou sem esses recursos, os quais, em caso positivo, podem ser acionados através do ícone ‘Extras’, localizado no canto superior esquerdo da tela (Figura 25). 133 Figura 25 - Livro lido no aplicativo TED Books Livro lido no aplicativo TED Books, na primeira tela os Extras estão desativados, na segunda estão ativados e na terceira uma foto do conteúdo extra (imagem) está sendo visualizada. Fonte: a autora. A maioria dos exemplos trazidos nesta seção utilizam soluções híbridas, ora se aproximando do impresso e ora explorando outros recursos próprios do meio digital. A seguir serão mostrados dois grupos que assumidamente se distanciam do impresso, buscando, em suas obras, explorar possibilidades que não conseguiriam ser realizadas no papel. 5.2.3. Experiências realizadas no meio digital Spalding (2012) atentou para as diferenças ocorridas entre os livros digitais semelhantes aos impressos e aqueles que exploram as possibilidades da tecnologia digital. O autor utilizou o termo livro digitalizado para se referir aos “textos criados para uma versão impressa, com as características e limitações da versão impressa, convertidos para uma mídia digital por questões logísticas ou comerciais” (SPALDING, 2012, p. 80). Nesse patamar se encaixaria a maioria dos livros digitais comercializados hoje e que são lidos em aplicativos de leitura como o iBooks, o 134 Google Books, o Kindle, etc. Para caracterizar as possibilidades narrativas do meio digital, ele optou por abandonar a palavra livro e adotar o termo Literatura Digital107, a qual seria “um tipo de texto produzido para as mídias digitais e que não pode[ria] ser publicado em livro sem prejuízo da concepção original” (SPALDING, 2012, p. 86). Em sua tese ele iniciou uma caracterização que posteriormente se transformaria no Manifesto Digi-Brasil, projeto iniciado juntamente com Ana Mello e Maurem Kayna e lançado em 2013, em Porto Alegre (RS). Esse manifesto é composto por dez itens que vão caracterizando e explicando o tipo de texto que eles objetivavam, como pode ser visto a seguir, onde é colocado o manifesto na íntegra: 1. A Literatura Digital é aquela obra literária feita especialmente para mídias digitais, impossível de ser publicada em papel; 2. A Literatura Digital busca criar uma nova experiência de leitura para o usuário; 3. A Literatura Digital requer um novo tipo de texto e de autor; 4. Por literatura entende-se a arte da palavra; portanto, um projeto de literatura digital deve conter texto. Não ser um projeto de literatura digital não é ser melhor ou pior, apenas outra coisa, como video-arte; 5. A Literatura Digital é um novo gênero literário, não substituindo os gêneros da literatura tradicional em papel ou e-book; 6. A Literatura Digital pode ser multimídia, hipertextual, colaborativa, etc, mas não é necessário que todos os recursos sejam usados simultaneamente; 7. A Literatura Digital pode ser encarada como uma ferramenta para incentivar a leitura em ambientes digitais. Não queremos que um usuário largue um livro para ler literatura digital, e sim que ele largue por 10 minutos seus joguinhos ou redes sociais e leia um projeto de literatura digital; 8. Livro digital não é livro digitalizado – confundi-los seria o mesmo que filmar uma peça de teatro e chamar isso de cinema; 9. A Literatura Digital é uma atividade lúdica, mas não é um jogo, pois num jogo o “objetivo principal é antes de mais nada e principalmente a vitória” (vide Homo Ludens, de Huizinga); 10. Substitui-se aqui o conceito de livro pelo conceito de obra, entendido como “um objeto dotado de propriedades estruturais definidas, que permitam, mas coordenando-os, o revezamento das interpretações, o deslocar-se das perspectivas” (vide Obra Aberta, de Umberto Eco). 108 (SPALDING; MELLO; KAYNA, 2013, grifo nosso). Através da interpretação do Manifesto, pode-se perceber um tom didático e explicativo. Ao se tomar conhecimento das diversas discussões da área, nota-se que algumas observações do manifesto são justamente para responder a essas demandas, dúvidas ou preconceitos. O item 8 discorre sobre uma diferença entre livro digital e o digitalizado, o que parece meio descontextualizado, visto que todo o 107 Nesta dissertação o termo literatura não está em discussão. 108 Disponível em: . Acesso em 3 mar. 2013. http://www.literaturadigital.com.br/?pg=25012135 manifesto fala de literatura digital. Os responsáveis pelo manifesto fizeram questão de diferenciá-la de jogos, respondendo dessa forma a possíveis críticas que os acusassem de ser demasiadamente lúdicos (item 9) e também deixaram claro que não quiseram competir com a literatura tradicional (item 5 e 7), fazendo menção indireta à longa midiatização que teve em torno do fim do livro. Nos itens 2 e 3, eles explicaram que é necessário um novo tipo de leitor e escritor, ou seja, não adiantaria tentar escrever um texto de literatura digital ficando preso às convenções, pois este é um espaço de experimentação, tanto no nível do produtor quanto do receptor. Tendo em vista que o manifesto é aberto para todos os tipos de público, eles acrescentaram a ressalva no item6 de que não é necessário fazer uso de todos os recursos disponíveis ao mesmo tempo. Essa observação é interessante, pois sugere que, antes de se pensar em uma maneira de levar o leitor a utilizar todas as ferramentas, deve-se atentar à experiência que seria vivenciada pelo mesmo, pinçando-se apenas as ferramentas que poderiam auxiliá-lo na literatura em questão. O item7 conduz a um entendimento de que todos os projetos de literatura digital são curtos, possíveis de serem lidos em dez minutos. Mesmo sendo uma proposta de literatura, essa observação não parece adequada ao meio digital, pois é comum deparar-se, diariamente, com narrativas que são interrompidas e retomadas em um momento posterior, programasde televisão que são cortados pelos comerciais e/ou continuam no dia seguinte e, o próprio livro, muitas vezes, é lido pausadamente. Sendo assim, não é compreensível por que o leitor de literatura digital de valer o texto de uma só vez. O manifesto Digi-Brasil foi inspirado em outros movimentos internacionais que também buscavam explorar as potencialidades do meio digital na literatura. Sua principal influência veio da organização ELO (Electronic Literature Organization109), fundada em 1999 nos Estados Unidos, a qual detinha a participação de autores e artistas de diversos países. A maior diferença entre a iniciativa estrangeira e a iniciativa gaúcha, é que o Manifesto Digi-Brasil se diferenciou claramente da vídeo-arte (item 4), enquanto a ELO não delimitou essa fronteira, 109 Disponível em: . Acesso em 3 mar. 2013. 136 Literatura eletrônica, muitas vezes se cruza com as artes conceituais e sonoras, mas a leitura e a escrita continuam sendo centrais nas artes literárias. Essas atividades se movem livremente pelas galerias, espaços de desempenho e museus, já que não estão mais ligadas por páginas em um livro impresso. Literatura eletrônica não reside em apenas um único meio ou instituição110 (ELO, s/n, tradução nossa, grifo nosso). Ambos os sites apresentam experimentações onde o texto é o principal elemento da obra e convidam o leitor a se engajar nesse tipo de leitura e escrita. Uma característica percebida, ao se analisar alguns trabalhos escolhidos ao acaso, é que nas duas iniciativas estes são pequenos, como se fossem contos, microcontos ou poesias. A partir dessa observação, cabe-se questionar se cada pequeno trabalho seria caracterizado como um livro digital, como é entendido por Spalding (2012), ou se o site inteiro seria um livro contendo esses diferentes tipos de textos. No site ELO foram apresentadas duas coleções: Electronic Literature Collection, volumes 1 e 2 (Figura 26), respectivamente lançados no ano de 2006 e de2011. Cada volume apresentou diversos tipos de conteúdos com distintos autores agrupados sob uma identidade, sendo inicialmente produzido em CD-ROM e hoje disponibilizado no site. Percebe-se que todas as características obrigatórias abordadas nos parâmetros para definição de livro estão presentes nos volumes da ELO, o que sugere que esses dois volumes poderiam ser considerados livros digitais, mesmo apresentando uma configuração muito díspar daquilo que se espera de um livro tradicional. O mesmo não ocorre no site brasileiro, que disponibiliza e indica obras como se fossem exemplos de explorações das potencialidades digitais (Figura 27). Ao consultar o site em março de 2013 e em janeiro de 2014, observou-se que foram inseridos novos exemplos, sem fazer menção a essa atualização. Portanto, conclui-se que o site funcionaria como uma vitrine para novas explorações de literatura, restando averiguar se cada um dos exemplos indicados ali poderia ser percebido como livro digital. 110 Citação original: “Electronic literature often intersects with conceptual and sound arts, but reading and writing remain central to the literary arts. These activities, unbound by pages and the printed book, now move freely through galleries, performance spaces, and museums. Electronic literature does not reside in any single medium or institution” (Grifo nosso). 137 Figura 26 - Electronic Literature Collection, volume 2 Fonte: ELO (2013) Figura 27- Projetos de literatura digital para web Fonte: SPALDING; MELLO; KAYNA (2013). Em função da pluralidade de recursos utilizados – tanto nas obras da ELO, quanto nas indicadas no Literatura Digital – talvez os casos referidos fossem melhor 138 ‘rotulados’ como DIASS (Digital Assemblage – Reunião Digital), nomenclatura sugerida por Laterza (2001, online), e mencionada por Furtado (2006, p. 40): As diferenças existentes entre a elaboração de um livro destinado a ser impresso e a “reunião digital” (assemblaggio digitale) de conteúdos multimídia, […] torna errônea a utilização demasiado direta do modelo “livro” no mundo das novas mídias digitais. Diante dessa nova realidade de concepção, realização e fruição trazida pelo meio digital, a descaracterização do livro pode ficar tão evidente que poderia ser melhor desvincular esse conteúdo dessa nomenclatura. 6. O LIVRO DIGITAL: MATERIALIDADES SOBREPOSTAS O leitor recebe um livro impresso com uma forma fixa, onde o seu exemplar é praticamente igual a todos os outros daquela edição e, antes de chegar às suas mãos, ele passou por uma série de processos e tomadas de decisão para se configurar da forma que se apresenta. A configuração do livro digital que chegará ao leitor depende de fatores decididos por ele mesmo, sendo necessário pensar em qual aparelho e software o livro será acessado. No livro digital não existe um formato padrão que possa ser encaminhado a todas as lojas virtuais, uma vez que cada empresa exige uma finalização de arquivo diferenciada, cada aparelho possui configurações específicas e o conteúdo que pode funcionar muito bem em um, pode simplesmente não abrir em outro. Nada disso, entretanto, elimina o processo editorial de tomadas de decisão, que existe no livro digital da mesma forma que no impresso. Portanto, assim como cada elemento do impresso é analisado e ponderado, como, por exemplo, se o livro será de capa dura ou não, qual o tipo de papel que será utilizado, em quantas cores será impresso e, que custos essas escolhas agregarão ao produto final; na produção digital também são avaliados os recursos e formatações a serem utilizados e o custo/benefício de cada opção. Por não ter uma forma final fixa, as diferentes camadas de significado somadas às ferramentas que o leitor dispõe devem ser levadas em consideração no momento do projeto desse conteúdo, uma vez que, essas escolhas podem definir quem terá ou não acesso ao mesmo. Para compreender melhor o livro digital é necessário entender como esses elementos que o compõe se relacionam e de que forma um interfere sobre o outro. Desse modo, optou-se por uma abordagem didática tentando analisar cada elemento separadamente, contudo, vale dizer que é impossível isolá-los completamente já que são sobrepostos no artefato estudado. Ao buscar essa 140 separação, Oliveira (2013) adotou a divisão proposta por Procópio (2010), na qual o livro digital seria formado pela relação entre o software reader, o hardware (que o autor chama de dispositivo de leitura) e o conteúdo (que ele chama de livro). Para Oliveira (2013) esses três elementos se influenciam mutuamente, formando uma tríade, a qual é mostrada na Figura 28: Figura 28 - Tríade que forma o e-book Figura desenvolvida por Oliveira (2013, p. 37) a partir da estrutura proposta por Ednei Procópio (2010). Fonte: Oliveira (2013). Oliveira (2013) foi perspicaz ao perceber que o livro digital não existiria na ausência de um desses três elementos, conferindo igual importância a todos. Entretanto, faz-se a ressalva de que as possibilidades de ação de cada um deles são restringidas pelo cenário em que ele está inserido. Em outras palavras, as possibilidades de recursos que podem ser exploradas no livro, dependem das restrições impostas pelo software reader, que, por sua vez, se limita a utilizar o que é possível dentro daquele equipamento de leitura. Neste trabalho, essas três partes serão chamadas de conteúdo, software e hardware e compreendidas de forma próxima ao esquema exibido na Figura 29. 141 Figura 29 - Esquema proposto para compreensão do e-book Relação entre o hardware, software e conteúdo que resultam em um livro digital. Fonte: a autora. Basicamente, existem três tipos de livros digitais: os disponibilizados online por intermédiodo navegador, os que são baixados para o computador e acessados através de um software ou aplicativo de leitura e os que são o próprio software/aplicativo instalado no sistema operacional do aparelho. Nos dois primeiros é possível separar os elementos de acordo com o esquema apresentado (hardware, software e conteúdo); no último, as camadas software e conteúdo são mescladas. A seguir serão abordados, separadamente, o Hardware, o Software e o Conteúdo. Na seção Hardwares para leitura, serão comentadas algumas características dos diferentes aparelhos que podem ser utilizados para a leitura do livro digital, com um foco especial sobre o e-reader, observando sua funcionalidade exclusiva para essa atividade. Do Softwares de livros digitais serão abordados os aplicativos específicos para leitura. Nesse grupo poderia ser incluído o navegador, que possibilita o acesso ao livro online, pois também é um software, mas suas particularidades não influenciam tanto o conteúdo, podendo compará-lo com uma janela que viabiliza a apresentação do site. Portanto, o destaque será dado aos softwares readers. No Conteúdo serão explicados os principais formatos de livros digitais, tanto os que são lidos em softwares específicos de leitura quanto os que são instalados diretamente no aparelho. A partir do entendimento de cada um desses elementos, torna-se mais fácil a compreensão da Figura 29 e, por conseguinte, a configuração do livro digital. HARDWARE SOFTWARE CONTEÚDO 142 6.1. HARDWARES PARA LEITURA Neste trabalho, a palavra hardware está sendo usada para denominar o aparelho que é utilizado para a leitura do livro. Atualmente o livro digital pode ser lido em diversos tipos de equipamentos, tais quais computadores de mesa, notebooks, netbooks, tablets, palmtops, smartphones, e-readers etc.. Em cada tipo de equipamento, a relação do leitor com a leitura será diferente. Por exemplo, em um computador de mesa o leitor será impedido de trocar de lugar durante a leitura e, para avançar no texto, terá que usar o teclado, o clique do mouse ou, ainda, o scroll. No caso dos aparelhos móveis que possuem tela sensível ao toque, essa característica pode atrapalhar alguns leitores que, sem querer, podem tocar na tela e pular várias páginas da leitura, mas, em contrapartida, pode facilitar o destaque de alguns trechos, entre outras. Como se pode perceber, cada aparelho tem características específicas que podem ser vistas como vantagens para um leitor e desvantagens para outro, portanto cabe a cada pessoa testar e perceber ao qual, ou aos quais, dentre os existentes, ela se adapta melhor em cada situação de leitura (BAR et. al, 2007). No Brasil, estima-se que o aparelho mais utilizado para ler livros digitais seja o tablet, visto que os editores associam o aumento das vendas de e-books com a aquisição de tablets pelos consumidores. É preciso notar que, no mesmo período, houve também a entrada das lojas virtuais da Apple, Amazon e do Google, o que facilitou a compra do produto pelos usuários. A entrada dos e-readers, no Brasil, demorou um pouco mais em função dos altos preços (em comparação aos comercializados em outros países) que os mesmos eram comercializados aqui, principalmente antes de 2012, quando as taxas de importação dobraram seus valores. Este é um dos fatores que explicam a baixa penetração de e-readers no Brasil, mas, aparentemente, não o principal. Apesar de seus valores igualmente elevados, a venda de outros aparelhos portáteis já tinha crescido de forma significativa entre 2011 e 2012, passando de 9% para 18% o número de brasileiros que possuíam um smartphone e os que tinham um tablet passou de 1% para 5% (IBOPE, 2013). Dentre os aparelhos que possibilitam a leitura do e-book serão destacados nesta seção da dissertação que trata sobre hardware, prioritariamente o e-reader e, 143 em alguns momentos, o tablet. A opção de dar mais destaque ao e-reader deve-se ao fato de ele ser produzido unicamente para a leitura de livros digitais; já o tablet, assim como outros equipamentos, oferece diversas funções ao usuário (jogos, acesso a e-mails, internet etc.) e entre elas a leitura de livros digitais; portanto, as funcionalidades relacionadas aos e-books precisam ser observadas levando-se em conta os softwares utilizados nesses equipamentos, propiciando melhor abordagem na próxima seção (6.2 Softwares de livros digitais). O Rocket eBook (Figura 30), como já foi comentado, foi o primeiro aparelho a ser comercializado tendo como única função a visualização de livros eletrônicos, mas esses aparelhos passaram a ficar mais conhecidos a partir do lançamento do Kindle, o e-reader da Amazon, em 2007 e do tablet da Apple, o iPad, em 2010. Figura 30 - Rocket eBook Fonte: Acesso em12 jan. 2014. Durante a divulgação dos primeiros equipamentos dedicados à leitura havia um conflito de significados na utilização da palavra “e-book”, que ora era utilizado para se referir ao aparelho que possibilita o acesso ao arquivo digital e, ora para aludir ao próprio livro digital. Essa divergência de significados apareceu inclusive em produções acadêmicas, como no caso de Ribeiro (2009) que se refere aos conteúdos digitais utilizando a palavra “e-book”, mas ao definir o termo conferiu outro significado, como se percebe em suas palavras: “E-book (electronic book) é um aparelho de leitura de textos em formato digital, que agrega as funcionalidades de um livro de papel como a portabilidade” (RIBEIRO, 2009, p. 78). Cabe esclarecer que o nome mais utilizado para esses equipamentos cuja sua única função é a http://www.thedigitaledgeblog.com/2012/01/23/refinements-to-ebook-navigation/144 leitura, o armazenamento e/ou a compra de livros digitais é e-reader (leitor eletrônico), podendo também ser encontrados os termos reading devices (dispositivo de leitura) ou ebookDevice (dispositivo de livro digital) (OLIVEIRA, 2013). O sistema operacional dos e-readers é projetado para atender às necessidades que envolvem a atividade da leitura. No caso dos outros aparelhos (tablets, smartphones, computadores etc.), por serem multifuncionais, é indispensável a instalação de um software que os tornem aptos para ler livros digitais. Muitas vezes esses softwares são inspirados nos sistemas operacionais dos e-readers. As características físicas desses aparelhos dedicados à leitura, bem como sua remediação do livro impresso, foram comentadas seção 3.3 A inserção da tecnologia digital. Neste momento será abordado, em maior profundidade, as especificidades das telas que possibilitam a visualização do e-book, entre outras peculiaridades. A principal diferença do e-reader frente aos outros aparelhos móveis é a sua tela e-Ink (tinta eletrônica), também chamada de e-paper ou papel eletrônico. Por não emitir luz, essa tecnologia proporciona maior conforto aos olhos durante a leitura e possui um efeito mais semelhante ao texto impresso no papel. Os primeiros aparelhos, lançados em 1998, ainda não utilizavam esse tipo de tecnologia, tanto o Rocket eBook, quanto o SoftBook Reader possuíam tela de Cristal Líquido. O primeiro e-reader com tela e-Ink foi o Sony LIBRIé (Figura 31), lançado em 2004. 145 Figura 31 - Esquema visual dos primeiros e-readers Fonte: Bridle, 2002. A tela e-Ink funciona através de micropartículas magnetizadas. Uma comparação grotesca do seu funcionamento pode ser feita com as lousas mágicas infantis, que utilizam instrumentos com imã para desenhar, apagar e desenhar novamente. No caso do e-Ink, o funcionamento é feito com milhões de microcápsulas tão finas, que o diâmetro de cada uma é aproximado ao de um fio de cabelo. Cada microcápsula contém carga positiva com partículas brancas e carga negativa com partículas pretas suspensas em um fluídotransparente (Figura 32). Quando um campo de força positivo ou negativo é aplicado, as partículas correspondentes se movem para o topo da cápsula, ficando visíveis para os usuários, gerando uma superfície preta ou branca naquele ponto (Figura 33). A carga de cada microcápsula também pode ser bifurcada, resultando em uma superfície metade branca/metade preta. Com essa divisão, a resolução fica maximizada, criando imagens mais nítidas e similares às do papel impresso (Figura 34) (EINK, 2012, online). 146 Figura 32 - Funcionamento da tela e-Ink (1) A tinta eletrônica é feita com milhões de microcápsulas muito finas, com o diâmetro aproximado de um fio de cabelo. Cada microcápsula contém carga positiva com partículas brancas e carga negativa com partículas pretas suspensas em um fluído limpo. Fonte: EINK (2012). Figura 33 - Funcionamento da tela e-Ink (2) Quando um campo de força positivo ou negativo é aplicado, as partículas correspondentes se movem para o topo da cápsula, onde são visíveis pelos usuários e isto faz com que a superfície apareça preta ou branca naquele ponto. Fonte: EINK (2012). 147 Figura 34 - Funcionamento da tela e-Ink (3) A carga de cada microcápsula também pode ser bifurcada, resultando em uma superfície metade branca/metade preta. Essa divisão da carga maximiza a resolução e cria imagens nítidas, mais similares ao papel impresso. Fonte: EINK (2012). Hoje111, os e-readers disponíveis no mercado brasileiro são o Kindle – da Amazon – e o Kobo em parceria com a Livraria Cultura. O Kindle é oferecido em três modelos, sendo eles o kindle Paperwhite 3G (R$ 699), o Kindle Paperwhite Wi-fi (R$479) e o Kindle (R$299), sendo que os dois modelos mais caros possuem tela touchscreen e iluminação embutida, o terceiro apenas oferece botões de controle e os três modelos são pretos (AMAZON, 2012-2014). A Livraria Cultura oferece o Kobo em quatro modelos (sendo que cada um deles foi fabricado em mais de uma cor), o Kobo Mini (R$ 289,00), o Kobo Touch (R$ 399), o kobo Glo (R$ 479) e o Kobo Aura HD (R$ 659,00), todos com tela e-Ink e touchscreen, sendo que os dois com preços mais altos possuem iluminação embutida (KOBO INC.). Os monitores de computador, tablet, smartphone etc. atuais normalmente possuem tela com tecnologia LCD (Liquid Crystal Display - Telas de Cristal Líquido). As moléculas de cristal líquido são capazes de orientar a luz. Quando uma imagem é exibida em um monitor LCD, elementos elétricos presentes nas lâminas geram campos magnéticos que induzem o cristal líquido a "guiar" a luz oriunda da fonte luminosa para formar o conteúdo visual. Sempre que necessário, uma tensão diferente pode ser aplicada, fazendo com que as 111Em 21 de dezembro 2013. 148 moléculas de cristal líquido se alterem de maneira a impedir a passagem da luz (ALECRIM, 2013, online). A Figura 35 exibe duas telas vistas com zoom de 25 vezes, onde é possível entender melhor a diferença entre a tela e-Ink e a LCD: Figura 35 - Tela e-Ink vs. LCD E-Ink à esquerda e LCD à direita, com zoom de 25x. Fonte: EINK, 2012. A luz da tela LCD divide opiniões: muitas pessoas reclamam que a luminosidade pode incomodar os olhos, podendo causar ardência, vermelhidão etc., mas outros leitores apreciam a luz emitida pela tela, principalmente porque favorece a leitura em ambientes escuros. A iluminação própria da tela é percebida como vantagem do suporte digital frente ao similar impresso, posto que este último necessitaria de claridade artificial no local onde estivesse lendo, principalmente quando existir mais de uma pessoa no ambiente que quer ser minimamente incomodada com a leitura alheia. Outra diferença dessas duas telas é que normalmente a e-Ink não é colorida e o branco se assemelha mais ao tom do papel jornal, meio acinzentado, o que acaba desagradando alguns leitores (Figura 36); já a tela LCD traz cores mais brilhantes. Ao perceber as vantagens da luz no aparelho para a leitura, os últimos e-readers lançados trazem uma iluminação embutida, possibilitando uma sensação de “branco mais branco” (Figura 36) e permitindo a leitura no ambiente escuro. Dentro da tradição projetual de livros impressos, Tschischold (2007, p. 213) repugnava o papel branco e o branco-puro para confeccioná-los, afirmando ser “Sumamente desagradável para os olhos e uma ofensa à saúde da população. Uma leve tonalidade (marfim e mais escuro, mas nunca creme), jamais importuna, costuma ser melhor”. É possível relacionar com essa afirmação do autor, as opções de cores de 149 fundo que são oferecidas pelos softwares de leitura para telas LCD, que geralmente, além do branco, oferecem a cor sépia (Figura 5). Figura 36 - Foto de tela e-Ink com iluminação Foto da tela do Kindle Paperwhite com a iluminação no máximo e no mínimo. Fonte: a autora. Os e-readers– que trazem a iluminação embutida – funcionam de maneira diferente da tela LCD, posto que possuem uma camada que direciona a luz de cima para baixo, distribuindo-a uniformemente na camada de tela e-Ink. O sistema funciona de maneira semelhante no Kobo e no Kindle, mas possui peculiaridades como pode ser visto na Figura 37. No Kindle, existe uma camada a mais entre a iluminação e a tela e-Ink, que é a da tela capacitativa, proporcionando a sensibilidade da tela ao toque. No kobo, o touchscreen funciona através da tecnologia do infravermelho. 150 Figura 37 - Funcionamento da iluminação da tela e-Ink Camadas da tela do Kindle Paperwhite e do Kobo Glo. Os produtores do Kindle achataram “um cabo de fibra óptica em uma folha, usando nano impressão para garantir uma distribuição uniforme da luz. O projeto utiliza padrões de difração óptica em nanoescala, que permite um controle preciso sobre a direção da luz”. (AMAZON, 2012-2014), já no Kobo as “Luzes de LED iluminam a tela com um brilho suave, cuja luz frontal durável e antirreflexo se espalha de forma mais uniforme pela tela do que outros importantes eReaders” (KOBO INC.). Fonte: Amazon (2012-2014); Kobo Inc. Além dessas propriedades da tela, o tamanho e a resolução da mesma estão diretamente relacionados à configuração visual do livro digital. O projeto gráfico da interface deve ser otimizado para cada situação que pode ser encontrada pelo leitor, levando em consideração as características de cada hardware. Essa reorganização pode ser percebida claramente nas interfaces dos softwares que são distribuídos para diferentes aparelhos, como é o caso do aplicativo Kobo (Figura 38). Na Figura 38podem ser vistas duas telas capturadas com o menu de configurações de texto aberto. No primeiro caso, o software é visualizado em um Smartphone com tela de 4 polegadas e, no segundo, em um tablet de 10.1 polegadas. No menor o menu aparece ocupando toda a tela e o feedback das alterações da configuração do texto são exibidas em um texto padrão; no maior, o menu ocupa um pequeno espaço da tela e o feedback das alterações é exibido no próprio texto. Vale dizer que no tablet é exibida uma opção a mais de configuração, que permite de visualizar o texto em duas colunas quando o aparelho está na orientação paisagem. 151 Figura 38 - Diferença na interface de software para smartphone e tablet. Tela capturada das configurações de leitura do Software Kobo no Smartphone com 4 polegadas e no tablet de 10.1 polegadas. No menor o menu aparece em tela cheia e as alterações são exibidas em um texto padrão, no maior o menu ocupa um pequeno espaço da tela, o feedback das alterações é exibido no próprio texto e é possível visualizar o texto em duas colunas quando o tablet está na orientação paisagem. Fonte: A autora. Além do modo de visualização, o hardware também atua sobre o método de entrada de dados, o que pode ser feito por intermédio de toques em telas sensíveis a este, teclados, botões,77 4.1. A configuração gráfica do livro ........................................................................... 78 4.2. Definições sancionadas ...................................................................................... 92 4.3. Paralelos e aproximações entre o impresso e o digital: definições em revisão bibliográfica ............................... 96 5. DISTANCIANDO-SE DO IMPRESSO ................................................................. 104 5.1. Hipertexto ......................................................................................................... 105 5.2. A prática hipertextual: múltiplos caminhos para um leitor................................. 113 5.2.1. Subvertendo a ordem da leitura: a possibilidade de um leitor coautor .... 115 5.2.2. Novas possibilidades de apresentar o texto ............................................ 120 5.2.3. Experiências realizadas no meio digital .................................................. 133 6. O LIVRO DIGITAL: MATERIALIDADES SOBREPOSTAS ................................ 139 6.1. Hardwares para leitura ..................................................................................... 142 6.2. Softwares de livros digitais ............................................................................... 153 6.3. Conteúdo e formatos de livros digitais ............................................................. 162 6.4. Mecanismos para regularizar o livro digital ...................................................... 170 7. ANÁLISE DOS ARTEFATOS CHAMADOS DE LIVROS DIGITAIS .................. 176 7.1. Identificação ..................................................................................................... 176 7.2. Acesso.............................................................................................................. 177 7.3. Funcionalidades ............................................................................................... 178 7.4. Potencialidades do meio digital ........................................................................ 179 7.5. Aproximação da ideia de livro impresso (Remediação) ................................... 183 7.6. Os livros preto e branco no e-reader ................................................................ 184 7.7. Os softwares específicos para leitura ............................................................... 187 7.8. Livros aplicativos: para ver, ouvir e tocar ......................................................... 189 7.9. Os livros online no notebook ............................................................................ 196 7.10. Caracterização dos Livros digitais .................................................................. 200 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 206 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 215 GLOSSÁRIO ........................................................................................................... 225 APÊNDICE A – Tabela Estado da Arte ................................................................... 228 APÊNDICE B – Estudo Preliminar do livro Reprograme ......................................... 232 APÊNDICE C – Tabela de análise I ........................................................................ 248 APÊNDICE D – Tabela de análise II ....................................................................... 260 APÊNDICE E – Tabela de definições e-book .......................................................... 264 APÊNDICE F – Tabela de análise dos artefatos chamados de livros digitais ......... 265 1. INTRODUÇÃO Se outrora a leitura digital era associada à imobilidade dos computadores de mesa, hoje é notório que muitas pessoas estão explorando as possibilidades dos aparelhos móveis para dar andamento às suas leituras. Os tablets1, e-readers2 e smartphones3 são novos suportes digitais que entram na vida dos leitores brasileiros cada vez com mais força. Além de seu grande potencial para ampliar o acesso aos livros digitais4 e de sua mobilidade, esses aparelhos acrescentam novas possibilidades de recursos e linguagens para serem utilizados nesse tipo de publicação. As novas configurações que passam a ser possíveis com a digitalização dos livros colocam em xeque a própria definição sobre o que é ou possa vir a ser um livro, até porque, ao migrar para o digital, as divergências não se encerram somente na transposição da representação do papel para os pixels. É certo afirmar que pode a estrutura do livro permanecer inalterada, mas também é possível explorar-se os recursos do meio digital, fazendo-se uso de suas potencialidades, tal como interatividade, hipertexto, linguagens multimídia e interação entre leitores. No Brasil, uma das formas mais conhecidas de livro digital é o arquivo PDF (Portable Document Format), cuja principal característica é justamente a fidedignidade, pois esse tipo de arquivo se apresenta na tela tal qual a configuração visual prevista para o impresso. Contudo, seria redutor pensar em livros digitais apenas como arquivos que reproduzem as características do papel, mesmo porque a visualização do texto na tela já implica em configurações específicas, diferentes 1 Tablet é um tipo de computador portátil, de tamanho pequeno, fina espessura e com tela sensível ao toque (touchscreen). 2 E-reader é um aparelho portátil criado especificamente para a leitura de livros digitais. Normalmente sua tela possui tecnologia e-Ink, a qual não emite luz. A tela pode ser sensível ao toque ou não. 3 Smartphone é um telefone celular com tecnologias avançadas, o que inclui programas executáveis em um sistema operacional, equivalente ao dos computadores. A tradução literal do termo seria telefone inteligente. 4 Neste trabalho, optou-se por dar preferência ao termo livro digital, mas para tornar a leitura mais agradável e o termo menos repetitivo, fez-se também uso como sinônimos de e-book e livro eletrônico. 16 das do impresso, posto que solicitam um novo design capaz de dar conta, por exemplo, dos diferentes formatos e dimensões de telas que exigem alterações das margens, das cores, do tamanho e do tipo da fonte. Frente à fluidez desses novos aparelhos, a diagramação pensada para a rigidez do papel pode causar desconforto, sobretudo em aparelhos pequenos, como e-readers e smartphones. Para solucionar essa dificuldade, foi desenvolvido o formato de arquivo EPUB (Eletronic Publication), no qual as informações textuais são independentes das configurações visuais, possibilitando que a cada visualização em uma tela o texto se reacomode no visor, facilitando a leitura contínua. As peculiaridades dos livros digitais não estão restritas à visualização de textos. Ao longo deste trabalho serão comentados outros formatos que trazem como diferencial outras possibilidades do meio digital, como conectar os leitores do mesmo livro através da internet, possibilitando-lhes o acesso a comentários e destaques feitos no texto por outras pessoas, ocasionado, assim, um intercâmbio de interpretações de um mesmo conteúdo. Essa troca de notas e observações entre leitores, se resultarem de anotações escritas no papel, normalmente não poderão ser apagadas sem deixar marcas, antes de um ‘novo’ leitor, desinteressado nos comentários, ler o volume; já no meio digital, as camadas de informação, adicionadas por um leitor, podem ser ativadas ou não, podendo o outro usuário, quando acessar o conteúdo, escolher se quer ou não ter acesso a essas marcas, podendo fazê-lo antes, durante, ou depois de sua leitura. O meio digital também possibilita a utilização de recursos multimidiáticos, tal qual vídeos, sons, imagens e animações, inclusive trazendo consigomouse, voz etc. Esses detalhes influenciam na postura do leitor perante o texto, tendo em vista que o conduzem a executar movimentos para avançar no conteúdo, destacar trechos, inserir comentários etc. O tamanho e tipo do aparelho também estabelecerão uma relação direta com o lugar físico em que se processará a leitura, podendo interferir na concentração. Por exemplo, ao utilizar um computador de mesa, o usuário terá que permanecer sentado naquele lugar por muito tempo ou enquanto se dispuser a ler. Por provavelmente estar em um ambiente fechado, poderá ser favorecida uma leitura de estudo ou trabalho, que necessita uma maior concentração. Pode-se supor que ao ler em um celular, como 152 esse aparelho costuma estar sempre com a pessoa, esta poderá estar em uma situação de leitura transitória, em meio à atividade do seu cotidiano, como dentro de um ônibus na cidade, com barulho, movimentação do veículo e outras distrações. O tablet e o e-reader possuem um tamanho mais próximo ao livro tradicional e isto pode conduzir o leitor a ler nas mesmas condições que o faria com o livro em papel, ou seja, num sofá, na cama etc. A relação desses fatores influenciam no projeto de leitura e, inclusive, o aparelho pode ser escolhido em função do uso previsto e do conforto esperado. Outro detalhe que está ligado à camada de ação do hardware é o sistema operacional do equipamento. No caso dos celulares e tablets, os mais comuns são o IOS (da Apple), o Android (do Google) e o Windows 8 (da Microsoft); no caso dos computadores, são o Windows e o IOS; já os e-readers possuem um sistema próprio semelhante a um software de leitura. Tanto o Kindle quanto o Kobo possuem softwares que podem ser instalados em outros equipamentos com diferentes sistemas operacionais, o que faz com que o livro que foi programado para ter cores e emitir som quando visto no tablet, poderá ter as suas imagens em tons de cinza e ser mudo quando lido nos e-readers. Essa situação pode ser observada no livro da Companhia das Letras, Getúlio 2: Do governo provisório à ditadura do Estado Novo (1930-1945), de Lira Neto, o qual é disponibilizado em duas versões para software reader, uma edição especial com vídeos e áudios da época, e outra sem esses recursos multimídia, apenas com texto (COSTA, 2013). O interessante dessa possibilidade do software funcionar em diferentes sistemas e equipamentos é que agrega portabilidade ao livro digital, ou seja, o leitor pode trocar de equipamento durante a leitura do mesmo livro (ler no celular, no tablet e no computador). Tanto o Kobo quanto o Kindle oferecem a sincronização (que pode ser ativada ou não) da leitura entre os equipamentos. Dessa maneira, pode-se parar a atividade no celular, por exemplo, e continua-la no tablet, o qual vai exibir o texto exatamente onde a leitura foi interrompida naquele outro aparelho. Contudo, vale ressaltar que essa portabilidade existe apenas dentro da mesma companhia de software, não sendo possível ainda realizar essa sincronização utilizando contas de usuários ou programas diferentes, até porque, como será comentado a seguir, nem sempre o mesmo arquivo pode ser aberto em diferentes softwares. Essa falta de um padrão estabelecido é um problema tanto 153 para o leitor quanto para o editor do livro, porquanto a escolha do modelo a ser trabalhado (no caso do editor) e adquirido (no caso do leitor), exclui muitas outras possibilidades de uso e, consequentemente, de mercado. A editora Cosac Naify em abril de 2013 lançou seus primeiros livros digitais nas livrarias Saraiva e Cultura, o que significa que, em um primeiro momento, excluíram os leitores do e-reader Kindle (COSAC, 2013). Como os softwares da Saraiva e da Cultura podem ser instalados em diversos sistemas, o leitores que possuem tablet, smartphone etc. não foram excluídos, mas, de certa forma, são obrigados a possuírem diversos softwares instalados no seu equipamento, um para cada loja que costumam comprar. Isto impossibilita a visualização de todos os livros adquiridos ao mesmo tempo (como é feito na estante dos livros de papel), posto que cada um pode provir de uma bookstore diferente que, por sua vez, transfere o e-book para o software reader de sua empresa. Este detalhe o levará a ter uma maior dificuldade na localização do livro que deseja acessar, pois necessitará lembrar onde o comprou, para saber qual aplicativo deverá abrir para encontrá-lo. Outro pormenor interessante é que a escolha das empresas que irão comercializar o e-book pode influenciar no design do livro digital. Por exemplo, no caso referido da Cosac Naify, a editora optou por não inserir as páginas de sumário, observando ser uma informação desnecessária, uma vez que o próprio software oferece acesso ao mesmo através de seu menu (COSAC, 2013). Caso haja a decisão de fazer a comercialização desse mesmo produto na Amazon, terá que proceder uma alteração nos e-books enviados àquela outra loja, pois nas normas da Amazon é obrigatória a presença das páginas de sumário no próprio e-book, mesmo que o software Kindle ofereça este atalho. 6.2. SOFTWARES DE LIVROS DIGITAIS Para Procópio (2010, p. 45), “o reader112 é o software ou o aplicativo desenvolvido para auxiliar na leitura de livros” nos diversos aparelhos passíveis de serem utilizados para essa função, desde computadores de mesa a smartphones. 112 Alguns autores utilizam o termo reader [leitor] para referirem-se aos softwares específicos para leitura. 154 Normalmente os softwares são gratuitos e especialmente programados para leitura, trazendo ferramentas específicas para auxiliar essa atividade, tais como: • Possibilidade de criação de biblioteca pessoal; • Acesso (direto e indireto) aos servidores de livrarias e bibliotecas virtuais, com a possibilidade de aquisição de obras gratuitas; • Marcadores de página e busca rápida dessas marcações; • Compatibilidade com níveis de segurança (criptografia) exigidos pelos detentores de conteúdo (DRM); • Busca por palavras e frases nos textos; • Alteração de fonte, para facilitar a leitura; • Ferramenta para sublinhar trechos; • Dicionário relacionado; • Adicionadores de notas (PROCÓPIO, 2010, p. 47). Esses itens elencados por Procópio (2010) são aqueles que normalmente podem ser encontrados nos softwares de leitura. Nessa lista se percebe que muitas das ações destacadas são as mesmas previstas nos livros impressos. No site e-booksBrasil113 (2003) essas ferramentas são apresentadas como “funcionalidades do papel” e abarcam, entre outras finalidades, fazer anotações, colocar marcadores e efetuar buscas. Apesar deste último item apontado, ser considerado uma facilidade própria do meio eletrônico, percebe-se que já está incorporado à ideia do livro digital e, principalmente, na atividade da leitura. O software, dentro das possibilidades do hardware, delimita as ações que o leitor pode fazer no o livro digital. Pode-se dizer que muitos recursos imitam o que pode ser feito com o livro impresso, porém alguns são menos interativos do que o texto no papel, já que a única ação que determinado software e/ou o arquivo permitem é o avanço das páginas e o aumento da imagem (zoom) para uma melhor visualização de algum detalhe, não possibilitando, entretanto, marcações, anotações e inclusive, se visualizados em um computador, não podem nem ser carregados facilmente de um lugar para outro. Frente aos novos recursos explorados através da mídia digital, a palavra ‘interatividade’ muitas vezes está sendo associada ao livro eletrônico, principalmente no que concerne à publicidade de livros que exploram os recursos multimídia, como pode ser visto nos trechos a seguir, retirados de sites que falam sobre o assunto: 113 http://ebooksbrasil.org/informe/faq.html#2eb 155Livros infantis interativos: Leve vida às histórias infantis ao permitir que as crianças interajam com imagens, jogos e personagens do enredo (TAPPS, 2014, online114). No ano passado, Al Gore lançou Our Choice no formato de aplicativo, indo além do convencional e conferindo uma grande dose de interatividade ao conteúdo de seu livro (ALMEIDA, 2012, online, grifo nosso115). A nova editora e-stilingue lança uma obra literária voltada para as crianças de hoje, que pode ser lida e manipulada no iPad - essa é a definição de Dragoberto, livro digital interativo com texto de Alfredo Stahl e ilustrações da artista Beatriz Bittencourt (TRAMELL, 2013, online, grifo nosso116). Lançamento: e-book de aventuras históricas interativas Vocês lembram daqueles livros para adolescentes onde você tinha que decidir o rumo da história? Agora com o livro digital criar uma história assim, interativa é bem mais simples! (MELO, 2013, online, grifo nosso117). A partir da observação do uso das palavras ‘interação’, ‘interativo’ e ‘interatividade’ nas citações acima, percebe-se que em quase todas as utilizações, a palavra diferencia o livro digital do impresso, como se fosse uma coisa melhor, dando a entender que na mídia anterior não teria interatividade. Como nos mostra Fragoso (2001) essa comparação acompanha a palavra desde que foi cunhada nos anos de 1960, posto que denominava uma qualidade específica da chamada computação interativa (interactive computing), quando foram incorporadas as “teleimpressoras e máquinas de escrever como unidades de entrada e saída de dados (input e output) de sistemas computacionais” (FRAGOSO, 2001, p. 2). Esses novos recursos flexibilizaram a interação usuário-máquina, que anteriormente era realizada a partir de cartões perfurados, fitas magnéticas, interruptores e dials. Apesar de haver uma grande diferença qualitativa desses dois modos de interação com a máquina, e o nome “computação interativa” servir justamente para enfatizar essa diferença, é errado considerar que não havia interatividade antes disso. “O fato de que alguns meios ou certos processos e produtos midiáticos são dotados de interatividade não implica que os demais sejam não-interativos” (FRAGOSO, 2001, p. 3). Assim sendo, vale dizer que o mesmo ocorre dentro do universo de livros digitais, onde existirão diferentes níveis de interatividade, sendo que alguns 114 Disponível em , acesso em 5 jan. 2014. 115 Disponível em acesso em 5 jan. 2014. 116 Disponível em acesso em 5 jan. 2014. 117Disponível em acesso em 5 jan. 2014. http://tapps.com.br/solucoes/livro-interativo/#sthash.9jSVH0I4.dpufhttp://almanaquevirtual.uol.com.br/ler.php?id=29007&LIVRO+DIGITAL+INTERATIVO+DRAGOBERTO+TRAZ+CRIACAO+ART%EDSTICA+CONJUNTA&PHPSESSID=83bed0624d0543c4670e695ad96094f8http://almanaquevirtual.uol.com.br/ler.php?id=29007&LIVRO+DIGITAL+INTERATIVO+DRAGOBERTO+TRAZ+CRIACAO+ART%EDSTICA+CONJUNTA&PHPSESSID=83bed0624d0543c4670e695ad96094f8http://www.simplissimo.com.br/lancamento-ebook-de-aventuras-historicas-interativas/http://www.simplissimo.com.br/lancamento-ebook-de-aventuras-historicas-interativas/156 oferecerão menos recursos que o livro impresso, outros ofertarão o equivalente a ele e, ainda, haverá os que terão acrescido novos recursos inerentes ao meio digital, como a busca de palavras, o dicionário embutido, os elementos multimídia automáticos ou aqueles que podem ser acionados/manipulados pelo usuário. Ao pensar nos livros que são acessados em aplicativos de leitura, a interatividade permitida ao leitor é inerente ao software e não ao seu conteúdo. Portanto, é válido afirmar que os conteúdos interativos são aqueles que trazem recursos multimídia e/ou hipertextuais que podem ser acionados/manipulados pelo usuário dentro do seu conteúdo, independente dos recursos oferecidos pelo software, os quais podem adicionar outros tipos de interatividade na experiência de leitura (o uso do dicionário, a busca de palavras, os grifos etc.). Desse modo é possível diferenciar os livros digitais que trazem essas outras linguagens e possibilidades daqueles que exploram apenas o texto e imagem estática. Existem diversos softwares específicos para leitura de livros digitais, como foi comentado, quase todos apresentando ferramentas semelhantes para auxiliar a leitura, mas eles não são exatamente iguais. Para ilustrar essas diferenças, selecionou-se alguns dentre esse grande grupo de aplicativos para leitura: o Kindle, o Bluefire Reader, o Kobo, o Adobe Reader e o iBooks. O Kindle e o Kobo são originários do e-reader homônimo a cada um deles, e as funcionalidades repetem as desses aparelhos. O diferencial deles, utilizados no tablet, frente ao e-reader é a utilização da cor na interface e as possibilidades de destaques e grifos. As funcionalidades do aplicativo do Kindle são as mesmas do aparelho e serão explicadas na seção 7.6 Os livros preto e branco no e-reader. O Kobo traz um apelo mais colaborativo, facilitando o compartilhamento da leitura e fazendo uso de ‘selos’ (Figura 39). Esses selos vão sendo fornecidos ao leitor, de acordo com as suas características captadas pelo software, o usuário também consegue acompanhar o seu desempenho e o de outros leitores, através de estatísticas e gráficos disponibilizados pelo aplicativo. 157 Figura 39 - Selos do aplicativo Kobo ‘Selos’ dados ao leitor através no aplicativo Kobo, ao lado de cada um, a opção de compartilhar o título nas redes sociais. Fonte: a autora O Bluefire Reader se destaca pelas possibilidades de customização. Enquanto os outros aplicativos oferecem menos de 10 tipografias para serem escolhidas e três opções de cores de página (Preto, Branco e Sépia), o Bluefire apresenta uma lista incontável de tipografias e é possibilitado ao leitor criar qualquer combinação de cores de letra e fundo (Figura 40). Os três aplicativos podem ser instalados em diversos aparelhos e serem sincronizados, o que permite ao leitor iniciar a leitura em um equipamento e terminá-la em outro, sem perder suas marcações e comentários. 158 Figura 40 - Menu de configurações do Bluefire Reader Diferentes possibilidades de configurar a página, oferecidas pelo aplicativo. Fonte: a autora O Adobe Reader é um software específico para a leitura de PDF, possuindo, referente à customização, uma visualização ‘noturna’, que transforma o fundo da página em preto, as letras em branco e as imagens em tons de cinza. O diferencial desse aplicativo (e que só funciona com PDFs) é a possibilidade de se inserir desenhos e assinaturas nas páginas, além de grifos e comentários, podendo este arquivo, juntamente com as adições feitas pelo usuário, ser enviado por e-mail (Figura 41). 159 Figura 41 - Ferramentas do software Adobe Reader À esquerda, duas telas capturadas do aplicativo visualizado no smartphone, nas quais os menus são acionados de formas diferentes. E, à direita, tela capturada do aplicativo utilizado no tablet, na qual já foram destacados trechos e inseridos desenhos pelo leitor. Fonte: a autora. O iBooks, como o nome propõe é um aplicativo específico para livros digitais e possui peculiaridades frente aos outros aparelhos. Ele só pode ser instalado em aparelhos da Apple (iPhone, iPod, iPad, iMac) com o sistema operacional próprio da empresa, o IOS. Diferente dos aplicativos que funcionam em diferentes sistemas operacionais e consequentemente em diversos tamanhos de aparelhos,os livros disponibilizados através do iTunes possuem características fixas e claras, o que permite a exploração de livros digitais com layouts fixos, pois não precisam se adaptar ao tamanho da tela do leitor, já que esta informação não é variável. Dentro do iBooks, o menu do programa se altera de acordo com o livro que é acessado; em uns é possível ativar ou desativar a narração ou o som, em outros, customizar a fonte, seu tamanho e sua tipografia e, ainda, tem aqueles em que apenas é possível utilizar o zoom. Pode dizer-se que esse programa possibilita o acesso a diferentes tipos de livros, alguns que se aproximam mais dos livros abertos em outros softwares de leitura e outros que estão mais próximos dos livros aplicativos. Nem todos os softwares leem a totalidade dos tipos de livros digitais, sendo comum não serem decodificados formatos de arquivos desenvolvidos por outras empresas. O aplicativo Kindle da Amazon, por exemplo, lê arquivos com a extensão MOBI, enquanto o iBooks da Apple, lê EPUB. Apesar de ambos os arquivos 160 apresentarem características semelhantes (que serão vistas a seguir), eles são incompatíveis entre os respectivos programas, sendo necessário realizar uma conversão118 de um arquivo para o outro quando se quiser ler em outro aplicativo/aparelho, que não seja aquele originalmente programado. O arquivo MOBI pertence à Amazon, é de leitura exclusiva dessa empresa, e o EPUB é um formato com especificações abertas, que foram instituídos pelo International Digital Publishing Forum119 (IDPF – Fórum Internacional de Publicação Digital), que é a organização que regula as especificações sobre esse formato, compatíveis com HTML ou XML. O EPUB foi uma tentativa de padronizar o formato das publicações eletrônicas, incluindo o livro digital, em função disso muitas empresas acabaram adotando essa extensão e a maioria dos softwares readers leem esse tipo de arquivo. Os softwares que leem o formato EPUB podem ser divididos em dois grupos: aqueles que utilizam um engine (motor) de um navegador Adobe Reader Mobile SDK e aqueles que fazem uso do Webkit. Fernando (2012, online120) explicou que é como se todos os automóveis pudessem possuir apenas dois tipos de motores e alterassem somente o design da parte externa. Alguns exemplos de softwares podem ser vistos na Tabela 17. 118 Conversão é “a ação de transformar o conteúdo de um determinado formato (impresso ou digital) em outra extensão de arquivo. O conteúdo de um material impresso pode ser convertido em um formato digital (PDF, ePub, etc). Assim como um conteúdo já em formato digital pode sofrer conversão para outra extensão (quando um PDF ou arquivo DOC é transformado em ePub, por exemplo)” (OLIVEIRA, 2013, p. 122). 119 Disponível em: . Acesso em 12 jul. 2013. 120 http://revolucaoebook.com.br/dois-motores-para-meu-epub-adobe-e-webkit/ http://idpf.org/161 Tabela 17 - Softwares que utilizam Adobe SDK e Webkit Adobe SDK121 Webkit Adobe Digital Edition (PC/Mac) Nook Reader (PC/Mac) The Copia (PC/Mac) IBA (PC/Mac/iPad) Bluefire Reader/Cultura Reader (iPad) Saraiva Reader (iPad, Android) Aldiko (Android) A maioria absoluta dos leitores com tecnologia eInk (série Sony, Bookeen, iRiver, Positivo Alfa, Nook, etc.…) iBooks (iPad, iPhone, iPod Touch) Ibis Reader (leitor online) Calibre, Lucidor ePubReader (extensão para Firefox; portanto, usa o sistema do Firefox) Tabela criada pela autora baseada nas informações dadas por Fernando (2012, online). Fonte: a autora O Adobe SDK, é produzido pela Adobe e seu diferencial é ser “o único sistema que permite a leitura do Adobe DRM”; portanto, se o livro tiver o sistema de proteção da Adobe, “o consumidor do livro deverá ler o EPUB necessariamente em um leitor com o motor de rendering Adobe” (FERNANDO, 2012, online122). Já o Webkit, possui o mesmo motor open source que é utilizado nos navegadores Safari e Chrome. Apesar deste motor não possuir o DRM da Adobe, ele oferece mais recursos que o seu concorrente, já “que ele suporta todas as declarações de CSS123, e também as que ainda não foram implementadas totalmente no EPUB, como o HTML5124 e o CSS3” (FERNANDO, 2012, online125). Além disso, o Adobe SDK também não suporta áudio e vídeo, diferentemente do Webkit. Ademais desses recursos que não funcionam no Adobe SDK, a leitura do código do arquivo pode se dar de maneira distinta, gerando diferenças não-programadas que o mesmo e-book pode ter sendo lido em softwares ou hardwares variados. A influência dessas camadas que interferem sobre o livro digital pode ser percebido no livro Esse é o meu tipo, de Simon Garfield, da editora Zahar. A imagem abaixo retrata um exemplar do livro adquirido através da Amazon e observado no aparelho Kindle Paperwhite e no aplicativo Kindle no iPad 2. O livro possui a opção “Fonte do editor” entre as alternativas de tipografia, mas curiosamente a Fonte do 121 A lista completa de softwares pode ser vista no site da Adobe http://blogs.adobe.com/digitalpublishing/supported-devices 122 http://revolucaoebook.com.br/dois-motores-para-meu-epub-adobe-e-webkit/ 123“CSS é a abreviatura para Cascading Style Sheets.(Folha de Estilos em Cascata). O CSS é uma linguagem para estilos que define o layout de documentos HTML. Por exemplo, CSS controla fontes, cores, margens, linhas, alturas, larguras, imagens de fundo, posicionamentos etc. Normalmente o HTML é usado para estruturar conteúdos e o CSS é usado para formatar conteúdos estruturados”(SILVA, online). 124 Hypertext Markup Language. 125 http://revolucaoebook.com.br/dois-motores-para-meu-epub-adobe-e-webkit/ http://blogs.adobe.com/digitalpublishing/supported-devices162 editor é diferente em ambos os aparelhos, sendo utilizada uma tipografia sem serifa no Kindle e, no iPad, uma com serifa (Figura 42). A dúvida que permanece ao observar as duas visualizações é se essa diferenciação ocorreu devido a um erro de leitura do código do arquivo ou se a editora optou por otimizar a fonte para a visualização em cada uma das telas (LCD e e-Ink). Figura 42 - E-book com tipografia padrão diferente Fonte: a autora. 6.3. CONTEÚDO E FORMATOS DE LIVROS DIGITAIS O sentido da leitura é construído com base no que é sugerido no texto e no contexto, ou seja, nas palavras do autor e no arranjo visual arquitetado pelo designer (HENDEL, 2006; CHARTIER, 1997; GRUSZYNSKI, 2007). No meio digital, um terceiro ponto influencia na contextualização: o tipo de formato escolhido para disponibilizar o e-book, observando que cada um oferece uma gama de diferente de recursos. O arquivo digital é constituído de linguagens de códigos que se assemelham às utilizadas na criação de sites, como o HTML, XHTML, XML etc. Assim o arquivo do e-book será criado e posteriormente, empacotado e transformado em EPUB. Esse processo de empacotamento é semelhante ao que acontece a um arquivo ZIP (GUERRATO, 2012). Finalmente, antes de ser disponibilizado ao público, 163 poderá passar por uma criptografia para ser administrado através de uma ferramenta DRM, com a finalidade de evitar a pirataria. Ao pensar sobre o conteúdo/livro, percebe-se que este pode ser dividido em três camadas, que seriam constituídas das informações “puras” (texto126); da configuração visual, na qual esse conteúdo é organizado (design); e do tipo de arquivo que será finalizado (formato). Dessa forma, a parte de conteúdo, inserida na Figura 29, seria composta pela tríade: texto, formato e design (Figura 43). Figura 43–Elementos que formam o conteúdo do livro digital FormatoTextoDesignConteúdo Fonte: a autora. O texto de um autor pode ser apresentado com diversas abordagens, podendo constituir-se apenas de texto, de texto e imagem, de texto e animações, de texto e música… Cadaformatação agregará outros sentidos ao conteúdo, e pensando exclusivamente em um livro, este poderá ser publicado em papel ou no formato digital. Muitas vezes será possível encontrar de distintas formas, inclusive no meio impresso. Um exemplo desta ocorrência seria um livro com uma edição de bolso e outra de luxo, um podendo vir acompanhado de imagens e o outro não, um ser colorido e o outro em preto e branco. Dessa forma, pode-se concluir que a publicação em diferentes formatos com a finalidade de abranger públicos diferentes, não é uma novidade lançada no livro digital e, sim, uma prática comum no cenário editorial. Vale dizer que, nesses casos, ao mesmo tempo em que o conteúdo 126 Neste caso o texto é utilizado no sentido semiótico, englobando as informações caracterizadas por diferentes linguagens multimídia que serão organizadas no design. 164 exposto é o mesmo, ele também é diferente, pois existem camadas distintas de informação agregadas a este (CHARTIER, 1999; LYONS, 1999). Um fato interessante é que “A norma padrão do ISBN, ISO 2108, sempre solicita que as diferentes formas de um produto de uma publicação, quando disponibilizadas separadamente, tenham números de ISBN separados” (ISBN, 2010, online). Quando a norma foi revisada em 2005, chegaram à conclusão que as mesmas regras deveriam ser aplicadas às publicações digitais. Logo, a nova norma explica: "Cada formato diferente de uma publicação eletrônica (ex.: ‘.LIT’, ‘.PDF’, ‘.HTML’, .PDB’) que seja publicada e disponibilizada separadamente deverá ter um número de ISBN separado" (ISBN, 2010, online). Portanto a Agência Internacional do ISBN reitera a ideia de que cada conteúdo apresentado de forma diferenciada ou em um formato diferente caracteriza uma nova obra. Para compreender melhor as diferenças dos livros digitais que são vinculadas à escolha do formato de distribuição do arquivo, selecionou-se as extensões mais usuais para esse tipo de publicação editorial, que são: o PDF (Portable Document Format), o EPUB (Eletronic PUBlication), o MOBI (mobipocket), o Livro aplicativo (Folio) e o ASCII. Os primeiros livros em formato digital foram disponibilizados pelo Projeto Gutenberg na década de 1970 (HART, 2010) e o seu site se mantém em atividade ainda hoje127. A proposta deste projeto é maximizar o alcance das obras, distribuindo-as gratuitamente e em formato compatível com qualquer aplicativo, desde os mais básicos aos mais complexos. O Projeto Gutenberg disponibiliza as obras em diversos formatos, possibilitando a leitura online ou o download do arquivo, para ser lido off-line. Se o formato permitir a utilização de imagens, este dado será informado ao usuário, que saberá então se o e-book em questão possui ou não imagens. Na Figura 44 é possível visualizar uma captura de tela do projeto Gutenberg, na qual se pode selecionar o formato desejado para a leitura da obra Adventures of Huckleberry Finn128, de Mark Twain. 127 Disponível em: . Acesso 5 jan. 2014. 128Disponível em: Acesso em 13 jan. 2014. http://www.gutenberg.org/ebooks/76165 Figura 44 - Projeto Gutenberg Fonte: a autora. Uma particularidade do Projeto Gutenberg é que todos os arquivos devem possuir uma versão no formato ASCII129 (American Standard Code for Information Interchange – Código Padrão Americano para Troca de Informação), que corresponde a um arquivo de texto básico (txt). Por ser um recurso mais simples, não permite negritos, itálicos, sobrescritos, subscritos e caracteres não latinos. O Projeto Gutenberg é um marco na história da leitura e, para a finalidade a que se propõe, é extremamente eficiente, já que o formato ASCII é um método seguro de preservação do livro e da informação, devido à sua simplicidade, idade de uso e compatibilidade. Vale destacar que, quanto mais complexo for o formato de arquivo de representação visual, maior o risco de apresentar problemas de leitura no software ou até mesmo gerar uma incompatibilidade de sistemas. Naquele esquema 129 “Cada caractere de texto ASCII ocupa 8 bits de dados (1 byte), o suficiente para 256 combinações diferentes, que incluem caracteres, números e símbolos diversos. Na gíria, ‘ASCII’ também é usado em relação a um arquivo de texto puro, sem formatação. […] O padrão mais atual que vem substituindo o ASCII gradualmente é o Unicode, onde são usados 2 bytes para cada caracter, permitindo o suporte a 65.000 caracteres e símbolos diferentes” (MORIMOTO, 2005, online). 166 (Figura 43) apresentado anteriormente, o formato ASCII poderia representar o que está se chamando de a informação ‘pura’, ou seja, o texto do autor propriamente dito. O modo mais popular de publicação eletrônica para qualquer tipo de texto, desde documentos pessoais a livros, é o arquivo PDF. Desenvolvido pela Adobe Systems e aperfeiçoado ao longo dos últimos 20 anos, agora o formato PDF é um padrão aberto para troca de documentos eletrônicos mantido pela International Standards Organization (ISO) (ADOBE). A principal característica deste formato é a apresentação fidedigna do documento, independente do suporte digital utilizado, ou seja, o arquivo é visualizado sem que ocorram distorções ou alterações de seu layout em qualquer sistema computacional, aparelho ou sistema de impressão. Por esse motivo o PDF é muito utilizado como arquivo final de envio para impressão. No meio digital, a fidelidade na representação do documento impede a customização da página pelo leitor. O único recurso disponível costuma ser o uso de 'zoom' para visualizar a letra maior ou menor, o que, entretanto, pode jogar partes do texto para fora da tela (Figura 45). Mesmo mantendo a integridade visual do arquivo, muitos softwares utilizados para ler o PDF permitem anotações, comentários e marcações. Um importante recurso do meio digital incorporado a este tipo de arquivo é a ferramenta busca de palavras ou expressões exatas contidas no texto. Apesar de ele suportar a ação hipertextual, como: links e botões, campos de formulário, vídeos e áudios, esses recursos parecem ser pouco utilizados nestes formatos, mantendo-se comumente uma configuração mais parecida com o impresso. Muitos livros impressos, principalmente os mais antigos, têm sido digitalizados e disponibilizados em PDF. Alguns são incorporados como imagem, não permitindo interação com o texto (buscas de palavras e grifos); outros fazem uso da tecnologia OCR130 (Optical Character Recognition - Reconhecimento Óptico de Caracteres), que após rastrear e identificar as letras na imagem, possibilita essas ações sobre ele. A digitalização de documentos (com ou sem OCR) é de grande valia para a preservação e divulgação dos mesmos. Ao existir uma cópia digital de um documento, este será poupado do manuseio em muitas situações, corroborando em 130 “Tecnologia que permite reconhecer caracteres de texto em imagens, transformando-os em texto editável. A grande maioria dos scanners acompanha pelo menos um programa de OCR, que podem ser usados para obter texto de páginas impressas, substituindo a digitação manual” (MORIMOTO, 2005, online). 167 prol de sua conservação; e, ademais, ao ser disponibilizado digitalmente será possível alcançar um público maior e mais distante geograficamente, do que aquele que teria de ir pessoalmente a determinadas bibliotecas que armazenam o material original. Existem muitos conteúdos que são projetados para serem divulgados em PDF justamente por promover o aproveitamento integral de suas características, bem como pela busca da já referida compatibilidade com diversos sistemas e garantia da fidedignidade do documento. Os formatos EPUBe MOBI possuem características muito semelhantes, entretanto precisam de distintos programas para serem visualizados, como foi comentado na seção sobre softwares. Neste momento o que é relevante abordar sobre esses dois formatos é que ambos são projetados para que o texto se adapte ao tamanho da tela em que será visualizado, resolvendo, assim, um problema de leitura que decorre do uso do zoom no PDF. Em função dessa adaptação às diferentes telas em que pode ser exibido, esse tipo de arquivo já recebeu o nome de livro líquido (TAVARES, 2012) e texto corrido (GOOGLE, online). Esse recurso de adaptação é de grande utilidade para usuários que acessarem arquivos em aparelhos com telas pequenas, como os smartphone se os tablets. Vale dizer que para ler um texto em PDF em um smartphone, costuma ser necessário utilizar a ferramenta zoom e arrastar a imagem de um lado para outro, justamente porque parte das frases fica fora do enquadramento da moldura do aparelho. Esta dificuldade já não ocorre quando o texto for aberto em um arquivo EPUB/MOBI, posto que neste o leitor pode redimensionar os próprios caracteres tipográficos, de modo que as palavras se reacomodam automaticamente e todo o texto permanece visível na tela. Essa diferença pode ser percebida na Figura 45, onde o mesmo texto é mostrado em EPUB e em PDF, notando-se que, no primeiro, o parágrafo aparece completo com o aumento da letra e, no segundo, cortado através da utilização do zoom. 168 Figura 45 - Diferença entre EPUB/MOBI e PDF Na imagem, um trecho do livro Reprograme de Luís Marcelo Mendes, no arquivo em EPUB e PDF. Fonte: a autora. Nos formatos EPUB/MOBI, as imagens são incorporadas ao texto e não podem ser modificadas, mas os demais elementos, como o tamanho da letra, a fonte, o tamanho das margens, as entrelinhas, as cores da página e do texto, o modo de visualização (tela cheia, simulação de livro, barra de rolagem etc.), entre outros, são customizáveis. Para que esses recursos estejam realmente disponíveis para o leitor, dependerá mais do software utilizado para a leitura do livro do que do próprio formato do arquivo. Vale salientar, então, que nesses formatos o documento digital carrega especificações das configurações do livro, e para serem realizadas dependem do programa que é utilizado para acessá-lo. Segundo Garrish (2011), o EPUB (atualmente em sua versão 3.0) é uma das grandes promessas para o futuro dos livros digitais, pois permite o emprego de diversas ferramentas multimídia e também o uso de projetos gráficos mais elaborados. O formato Livro Aplicativo (Folio) é outra forma de publicação projetada especificamente para tablets e smartphones. Seu conteúdo funciona normalmente em plataformas baseadas no sistema IOS (da empresa Apple) ou Android (da empresa Google). Nesse formato, o livro digital não é mais um arquivo a ser aberto em outro programa, como o EPUB, o MOBI e o PDF; aqui o próprio “livro” é instalado, como um programa ou aplicativo, no aparelho. No Folio o layout é fixo, o que impossibilita as alterações paisagem/retrato da tela, a menos que elas tenham sido 169 projetadas anteriormente pelo designer. Por utilizar a tecnologia DPS (Digital Publishing Suite), este formato possui algumas desvantagens frente ao EPUB/MOBI, levando em conta que não se adapta a diferentes tamanhos de tela e também não possui o recurso de busca de palavras. Por outro lado, o DPS pode captar o movimento do leitor durante o uso do livro digital, tornando possível saber qual foi a página mais lida ou visualizada por mais tempo, entre outras informações disponíveis. Como diz o nome, o “livro aplicativo” é um aplicativo e, como tal, pode desenvolver seu próprio padrão de interatividade, não dependendo dos recursos de outro software, mas, em contraposição, seu layout é fixo e exige diferentes projetos editoriais e modos de implementação, para abranger os diferentes modelos de dispositivos131. Os exemplos mais famosos desse formato são: Alice for iPad da Atomic Antelope e, em português, A menina do nariz arrebitado, da Globo Livros (Figura 46), provavelmente em função de terem sidos explorados diferentes recursos multimídia e interativos, que usualmente esse tipo de produção é chamado de enhanced book (livro aprimorado) (OLIVEIRA, 2013). Figura 46 - Alice for iPad e A menina do nariz arrebitado À direita, página do livro Alice for iPad, na qual as cartas voam sobre a Alice; à esquerda, página de Narizinho, na qual a personagem espirra após o leitor tocar o nariz da mesma. Fonte: a autora. Assim, dentre o formatos mais utilizados para publicação de livros digitais está o PDF, que mantém a fidedignidade do documento e é compatível com todos os sistemas normatizados pelo ISO; o EPUB e o MOBI, que são arquivos acessados por 131 Como a tecnologia digital avança rapidamente, alguns recursos podem ser implementados em pouco tempo, o que invalidaria algumas características apontadas aqui (Dual pixel, 2012). 170 meio de softwares readers e possibilitam a customização da aparência do livro, se adaptando a diferentes tamanhos de tela; o livro aplicativo, que explora outros recursos multimídia e pode criar seu próprio padrão de interatividade, pois não depende de softwares para acessá-lo; e, os livros online, disponibilizados no Projeto Gutenberg, que – por exigir o arquivo ASCI – caracteriza-se pela valorização da preservação do conteúdo. 6.4. MECANISMOS PARA REGULARIZAR O LIVRO DIGITAL Diante de tantas variantes que podem interferir no acesso ao livro digital, o conselho Publishing Innovation Awards desenvolveu o selo QED (Quality Excellence Design – Qualidade, Excelência e Design), que confere à publicação digital uma garantia de qualidade, atestando que o artefato em questão passou por uma avaliação e funciona perfeitamente em diferentes aparelhos dentro do que se propõe. Esse selo faz analogia ao formato impresso no aspecto de existir uma entidade que outorga a garantia do produto. Como nem todos os livros digitais passam por um processo ‘completo’ de revisão anterior à publicação muitas vezes o leitor pode se decepcionar com alguns aspectos ou funcionalidades esperadas e que às vezes não funcionam corretamente. Esta é a importância do QED, que atesta que o leitor poderá abrir o livro em quaisquer dos equipamentos inclusos na avaliação e ler no instante desejado, sabendo que o arquivo não irá apresentar erros. A avaliação é feita em arquivos EPUB e MOBI, que são os formatos que possuem a capacidade de se adaptar ao formato da tela, como foi comentado anteriormente. Se o livro não for comercializado em um desses formatos, ele não poderá ser avaliado nesse sistema de controle de qualidade. Os arquivos são testados em três dispositivos com diferentes tamanhos de tela: em um que possuía tela pequena, semelhante a um celular; em um que corresponde ao tamanho de um tablet e em outro que contempla uma tela e-Ink. Cada livro digital feito em EPUB é analisado por dois aplicativos, um baseado em Webkit (como iBooks da Apple) e outro em SDK Adobe (como Bluefire ou Adobe Digital Editions). Já o e-book feito em MOBI é testado em um visualizador Kindle. O grupo estabeleceu treze critérios para serem averiguados nesses dispositivos: 171 Lista de inspeção 1. Informações gerais: o título não deve abrir em uma página em branco. 2. Hierarquia de informações: o conteúdo é organizado visualmente de acordo com a importância dos elementos. 3. Ordem do conteúdo: nada está faltando ou precisa ser reorganizado nos conteúdos. 4. Consistência do tratamento da fonte: aplicação consistente de estilos e espaçamentos. 5. Links: os hiperlinks para a web, as referências cruzadas para outras seções do livro e o sumário devem estar funcionando e conduzindo aos locais corretos. Se a obra tem um índice, ele deve conterlinks. 6. Capa: A capa refere-se apenas à edição digital atual. 7. Conteúdo Transitório: A obra não contém conteúdo para completar, como em cadernos de estudo ou livros de quebra-cabeças, a menos que o conteúdo tenha sido criado para orientar o leitor sobre a forma de sua utilização. 8. Referências impressas: o conteúdo não deve conter referências cruzadas para conteúdo sem hiperlinks, conteúdo impresso estático ou números de páginas (a menos que o e-book esteja intencionalmente imitando sua contrapartida impressa para referência). 9. Quebras: Novas seções terminam e/ou iniciam em lugares lógicos. 10. Imagens: A arte deve estar em tamanho adequado e ser colorida, quando apropriada. É carregada relativamente rápido e, se contém texto, este é legível. Se algumas imagens forem removidas por questões de direitos, aquela porção é retirada e todas as referências àquela imagem são igualmente removidas. 11. Tabelas: o texto das tabelas se encaixa confortavelmente na tela. Se a tabela for convertida em imagem, o texto deve ser legível. 12. Símbolos: O texto não deve conter caracteres estranhos. 13. Metadados: Os metadados básicos para o título (autor, título, etc.) devem estar no lugar certo132 (QED, 2013, tradução nossa). Ao observar os critérios apontados no QED, pode-se inferir que os itens enumerados como 2, 4, e 9, analisados pelo QED, seguem de maneira lógica as convenções do impresso. O de nº 6, que fala sobre a capa exclusiva para o meio digital, poderia ser interpretado como um projeto voltado unicamente a esse meio, 132 QED INSPECTION CHECK-LIST 1. Front matter: the title does not open on a blank page. 2. Information hierarchy: content is arranged in such a way that the relative importance of the content (heads, text, sidebars, etc) are visually presented clearly. 3. Order of content: none of the content is missing or rearranged. 4. Consistency of font treatment: consistent application of styles and white space. 5. Links: hyperlinks to the web, cross references to other sections in the book, and the table of contents all work and point to the right areas. If the title has an index, it should be linked. 6. Cover: The cover refers only to the current digital edition. 7. Consumable Content: Any fill-in content, such as workbooks and puzzle books, unless the content has been crafted to direct the reader on how to approach using this content. 8. Print References: Content does not contain cross references to un-hyperlinked, static print content or page numbers (unless the ebook is intentionally mimicking its print counterpart for reference). 9. Breaks: New sections break and/or start at logical places. 10. Images: Art is appropriately sized, is in color where appropriate, loads relatively quickly, and if it contains text is legible. If images are removed for rights reasons, that portion is disclaimed or all references to that image are removed. 11. Tables: Table text fits the screen comfortably, and if rendered as art is legible. 12. Symbols: Text does not contain odd characters. 13. Metadata: Basic metadata for the title (author, title, etc.) is in place and accurate. 172 uma vez que a mera transposição do design impresso para o digital pode apresentar problemas de legibilidade na tela. Os critérios de nos 1, 3, 10, 11 e 12 parecem ter sido criados a fim de encontrar possíveis erros de funcionamento no arquivo do livro digital. O critério nº 1 aponta para uma necessidade de alteração na transposição do impresso para o digital. Isto se faz necessário porque se fosse inserida a folha de guarda existente como primeira página no livro impresso de capa dura (e que se constitui de uma página em branco), esta não seria transposta para o meio eletrônico, na indicação do QED, pois confundiria o leitor, que poderia pensar que estivesse ocorrendo um erro no arquivo. A pessoa espera, nesse caso, um resultado mais imediato tanto para escolher um livro na estante virtual como para visualizar alguma informação, seja a capa do livro, folha de rosto ou o primeiro capítulo, mostrando-lhe que o arquivo está funcionando e abriu o e-book desejado. O critério nº 12 pode garantir que o arquivo digital está completo em si mesmo e que não é um material adicional de um livro impresso. Os critérios nos5, 8 e 10 induzem ao uso de algumas vantagens do meio digital, como a utilização de links e a possibilidade de visualizar imagens coloridas (que, neste caso, não acrescentam custos à produção). O critério nº 7 está de acordo com a norma do ISBN, que prioriza o texto a outros conteúdos que não tem como prioridade a leitura. E, finalmente, o critério de nº 13 poderia ser substituído pelo número ISBN, que seria responsável por carregar os metadados da obra. O ISBN para publicações eletrônicas já foi elencado em alguns pontos do texto, mas é interessante aprofundar um pouco mais no que diz respeito aos parâmetros estabelecidos por essa instituição internacional. Para delimitar a edição da obra que corresponderá a determinado ISBN e respeitar a não periodicidade que o livro deve ter para se diferenciar de outras publicações, eles exigem que “Não haja nenhuma intenção de que a publicação seja um recurso continuado” (ISBN, online). Outro recorte interessante, diante de um material que pode oferecer links para diversos conteúdos na web é que “Material de link como por exemplo, hipertexto, só será considerado coberto pelo mesmo ISBN se fizer parte da publicação” (ISBN, online). Os conteúdos que não são passíveis de ter um número de ISBN são: • Publicações sujeitas a frequentes atualizações e em que seja possível acessar e fazer mudanças quase imediatas, como bancos de dados on-line; 173 • Sites de internet; • Materiais promocionais e propagandas; • Quadros de anúncios; • E-mails e outras correspondências eletrônicas; • Mecanismos de busca; • Jogos; • Documentos pessoais (curriculum ou perfil pessoal); • Agendas / diários / calendários; • Jornais / revistas (ISBN, online, grifo do autor). No caso dos softwares, também impera a ideia da necessidade de um conteúdo completo em si e voltado para a leitura, já que: É atribuído ISBN para identificar um produto de software específico para fins educacionais e instrutivos, como um software de treinamento por computador, contanto que não seja personalizável e que não precise de dados para funcionar. Todos os outros produtos de software, como jogos de computador, não poderão receber ISBN (ISBN, online, grifo do autor). Em virtude da confusão inicial que se fazia com os e-books, e-readers e afins, foi julgado pertinente apontar com destaque que “Sistemas operacionais e dispositivos de leitura não recebem ISBN” (ISBN, online, grifo do autor). Os locais indicados para ser exibido o ISBN na publicação digital são: na tela de exibição do título; na primeira tela (CDs, publicações online); na tela de exibições equivalentes; e no caso de filmes educativos/instrutivos e outros vídeos, o ISBN aparecerá nos créditos. Diante de tantas possibilidades de formatos e versões, Ribeiro (2010) trouxe um conceito interessante, adotado neste trabalho, que buscou em Teberosky e Colomer (2003133), para falar de textos e suas visualizações. Ela partiu da definição de display: São displays as telas de toda natureza, nas quais textos são mostrados, projetados ou revelados, assim como outdoors, painéis, rótulos em garrafas e livros. Assim, o display de um texto publicitário pode ser um outdoor; o display da notícia pode ser um televisor, um mural no corredor da escola, um folheto volante ou uma tela de telefone móvel. (RIBEIRO, 2010). Como se pode perceber, ela não está falando apenas de livro, e sim dos textos e de seus espaços de visualização. Ribeiro (2010) pontuou que o display pode ser um suporte ou um portador: 133 TEBEROSKY, Ana; COLOMER,Teresa. Aprender a ler e a escrever. Uma proposta construtivista. Trad. Ana Maria Neto Machado. Porto Alegre: Artmed, 2003. 174 Para ser suporte, o display precisa, segundo Teberosky e Colomer (2003), ser um objeto especialmente feito para a inscrição de texto. É o caso dos livros, dos jornais ou das revistas, que não servem a outra inscrição ou função (ao menos em sua apropriação mais comum). Já para ser um portador, o display precisa, segundo as mesmas autoras, poder acolher um texto, embora não seja primordialmente feito para essa função (RIBEIRO, 2010). Dentro dessa lógica, os livros impressos seriam suportes; no entanto, após serem digitalizados, seus arquivo digitais seriam visualizados na tela, a qual passaria a ser considerada um portador, já que aquela interface não foi projetada para ser visualizada ali e, sim, no meio impresso. Entretanto, nem sempre a tela será um portador. No caso dos livros que passaram pela avaliação QED, por exemplo, cada tela será um suporte, pois o projeto daquele livro foi feito para aquela configuração. Desse modo o aparelho que mediará o acesso ao livro digital pode ser tanto um portador quanto um suporte, dependendo das especificações do projeto e das apropriações do leitor. Em função dessas múltiplas possibilidades, muitos produtores anunciam para qual equipamento o livro digital foi produzido (suporte), podendo restringir ou não a visualização nos outros possíveis portadores. No caso da Apple, existem aplicativos produzidos para iPhone (o qual possui um tamanho menor) que podem ser acessados (com defasagem de qualidade) no iPad. Nesse exemplo o iPhone seria um suporte e o iPad um portador; contudo, o inverso não é verdadeiro, pois os aplicativos produzidos para o iPad não podem utilizar o iPhone como portador. O mesmo ocorre com outras empresas, como pode ser visto na Figura 47. A imagem à esquerda mostra um livro divulgado na PlayStore, o qual traz em sua descrição os modelos de tablets que são passíveis de abrir aquele livro aplicativo. A imagem à direita indica, dentre os aparelhos que estão cadastrados na conta pessoal do usuário, quais deles podem ou não receber o arquivo. 175 Figura 47 - Livro digital com indicação de suporte Detalhe do site da PlayStore, mostrando o livro digital que funciona em aparelhos específicos. Na primeira imagem é anunciado o tipo de aparelho, e na segunda, ele faz relação com os aparelhos que estão vinculados à conta pessoal do usuário, já indicando quais podem receber aquele conteúdo ou não. A partir da compreensão das diferentes camadas de informação que possibilitam ao leitor o acesso ao livro digital, é mais fácil compreender aquele esquema, exibido no início deste capítulo (Figura 29), que ilustra a forma como as restrições de um elemento interferem nas possibilidades do outro. Tendo como base esse panorama levantado sobre o livro impresso e digital, é possível partir para a parte central do trabalho que é a análise dos artefatos que estão sendo chamados de livros digitais. 7. ANÁLISE DOS ARTEFATOS CHAMADOS DE LIVROS DIGITAIS Este capítulo contempla o cerne desta pesquisa que é a análise dos livros digitais. Nos subcapítulos a seguir são abordados os resultados desta etapa final. O processo anterior a este, ou seja, a construção dos parâmetros e definição dos itens a serem observada na tabela, foi descrito na METODOLOGIA. A tabela com os dados analisados pode ser vista no APÊNDICE F – Tabela de análise dos artefatos chamados de livros digitais, encartada no final deste trabalho e também foi disponibilizada para download no formato PDF134 e planilha do Excel135. A partir da observação dos resultados da tabela, foram detectados grupos com características bem definidas. Em função disso, primeiramente são apresentados os resultados de cada macrocategoria – Identificação, Acesso, Funcionalidades, Potencialidades do meio digital, Aproximação da ideia de livro impresso (Remediação) – e, logo após, aborda-se esses grupos que mantêm características em comum (Os livros preto e branco no e-reader, Os softwares específicos para leitura, Livros aplicativos: para ver, ouvir e tocar, Os livros online no notebook). Por fim, é feita uma caracterização dos livros digitais, identificando-os a partir das linguagens e recursos explorados nos diferentes tipos de e-books. 7.1. IDENTIFICAÇÃO Os 82 livros digitais foram analisados nos seguintes aparelhos: 16 deles no e-reader Kindle Paperwhite, 52 no tablet iPad2 e 14 no notebook Dell, modelo Studio 1458. A partir de suas características foram identificados os seguintes formatos de arquivo: MOBI, EPUB, EPUB com layout fixo, PDF, PDF com OCR, livro aplicativo e site (HTML e 134No endereço: ou . 135 No endereço: ou . https://chasquebox.ufrgs.br/data/public/6db989ec26e2fc295ec69d8b24d181be.php?lang=pt-brhttps://chasquebox.ufrgs.br/data/public/6db989ec26e2fc295ec69d8b24d181be.php?lang=pt-brhttp://goo.gl/ITp6AIhttps://chasquebox.ufrgs.br/data/public/88f343ec523c6cf4dd08301aaec1bfeb.php?lang=pt-brhttp://goo.gl/Z6eyO4177 FLASH). Os arquivos foram observados nos seguintes softwares: sistema operacional do Kindle Paperwhite, Kindle para iPad, Kobo para iPad, Bluefire Reader, Adobe Reader para iPad, iBooks e no navegador Google Chrome. Nesta macrocategoria, além dos dados sobre os artefatos foi observada a utilização ou não do número ISBN, percebendo a existência deste em apenas 39% dos livros digitais analisados, sendo que em um136 deles havia ISSN. Considerando que as obras digitais podem receber ISBN desde 2005, esperava-se encontrar mais exemplares com essa identificação. 7.2. ACESSO Com relação ao Acesso, a grande maioria (90%) dos livros foi lida off-line, uma vez que era possibilitado ao leitor que baixasse o livro para o seu aparelho, sem ser necessário estar conectado à internet para lê-los. A possibilidade de baixar o arquivo dá mais liberdade ao leitor de interagir com o conteúdo e armazenar comentários próprios, bem como ter acesso a alterações que foram acrescentadas (notas, destaques etc.). Dos livros lidos online, ressalta-se que os únicos que proporcionavam recursos semelhantes aos disponibilizados para leitura em off-line, exigiam que o usuário estivesse identificado, com login e senha particular. Através dessa personalização, tornava-se possível a manutenção do acesso individual, o qual permite relacionar as ações daquela leitura com um usuário específico. Os livros online que não exigiam esta identificação disponibilizavam o acesso ao livro, mas não permitiam ao usuário acrescentar notas etc. Com base nessas características dos livros off-line e online, tornou-se possível lembrar de algumas práticas comuns ao livro impresso. Quando uma pessoa adquire um volume, ela pode – se assim o desejar – fazer destaques, adicionar comentários nas margens etc., o que já não é possível quando o livro for emprestado – de um amigo ou de uma biblioteca. Nesse caso, o leitor se vê impedido de fazer tais anotações, porquanto aquele livro não é seu e deve ser devolvido intacto para uso de outro leitor. A possibilidade de imprimir marcas 136 ELO - The Electronic Literature Collection Volume Two. 178 pessoais no conteúdo lido, mesmo que seja apenas a lembrança de onde a leitura foi interrompida para ser retomada posteriormente, é um dos fatores que leva o livro a ser consumido individualmente. O livro digital, por não ser um objeto palpável – como o impresso – e ser visualizado através de um display, as restrições e liberdades podem trazer essa sensaçãode posse da obra para o usuário. Ao baixar um arquivo para o seu computador, este sente que está no controle daquele arquivo, podendo deletá-lo ou tentar mantê-lo preservado. No caso do livro que apenas é acessado online, o leitor está à mercê da manutenção do site que o disponibiliza. As possibilidades de acesso ao conteúdo juntamente com as restrições/liberdades de ações (marcas, notas, destaques etc.) que o usuário pode ter naquele livro, serão responsáveis pela sensação de posse que aquele arquivo digital específico pode transmitir, principalmente quando este for baixado para leitura. O que pode ser lido online, além de impor restrições a algumas ações, exige que o acesso seja feito por meio de cadastro e uso de login, demonstra querer saber quem é o usuário e, de certa forma, controlar suas ações, tirando-lhe a privacidade característica de um livro do qual se sinta dono. Isto leva a pensar que, talvez seja justamente por causar essa sensação de posse é que 90% dos livros analisados foram produzidos para serem lidos off-line. 7.3. FUNCIONALIDADES A partir das características avaliadas nas Funcionalidades, percebeu-se que, em função do tipo de livro digital proposto, as ações que facilitavam a leitura – fossem elas semelhantes as do livro impresso ou exclusivas do meio digital – eram exploradas ou não. Nos livros propostos para softwares específicos para leitura e no e-reader, quase todas as ações elencadas eram possíveis; já nos livros aplicativos e online a maioria não era permitida. Curiosamente esse resultado se inverteu ao ser comparado às possibilidades Multimídia, analisadas nas Potencialidades do meio digital, na qual os livros para os e-readers e softwares específicos de leitura repetem as possibilidades do impresso e os livros aplicativos e online exploram mais as outras linguagens possibilitadas pelo digital. Essas características foram mais bem abordadas nas análises dos grupos de livros identificados nos subcapítulos a seguir. 179 Uma facilidade viabilizada pelo meio digital – percebida em 68% dos livros – foi a marcação automática da página em que a leitura foi interrompida, após o fechamento do arquivo, fazendo com que o leitor, em um próximo acesso, abra o livro diretamente nessa marcação. Ao se pensar nas possibilidades do livro digital, que não tem a fisicalidade do papel para impor uma forma, imaginou-se que seriam oferecidos materiais extras, indicações de sites etc.; no entanto, apenas 26% dos livros pesquisados indicaram algum tipo de material extra de fácil acesso, através de menu, site ou, mesmo, junto ao próprio livro. 7.4. POTENCIALIDADES DO MEIO DIGITAL Sob o ponto de vista da macrocategoria Potencialidades do meio digital, das questões agrupadas na categoria Interatividade (Gráfico 1), 10% dos livros encontrados possuíam narrativa hipertextual ou um conteúdo que pudesse ser lido independente da ordem apresentada. A utilização do hipertexto foi notada em 87% dos artefatos, sendo que a maioria (61%) utilizava esse recurso principalmente no sumário. Em 30% dos livros, o sumário era apresentado com miniaturas das páginas, o que facilitava a visão e seleção de capítulos dos livros menores, prejudicando, porém, os maiores, que por possuírem um número maior de páginas, aumentavam, consequentemente, o número das miniaturas. Outro detalhe que deve ser destacado é que 4% dos livros usaram hipertexto no sumário, mostrando que tinham conhecimento dessa técnica, contudo não repetiram o recurso nas notas de fim/rodapé que haviam nos livros. Dos 78% que possuíam imagem estática, apenas 41% permitiu ampliar a imagem. Em 38% dos livros digitais, detectou-se a existência de locais, dentro da história, onde seria permitido ou obrigatório, ao leitor, realizar uma ação para, dessa forma, causar alguma alteração em um elemento da página ou na história (animação, vídeo, som etc.). 180 Gráfico 1 - Interatividade Fonte: a autora. Quanto à utilização das linguagens multimídia, pode-se afirmar que a maior parte dos livros trouxe a interação entre o texto e a imagem estática, sem acrescentar novidades que seriam possíveis em função do meio digital, repetindo, novamente, as possibilidades já executadas no meio impresso. A exploração das cores no interior do livro, no texto ou nas imagens, apareceu em 66% dos livros analisados. Com relação ao uso de cores, um livro chamou a atenção por não tê-las utilizado. Trata-se do livro Vida Peregrina, de Mariana Kalil, o qual foi vendido pela Amazon e analisado no aplicativo Kindle no iPad, apresentando, em seu final, uma foto da autora, que poderia ser colorida – como é a capa – mas que se apresentou em tons de cinza (Figura 48). Acredita-se que, provavelmente, ele deve ter sido pensado prioritariamente para ser lido no e-reader (que não possui cores no visor) e talvez por isso o seu interior tenha sido mantido em preto e branco, sobressaindo-se pelo uso da cor apenas na capa. 181 Figura 48 - Vida Peregrina Capa, entrada de capítulo e página sobre a autora. Fonte: a autora A utilização do som foi percebida em menos da metade dos livros (45%), sendo que alguns destes possuíam mais de uma, entre as três possibilidades de sons apontadas na categoria (32%). Notou-se que, em alguns casos, os recursos vinculados a esse item podiam funcionar em conjunto ou separadamente, de acordo com a escolha do leitor. Dentro do quesito ‘outro’, foram apontados os seguintes recursos: histórias com mais de uma versão (cada um dos diferentes personagens contava a sua versão da mesma história137·, havendo a opção de ouvir a história de forma cantada138), possibilidade de o leitor gravar sua própria versão da história e ouvi-la posteriormente139, atividades com realidade aumentada140, possibilidade de aquisição de um bicho de pelúcia específico que vem programado para interagir com a história do tablet141, diferentes conteúdos associados a pontos do mapa142; formas de seleção de texto aleatória143, inserção do leitor na história como se ele fosse um personagem144 e formas bem variadas de abordagens de interatividade para cada texto da coletânea145. A quantidade de utilização de cada recurso multimidiático pode ser visto, através das porcentagens, no Gráfico 2. 137 Utilizado no livro A Princesa e o sapo. 138Utilizado no livro A borboleta e o caçador. 139Utilizados nos livros A Princesa e o sapo, Toy Story e The four season. 140Utilizado no livro Homem-aranha. 141 Utilizado no livro Scooby-Doo who are you?. 142Utilizado no livro Would you stay?, lido no aplicativo TED Books. 143 Utilizados nos livros 18:30 e Dois palitos. 144Utilizado no livro Um estudo em vermelho. 145Utilizado no livro ELO - The Electronic Literature Collection Volume Two. 182 Gráfico 2 - Recursos multimídia utilizados nos livros analisados As categorias não são mutuamente excludentes. Fonte: a autora. Ainda dentro das Potencialidades do meio digital pode-se constatar que o digital possibilita que todos os leitores de uma mesma unidade façam anotações e marcações, sem que estas fiquem fixadas ao livro permanentemente ou, ainda, que causem algum dano à sua conservação. Através das camadas de informações, muitas vezes é possível ao leitor escolher se ele deseja ver apenas as suas notas, ou, inclusive, as de outros leitores, sendo-lhe facilitado também discutir com outras pessoas através dos comentários dos textos. Apesar de essa flexibilidade ser uma possibilidade latente do meio digital, ainda não é totalmente explorada. Vale salientar que praticamente a metade dos livros digitais estudados se comporta fechado em si mesmo – tal qual o impresso – permitindo marcar páginas (57%), grifar e adicionar comentários (49%), mas poucos exploram a interação entre os leitores. O compartilhamento de trechos com outros leitores foi permitidopor 43% dos livros abarcados nesta pesquisa, mas esse compartilhamento muitas vezes se realizava por ‘fora’ do livro acessado, por intermédio de e-mail ou pelos serviços de redes sociais. A possibilidade de ver destaques ou comentários de outros leitores só esteve presente no Kindle (aparelho e aplicativo), no aplicativo Kobo e no site de leitura SocialBook, os quais correspondem a 28% dos livros analisados. No Kindle os usuários apareciam anonimamente, sendo possível ver um trecho destacado e informar-se sobre a quantidade de pessoas que grifaram aquela parte; no Kobo, um 183 dos livros analisados possuía comentários de leitores identificados, onde um respondia ao outro; e no SocialBook existe a possibilidade de leitura simultânea com um grupo de pessoas e discussão do livro, através das ferramentas de comentários e destaques. 7.5. APROXIMAÇÃO DA IDEIA DE LIVRO IMPRESSO (REMEDIAÇÃO) Na questão da Aproximação da ideia de livro impresso (Remediação), de um modo geral a maioria se aproximou da ideia tradicional deste, notando-se que 94% deram ênfase no texto escrito e 91% possuíam a navegação linear. A representação da página de papel do livro impresso dentro do digital apareceu menos que o esperado, observando-se que 43% utilizaram esse recurso para apresentar seu conteúdo, sendo que nos softwares de leitura era oferecido mais de um modo de transição de página, entre os quais apenas um deles representava uma folha de papel. A estrutura do livro foi repetida em 54% dos livros analisados (Gráfico 3). Dos artefatos que não foram considerados nesse quesito, muitos apresentavam apenas a capa e, logo em seguida, o texto principal, sem folha de rosto, sumário e/ou página de créditos. Gráfico 3 - Aproximação da ideia de livro impresso (Remediação) Fonte: a autora. Dentro do Projeto gráfico de interface, o nível de respostas afirmativas também foi alto: 91% apresentou qualidade na execução do livro; 90% possuíam miniatura ou um ícone coerente com o layout da capa do livro, salientando-se que, 184 dentre os que não possuíam, provinham de arquivos em PDF (e neste caso só aparecia o símbolo padrão do arquivo) ou eram provenientes de sites (que por sua natureza não tem miniatura); 91% tinham capa com título, autor, editora/empresa e imagem; 95% traziam uma aplicação consistente de estilos e espaçamentos para os títulos, texto e outros tipos de informações; 93% possuíam um projeto específico para o meio digital; 79% tinham fonte original da editora e, dos 45% que possibilitavam customização da aparência do livro, 43% o faziam sem perda de informações visuais (Gráfico 4). Gráfico 4 - Projeto gráfico de interface Fonte: a autora. Outro detalhe que foi observado, mas que não estava previsto na análise, é que muitos livros digitais acessados nos softwares readers, pulavam os elementos pré-textuais existentes, conduzindo o leitor diretamente para a parte textual. O acesso a essas primeiras páginas podia ser feito após a abertura do livro, retrocedendo no conteúdo. Desse modo, a função de ambientação do leitor, na tradição do impresso traduzida pelo projeto gráfico das páginas pré-textuais, foi negligenciada em alguns livros digitais. 7.6. OS LIVROS PRETO E BRANCO NO E-READER Os 16 livros analisados no aparelho Kindle Paperwhite apresentaram exploração de recursos distintos, frente aos demais livros digitais analisados. Essa diferença ocorreu justamente em função das peculiaridades desse hardware. Todos os livros 185 foram apresentados em preto e branco, com exceção de 2146, que fizeram uso de tons de cinza, tanto nas imagens como no texto. Nenhum deles explorou imagens animadas, sons ou vídeos, já que o aparelho não foi feito para reproduzir essas linguagens. Todos os livros que detinham imagens em seu interior possibilitavam a ampliação das mesmas, sendo que em apenas um147 deles, a ênfase dada ao texto tinha a mesma importância que a ênfase na imagem; nos demais o elemento de destaque era somente no texto. Todos apresentaram funcionalidades semelhantes aos livros impressos e comuns aos softwares específicos para leitura, como o avanço do texto, a possibilidade de marcar páginas, grifar e comentar. Os livros analisados possuíam todas as funcionalidades relacionadas à atividade de leitura características do meio digital, como a busca por palavras e trechos específicos, a consulta da definição de algum termo e a marcação automática do andamento da leitura quando o livro é fechado. O Kindle oferece dicionários de diferentes idiomas que podem ser baixados pelo usuário com o sinal wi-fi ou 3G, dependendo do modelo do aparelho, e, após esse download, todas as consultas podem ser feitas off-line. Alguns livros apresentaram links para a web, que podiam ser acessados no próprio Kindle, o qual oferece um navegador experimental. Dos livros analisados nenhum tinha narrativa hipertextual, mas alguns tinham hipertexto. O kindle disponibiliza o sumário através de um atalho no menu, sendo que todos os sumários acessados pelo menu eram hipertextuais. O Kindle oferece seis tipos de tipografias diferentes para o leitor escolher. Dos livros analisados, 2 não permitiam a troca de fonte: o PDF148, que não é customizável; e o livro de domínio público Lendas do Sul, que só oferecia uma fonte como opção, mas permitia que as outras configurações padrão fossem alteradas (tamanho da fonte, margem e espaçamento entrelinhas). Dos 16 livros, 6 traziam incorporada a fonte do editor, além das opções padrão. Três arquivos poderiam ter sido confeccionados com mais qualidade. No livro O que é Espiritismo, por exemplo, existiam espaços em branco sem razão aparente, ao longo do texto. Provavelmente ele deve ter sido originado de um livro impresso, que simplesmente foi passado para PDF, ficando as margens superiores e 146 Os haicais do menino maluquinho; Histórias para lembrar dormindo. 147 Os haicais do menino maluquinho. 148 How to be creative. 186 inferiores da borda do papel incorporadas no arquivo MOBI como espaços em branco ao longo do texto. Todos os livros possuíam miniatura condizente com a capa do livro, menos o arquivo PDF, que trazia o símbolo do tipo de arquivo com o nome deste logo abaixo. O formato PDF normalmente possui uma diagramação mais adequada para ser vista em telas maiores. O Kindle Paperwhite possui tela de apenas seis polegadas. Por ser um aparelho menor, como também é o caso do smartphone, a navegação do PDF não fica muito confortável. A tela e-Ink apresenta alguns desconfortos ao usuário, posto que, a cada vez que o arquivo é arrastado, há a necessidade de recarregá-lo para ser possível sua visualização na tela. Além disso, é necessário diminuir o zoom para avançar a página, de modo a ajustá-la ao tamanho da tela, o que se faz necessário para acessar o próximo conteúdo. Essas características do e-reader dificultam a leitura desse tipo de arquivo, mas o que ainda assim o torna interessante, é que ele possibilita abrir esse tipo de arquivo, mesmo que seja como portador. Na questão da remediação do livro e da imitação das suas características, pode-se apontar as propriedades físicas da tela como uma imitação do papel e o próprio nome da tecnologia – tinta/papel eletrônica (o) – traz essa alusão claramente. A não emissão de luz para a construção da imagem neste aparelho, realmente causa a sensação de se estar vendo o texto como se o mesmo estivesse impresso em papel. Contudo, com relação às proporções físicas deste aparelho, não há semelhanças com o livro, posto que é menor, mais fino e mais leve do que a maioria deles, o que acarreta vantagens sobre o similar impresso principalmente em situações de leituras longas e livros volumosos, pois apresenta fácil mobilidade e leveza. O avanço do conteúdo não simula o folhear de uma página, ficandoa tela preta antes do aparecimento do próximo texto. O andamento da leitura pode ser percebido através da marcação do ‘tempo de leitura restante’ (que é baseado naquele que foi gasto para chegar até ali); da exibição da porcentagem que marca quanto falta para o término da obra; ou, ainda, da posição (não é utilizado o termo página, a menos que tenha uma relação com a edição impressa do livro) em que o usuário se encontra dentro da totalidade do livro. No entanto, existem também semelhanças com o livro impresso em outros itens: a estrutura do conteúdo usualmente segue as mesmas normas daquele e também é mantido o foco tanto texto escrito. 187 7.7. OS SOFTWARES ESPECÍFICOS PARA LEITURA Mais da metade (54%) dos livros analisados foi acessada através de aplicativos ou softwares específicos para leitura, sendo que neste grupo estão incluídos os e-books analisados no e-reader149 (14), no tablet (26) e no notebook (2150). Observou-se que quase todos apresentam funcionalidades muito semelhantes, com exceção do iBooks, que é o único que se diferencia mais dos outros. Neste grupo, todos os livros foram lidos off-line e praticamente a sua totalidade possui as mesmas funcionalidades do similar impresso, com relação à leitura, tendo sido acrescidas algumas ações que não poderiam ser realizadas no papel, como pode ser visto no Gráfico 5: Gráfico 5- Ações focadas na leitura disponibilizadas no software reader Fonte: a autora. Apenas 25% desses livros tinha algum tipo de material extra, como indicação de sites, vídeos etc. A maioria das obras utilizava hipertexto (91%) e permitia a customização da configuração visual do livro (73%). Em todas se percebia a presença do texto, em metade delas fez-se uso de cores em seu interior (em imagens e/ou texto) e em 52% foram detectadas apenas imagens estáticas. Mais da 149 Comentado no tópico anterior. 150 Esses dois livros foram avaliados no navegador, mas poderiam ter sido baixados para um software específico de leitura tanto no computador, como no tablet ou smartphone. 188 metade dos volumes (68%) permitia o compartilhamento de trechos da história com outros leitores e 48% deixava o usuário ver os destaques feitos por eles. Existem diferentes softwares específicos para leitura de livros digitais. Dentro deste trabalho foram analisados livros a partir dos aplicativos: Kindle, Bluefire Reader, kobo Livraria Cultura, Adobe Reader e iBooks. As particularidades desses programas foram comentadas na seção 6.2 Softwares de livros digitais. Dentro do grupo de livros acessados em softwares específicos para leitura, os que eram comercializados exclusivamente no iBooks foram os únicos que exploravam recursos multimidiáticos que iam além do texto e da imagem estática, como imagem em movimento (14%), trilha sonora (7%), som em momentos específicos (11%) e narração (11%). Também eram específicos para esse aplicativo os 5% que vinham com alguma atividade lúdica ou de aprendizagem e os 16% que requisitavam a ação do leitor para acionar alguma multimídia. Esse tipo de livro que explora esses outros recursos provavelmente é um EPUB com layout fixo, tal como o PDF, não permite a customização (27%) do modo de visualização e da tipografia. Ficou claro que os livros acessados através do iBooks de fato estavam mais direcionados para a leitura e compunham um grupo mais interativo e multimídia, como pode ser visto no Gráfico 6, que é relacionado à exploração dos recursos de Interatividade e Multimídia, onde nota-se que o iBooks apresenta características intermediárias entre os outros grupos. 189 Gráfico 6– Utilização de recursos de interatividade e multimídia nos grupos analisados Fonte: a autora. 7.8. LIVROS APLICATIVOS: PARA VER, OUVIR E TOCAR Enquanto os aplicativos específicos para leitura utilizavam o meio digital para repetir e otimizar as mesmas ações realizadas no papel (desde grifos e destaques até a busca de palavras e seus significados), os livros aplicativos costumavam ter uma abordagem mais ampla, explorando outras maneiras de contar uma história e de interagir com seu conteúdo. A maioria dos livros encontrados nesse formato trouxe uma proposta mais lúdica e infantil. Dos 26 livros aplicativos analisados, 65% se destinam ao público infantil, 19% ao infanto-juvenil e 16% podem ser considerados para um público adulto. Apesar da questão do gênero de leitura não fazer parte dos objetivos propostos para análise neste momento e, consequentemente, não ter sido trabalhado conceitualmente, neste item ele ficou muito evidente, acreditando-se ser 190 relevante apontá-lo, para, talvez, processar-se uma abordagem mais aprofundada e específica em trabalhos futuros. Dos livros aplicativos infantis e infanto-juvenis, a única funcionalidade encontrada semelhante a do livro impresso foi o avanço das páginas. Menos da metade deles (38%) marcava onde o local da leitura era interrompida para ser reiniciada na próxima vez em que o aplicativo fosse aberto. Em nenhum deles foi possível grifar palavras, adicionar comentários, buscar por alguma palavra específica ou ampliar uma imagem etc.. Apenas um151 deles oferecia a opção de consulta ao significado das palavras, embutido no livro e, assim mesmo, eram apenas algumas palavras, previamente selecionadas, que podiam ser consultadas. O mesmo permitia ao leitor escolher entre 4 tipografias para customizar. A exploração desses recursos nos livros aplicativos pode ser vista no Gráfico 7. Gráfico 7 – Livros aplicativos: ações focadas na leitura. Fonte: a autora. Em compensação, a grande maioria dispunha de diversas linguagens multimidiáticas e diferentes atividades lúdicas e/ou de aprendizagem dentro da história ou independentes desta, que incluía o tocar na tela, movimentar o aparelho, falar ou assoprar (Gráfico 6). Nem todos possuíam sumário e, os que tinham, eram organizados com as miniaturas das páginas. O livro da editora Manati Produções Editoriais, A princesa e o sapo, não apresentava texto, apenas narração da história, possuindo uma versão contada pela princesa e outra contada pelo sapo e convidava 151Ali Baba e os 40 ladrões. 191 o leitor a criar e gravar sua própria versão ao olhar às imagens (Figura 49). A opção de manter o texto ou ocultá-lo concomitante à narração e exibição das cenas apareceu em mais de um aplicativo. Figura 49 - A Princesa e o Sapo A primeira imagem mostra página de entrada, com as opções para escolher a narração. A segunda é a apresentação da proposta do livro e da autora, a terceira é uma cena da história e a quarta é a simulação da página sendo folheada. Fonte: a autora. Os 4 livros considerados adultos apresentavam diferentes explorações do meio digital. O Color Uncovered (que fala sobre cores) trazia um exercício lúdico em cada página e curiosidades para compreender melhor cada fenômeno relacionado à cor; o Oxford Bookworms Library App & Level test (que funciona como uma biblioteca de livros em inglês) oferecia um questionário de inglês, para saber quais livros seriam indicados para contemplar o nível de conhecimento que o leitor detinha sobre o idioma; o Guia politicamente incorreto da história do Brasil foi a obra que teve mais semelhanças com os livros lidos em softwares de leitura, sendo que o diferencial de seu aplicativo é a possibilidade de ser narrado; e o TED Books (que funciona como biblioteca para os livros editados pelo TED) trazia diversos recursos multimidiáticos em uma segunda camada de informação que só podiam ser acessados por meio desse aplicativo. Ressalta-se que o mesmo livro acessado através do Kindle, por exemplo, traria apenas o conteúdo textual e algumas imagens. 192 Quase metade dos livros aplicativos (46%) imitavam a aparência do livro impresso,outras formas de interatividade a serem ativadas pelo leitor, que podem ser realizadas com os elementos do livro (através de hipertextos, animações, vídeos etc.), recursos esses que são programados para responder à ação do usuário. Ao se explorar as potencialidades do meio digital, podem ser repetidas as convenções já estabelecidas na cultura impressa, produzir-se uma reconfiguração do livro que não o descaracterize, mesmo que utilizando novos recursos permitidos pelo suporte digital ou, ainda, criar-se um modelo totalmente inusitado de transmissão de conhecimento, configurando um artefato que já não seria mais considerado um livro. Neste momento de implantação de novas tecnologias e exploração de suas potencialidades, é relevante saber quais desses caminhos estão 17 sendo tomados pelas produções editoriais. Frente a essas possibilidades, através desta pesquisa visa-se responder a pergunta: Quais são os diferentes recursos que estão sendo utilizados nas publicações chamadas de livro digital e como eles as caracterizam? Para responder a essa questão, a pesquisa orientou-se pelo objetivo de mapear os artefatos que são atualmente chamados de 'livros digitais', caracterizando-os a partir do cruzamento das principais especificidades dos livros impressos com aquelas relacionadas aos recursos próprios do meio digital. Para tanto, foi necessário: a) Identificar as características historicamente associadas à noção de 'livro'; b) Identificar os recursos que vêm sendo explorados nas produções que estão sendo chamadas de livros digitais; c) Registrar a diversidade das configurações dos artefatos atualmente identificados como livros digitais e d) Identificar possíveis padrões entre os diferentes tipos de livros digitais, através das suas características predominantes. A seguir, ainda nesta primeira parte, a pesquisa será contextualizada. O percurso de pesquisa partiu do livro em papel, percorrendo as potencialidades do meio digital e chegando aos artefatos chamados de livros digitais. Vale dizer que esse trajeto não se dá de forma linear. Da mesma forma que o e-book traz à tona uma nova reflexão sobre o livro impresso, as práticas editoriais associadas ao impresso também estabelecem relação com o meio digital. Por existir esse entrelaçamento entre esses dois suportes, a relação entre eles será uma constante nesta dissertação, sendo deixada à margem apenas em alguns momentos. Assim, vale destacar a estrutura dos capítulos que compõem este trabalho. O próximo capítulo descreve a metodologia e os procedimentos da análise, onde estão descritos os critérios observados na amostra, assim como as tomadas de decisões realizadas durante essa etapa do processo. Em seguida, o capítulo 3, aborda principalmente o livro impresso, trazendo à tona sua materialidade e história, abrangendo desde sua produção no rolo até a inserção da tecnologia digital. O início desse capítulo discorre sobre a forma com que a materialidade apresentada influencia na leitura, conduzindo o leitor a 18 compreender o sentido do texto juntamente com as palavras do autor. A segunda seção discute as características do livro que são inerentes à sua configuração física, mostrando como essas especificidades do suporte interferem na noção de livro construída. A terceira seção resgata a história do livro, mostrando as modificações sofridas ao longo dos séculos até chegar à configuração atual. A última parte deste capítulo mostra a inserção da tecnologia digital, focando principalmente no livro digital. Nesse momento é tratada a estratégia de remediação5 do livro em papel no aparelho móvel, trazendo o caso da Apple, com o lançamento do iPad e do seu software de leitura iBooks, que ilustra esse processo. O capítulo 4 traz uma revisão teórica sobre as definições de livro. A primeira seção faz uma revisão teórica sobre o design editorial, buscando perceber como a configuração visual interfere na identificação do artefato. Nessa seção ponderou-se também sobre de que maneira alguns elementos característicos do impresso poderiam ser repensados para sua remediação para o meio digital. Na segunda seção foram pesquisadas instituições e autoridades que publicaram uma definição sobre livro, avaliando as características e os critérios utilizados por cada uma delas para chegar ao conceito obtido. Na terceira seção, são trazidas as definições e características salientadas por autores que discorrem sobre o livro impresso e o digital, ponderando-se sobre o que cada um desses autores identifica como sendo elementos que distinguem o livro das demais publicações. No final desta seção se propõe uma série de parâmetros que podem ser utilizados para possibilitar uma definição própria de livro. Até esse momento do trabalho, o estudo versou sobre experiências e autores que buscam uma aproximação entre o meio digital e o impresso. A partir do capítulo 5, foi realizado um movimento inverso, em que começaram a ser apresentadas as potencialidades desse novo meio e como elas podem ser exploradas, diferenciando-se, então, da produção impressa. O primeiro passo desse distanciamento a ser abordado foi o hipertexto, que apesar de ser um elemento presente também nos livros impressos, tem sua utilização otimizada no meio digital. Sendo assim, o capítulo 5 inicia com a história do hipertexto na primeira seção, e explora suas possibilidades narrativas na 5 Remediação (Remediation) é um conceito criado por Bolter e Grusin (2000) que fala da lógica formal existente quando uma mídia é incorporada ou representada em uma nova mídia. 19 segunda seção, sendo esta última dividida em duas partes. Na primeira foram discutidos os diferentes caminhos que cada leitura pode tomar a partir da utilização dos hipertextos, gerando no leitor a sensação de maior autonomia sobre o conteúdo. Na segunda foram comentadas novas formas de apresentar o conteúdo ao leitor, diferentes da simples utilização do sumário. Por último, na terceira seção deste capítulo, foram exibidas iniciativas de exploração do texto no meio digital, cuja proposta é justamente a diferenciação do meio impresso, utilizando recursos que não poderiam ser empregados no papel sem a perda significativa de qualidade e sentido. O capítulo 6 trata especificamente sobre o livro digital e sua materialidade. Por ainda não existir um padrão de configuração para os livros digitais, os leitores podem utilizar diferentes aparelhos e softwares para acessar diversos tipos de arquivos. Cada um desses três fatores – hardware, software e conteúdo – interfere de modo diferente nos recursos que podem ser utilizados e na formatação final que o livro digital irá assumir. Portanto, para uma melhor compreensão, cada um desses elementos será abordado em uma seção. No final do capítulo 6, ainda são apresentadas algumas iniciativas de regulamentação do livro digital. O último capítulo foi dedicado ao mapeamento dos artefatos que atualmente estão sendo chamados de livros digitais. Primeiramente são comentadas as observações gerais sobre os e-books analisados, e, posteriormente, são apresentados os grupos que foram identificados com características em comum. E, ainda, foi realizada uma discussão sobre as principais características percebidas nos livros digitais analisados no mapeamento, propondo-se uma nomenclatura para identificar os tipos de livros digitais a partir dos recursos que são utilizados nos mesmos. Também, frente o resultado da análise, se chegou à conclusão da proposta de definição de livro, que engloba o meio digital dentro das possibilidades do mesmo. Na conclusão, foram retomados os principais pontos abordados no decorrer da dissertação. Antes de proceder ao trabalho propriamente dito é preciso demarcar algumas indicações. Registra-se a preferência pela utilização do termo ‘livroprincipalmente para avançar o conteúdo. No entanto, muitas vezes havia um ícone que devia ser acionado por um toque para ir para a próxima página ou voltar para a anterior, ou seja, a página aparece sendo folheada, mas o movimento que o leitor precisa fazer não imitava o que é feito no papel. A estrutura do livro só foi identificada em 27% dos artefatos. Muitos deles possuíam um menu e uma página de entrada com atalho para acessar às principais configurações e para dar início à sua leitura. Alguns livros chamaram a atenção por fazerem remediação de outro contexto, sendo que um deles - o Little Red Riding Hood trouxe elementos de uma peça de teatro. Dessa forma, as trocas de página foram visualizadas como se fossem o descer e subir da cortina de um palco (Figura 50), em cada cena os personagens se mexiam em um ‘cenário’ e, no final do livro, agradeciam e ouviam os aplausos do público. Figura 50 - Little Red Riding Hood Telas capturadas do aplicativo. Fonte: a autora. Já o Color Uncovered (Figura 51) ocasionou uma dúvida relacionada à identificação de sua categoria editorial, visto que, analisando-o, não se chegou à 193 conclusão se este poderia ser classificado como um livro ou se seria uma revista digital, em função de sua apresentação a seguir descrita. Sua navegação era ora horizontal, ora vertical; cada texto era primeiramente apresentado com um título, uma chamada e uma imagem, para depois o leitor se aprofundar no conteúdo com o material textual; a primeira página parecia o editorial de uma revista, com o texto em uma coluna e o índice na coluna do lado (a orientação vertical do iPad colabora com essa impressão), mas no próprio ‘editorial’ ele se apresentava como livro interativo (interactive book). Figura 51 – Color Uncovered Telas capturadas do aplicativo: capa, sumário/apresentação, título de um conteúdo e o conteúdo propriamente dito. Fonte: a autora. O livro The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore (Figura 9, Figura 52) estava em um limite muito próximo ao da animação, pois oferecia constantemente diferentes estímulos ao leitor. O livro se fazia acompanhar de uma trilha sonora que se modificava de acordo com o desenrolar da história, corroborando em prol de o leitor se deixar envolver pela narrativa. De acordo com a cena também foram utilizados sons em momentos específicos, dando maior veracidade aos movimentos e cada página era totalmente animada. Quase todos os recursos oferecidos podiam ser ativados ou desativados pelo leitor de forma independente, gerando a possibilidade de este selecionar se a história seria lida por um narrador, se o texto na base da tela iria ou não aparecer, se a trilha sonora seria ouvida... Este e-book surgiu a partir de uma animação premiada cuja história falava de livros. O vídeo com a animação estava disponível nos materiais-extras do livro aplicativo, tornando possível a comparação entre as duas propostas. Vale salientar que na animação inexistia texto, apenas a trilha sonora. Ali muitas imagens foram aproveitadas, mas apesar de contarem a mesma história, ficaram perceptíveis as 194 diferenças de formatação de uma para a outra. O livro trouxe um texto que poderia ser lido e/ou ouvido, as passagens da história foram organizadas em cenas que avançavam ou retrocediam, tudo isso disponível a escolha do leitor, e, ainda, ao longo do livro, existiam elementos lúdicos interativos, contextualizados pela cena em que estavam inseridos. Figura 52 - The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore Telas capturadas do aplicativo, na primeira o início da história; na segunda, cena com indicação de interatividade; na terceira, é exibido como material-extra a animação que deu origem ao livro digital. Fonte: a autora. Dois livros se destacaram por terem recursos multimidiáticos e interativos e manterem um foco muito claro na leitura: Quem soltou o pum? (Figura 53) e Dragoberto (Figura 54). O primeiro traz imagens estáticas que podem ser tocadas e desencadear alguma ação de movimentação na cena e o respectivo som e o segundo possui todas as imagens animadas, sonoras e interativas, mas, no momento em que o texto aparece, não é mais possível interagir com nenhum outro elemento, ficando a imagem em plano de fundo, mais escura, e o texto, em primeiro plano, na cor branca. Em ambos os livros é possível ouvir a história com narração automática, mas em nenhum dos casos é possível ocultar o texto. 195 Figura 53 - Quem soltou o pum? Telas capturadas da página inicial e de uma página interna. Fonte: a autora. Figura 54 - Dragoberto Telas capturadas da página inicial e de uma página com texto em destaque para leitura. Fonte: a autora. De modo geral se percebe que os livros aplicativos exploram algum recurso a mais além daqueles oferecidos nos aplicativos de leitura. O material152 que mais se aproximava destes oferecia, como diferencial, a possibilidade de o leitor ouvir o livro ao invés de lê-lo. Além da exploração do som, dos elementos interativos e das atividades lúdicas e/ou de aprendizagem acopladas à história principal, as opções oferecidas pelo livro aplicativo parecem ser vantajosas para o produtor que quer manter o leitor mais tempo se relacionando com os seus personagens e seus materiais (pensando nos casos dos livros que tem atividades extras). Algumas dessas funcionalidades poderiam ser exploradas no iBooks, mas isso restringiria o público consumidor a ser usuário da Apple. Mesmo que o aplicativo também exija uma etapa de serviço voltado à adaptação para os diferentes sistemas e 152Guia politicamente incorreto da história do Brasil http://clk.tradedoubler.com/click?p=214843&a=2196599&url=https://itunes.apple.com/br/app/dragoberto/id596400037?mt=8&uo=4&partnerId=2003http://clk.tradedoubler.com/click?p=214843&a=2196599&url=https://itunes.apple.com/br/app/dragoberto/id596400037?mt=8&uo=4&partnerId=2003�196 configurações dos aparelhos, esse processo de adaptar o aplicativo de um sistema para outro parece ser mais simples do que a construção de um aplicativo para o sistema Android e a adaptação do mesmo para o iBooks, contemplando os usuários do IOS. 7.9. OS LIVROS ONLINE NO NOTEBOOK Nas análises feitas no notebook, optou-se por abranger mais livros disponibilizados para leitura online, mas se deve deixar claro que também é possível instalar softwares readers em computadores de mesa e notebooks, tanto para ler os arquivos PDF bem como os MOBI, EPUB etc. A opção por se selecionar livros online neste aparelho, apoia-se no objetivo de abranger um espectro maior de tipos de livros, tendo em vista que os softwares específicos para leitura apresentam recursos semelhantes e não trariam novidades para a análise geral. Dos 14 livros analisados no notebook, 6 podiam ser baixados e era indicada, inclusive, a forma de download, e 1 possuía partes que obrigatoriamente deveriam ser baixadas pelo leitor para o seu computador. Nas funções semelhantes ao livro impresso, 3153 não tinham uma forma de avanço de leitura claro. Os conteúdos eram independentes e acessados através de uma interface própria. Após a leitura de cada um, abria-se outro link para leitura, que não caracterizava necessariamente avanço no texto. A maioria (10) não permitia grifar trechos ou adicionar comentários, desse grupo, apenas 1 admitia marcar páginas. Entretanto, o exemplar154 que permitia essa adição de marcadores, possuía essa função com a finalidade exclusiva de os leitores salvarem, se assim o desejassem, o PDF do arquivo ou imprimir as páginas por eles marcadas (selecionadas). Ao fechar o arquivo, notou-se que, em uma nova abertura do arquivo, estas não estariam salvas. Nos casos em que estas marcações de páginas eram permitidas, o livro estaria sendo lido off-line ou através de um login, e assim as informaçõesdigital’ para se referir ao mesmo, mas também é utilizado como sinônimo os termos ‘livro eletrônico’ e ‘e-book’. No final do trabalho consta um glossário com a finalidade de 20 auxiliar aos leitores a compreender o significado dos termos utilizados ao longo da dissertação. 1.1. PROPOSTA E CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA Este estudo retrata o momento em que o livro digital está começando a se consolidar através dos dispositivos móveis, dentro do universo que chega ao território nacional. Observa-se que o marco inicial da história do e-book remonta à década de 1970, com o Projeto Gutenberg (HART, 2010) e o Dynabook de Alan Kay (KAY, 1972), mas foi apenas depois da virada do milênio que ele se tornou realidade para muitas pessoas. Costa (R., 2012) analisou os artigos publicados no GP de Produção Editorial da Intercom que eram relacionados ao livro digital, no período compreendido entre 2000 e 2011. Os períodos de publicações que versam sobre este parecem coincidir com a divulgação de seus aparelhos de leitura. O primeiro aparelho comercializado foi o e-reader6 Rocket eBook, em 1998, e até 2004 o tema figurou nos artigos do Intercom. Depois desse primeiro lançamento na área, surgiram outros, similares, nesse período; no entanto, não fizeram muito sucesso, vindo este assunto a ressurgir com força somente após o lançamento do e-reader Kindle, em 2007, e do tablet iPad, em 2010. No Intercom o assunto reapareceu em 2009, sendo que o ano que teve mais publicações sobre o tema foi o de 2010 (quando foram apresentados quatro artigos relacionados ao livro digital). Percebe-se que a concretização desse fenômeno, no cenário contemporâneo, foi potencializada por duas marcas de grande porte que possuíam abrangência internacional, a Amazon e a Apple, ambas responsáveis, respectivamente, pelos dois aparelhos acima mencionados, os quais tomaram a frente na divulgação e comercialização desse segmento7. O hardware do novo display do livro digital também ganhou destaque nas reportagens sobre o assunto. A maioria das matérias dava enfoque ao aparelho que permitia acesso ao conteúdo, notando-se que em alguns casos a ênfase era tão 6 E-reader é um aparelho portátil criado especificamente para a leitura de livros digitais. Normalmente sua tela possui tecnologia eInk, a qual não emite luz. 7 “A venda de tablets cresceu 164% no primeiro trimestre desse ano, na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo informações da consultoria IDC, citadas no jornal O Estado de S. Paulo” (TERRA, 2013). A venda de livros digitais em dezembro de 2012 teve um aumento de mais 100% sobre as vendas de 2011 na maioria das editoras brasileiras (AGENCIA, 2013). 21 grande que a reportagem era situada dentro da seção de tecnologia (RIBEIRO, 2011). No início muitos autores se referiam ao aparelho8 utilizando o termo e-book (COSTA, R., 2012; ORMES, 2001; RIBEIRO, 2009) e o empregavam ora para falar do equipamento e ora para se referir ao conteúdo. Isto provavelmente se deve ao fato de que o conteúdo do livro sempre esteve historicamente associado à sua materialidade. Outro aspecto a ser considerado é que, por muito tempo, a leitura digital esteve associada à experiência de ler em um computador de mesa, o que gerava uma expectativa de desconforto durante a mesma, principalmente quando o texto era longo. A união das tecnologias móveis com o livro digital veio adicionar a mesma mobilidade que o papel oferecia e parece ter sido um diferencial para uma maior aceitação desse artefato. Entre as características das tecnologias móveis que tiveram impacto sobre os livros digitais estão, por exemplo, a portabilidade, ou seja, a possibilidade de acesso em diferentes aparelhos. Com isso se tornou possível iniciar a leitura de um livro digital no tablet (deitado na cama), continuá-la no celular (durante o período de espera no consultório do dentista) e finalizá-la no notebook (na sala, no quarto ou no escritório). Essa portabilidade acarretou novas relações com o usuário, tanto com relação à obra como também com o objeto que subsidia o acesso à mesma, já que cada aparelho possui diferenciação de tamanho e proporção. Outra característica que afeta diretamente o livro, quando acessado no suporte digital, é a abertura de possibilidades de customização oferecidas cada vez mais por softwares de leitura, que permitem fazer ajustes de fonte, cores, margens, entre outras coisas, agregando um importante diferencial do similar impresso, onde esses ajustes são pré-definidos e fixos, sem dar ao usuário possibilidades de seleção. Outro item a ser considerado seria a intertextualidade que, mesmo estando presente no ato de leitura de qualquer material, tornou-se mais acessível e fácil no âmbito digital, já que o usuário pode ativar as ferramentas de busca online e de hiperlinks. O computador ainda oferece uma experiência multimidiática através da convergência de linguagens: imagéticas, sonoras, textuais, estáticas ou em 8 Hoje utilizam o termo e-reader para referir-se ao aparelho; e, e-book, livro digital ou livro eletrônico para se referir ao arquivo. 22 movimento (FRAGOSO, 2006), que devem ser levadas em consideração ao se pensar no livro digital. Nesse curto período de quinze anos, em que se começou a discutir o livro digital, muitas coisas já mudaram. Em 2001, Ormes observou que e-book era um termo vago que caracterizaria um texto monográfico disponível eletronicamente, tendo este a possibilidade de ser tanto “um romance publicado num Web site, uma novela cujo download poderia ser realizado como um arquivo de word processing ou até um diário num extenso e-mail!” 9 (2001, online). Hoje em dia, apesar de ainda não haver uma definição clara, o ângulo de possibilidades está mais fechado e provavelmente alguns desses casos citados não estão mais nas opções consideradas como sendo um livro digital, o que indica que algumas possibilidades já foram descartadas, contudo é certo afirmar que também surgiram outras formas que não haviam sido previstas anteriormente. Atualmente um grande leque de possibilidades está aberto para ser explorado por meio do livro digital. Alguns recursos certamente irão agradar um número suficiente de pessoas ao ponto de lhes garantir continuidade por muitos anos; outros serão percebidos como um fenômeno merecedor de um novo ‘rótulo’ e haverá outros tantos que acabarão sendo esquecidos, caindo em desuso, perdendo-se em meio a tantas informações existentes na internet e não acessadas. A falta de informação sobre esses períodos iniciais da história de um novo artefato “conduz a processos de reinvenção em que esforços de experimentação criativa tornam-se etapas imprescindíveis para o encontro das mesmas soluções anteriormente descartadas” (FRAGOSO, 2002, online). Por essa razão é tão importante que o registro dessas potencialidades seja feito com rigor científico, uma vez que poderá servir como fonte para investigações futuras da área e servirá para compreender melhor o momento em que se vive atualmente na história do livro. No âmbito acadêmico10, detectou-se que desde a década de 90 existem investigações sobre o tema em estudo, sendo que as áreas11 que mais abordam o livro digital e hipertexto, no Brasil, são as de Letras/Linguística, Comunicação e Educação. As áreas de Letras e Linguística possuem a maior parte das pesquisas 9 Citação Original: An e-book could be a novel published on a Web site, a short story available to be downloaded as a word processing file or even a diary in a very long e-mail! 10 O procedimento do Estado da Arte está descrito no 2.3 Estado da Arte. 11 As outras áreas que pesquisam podem ser vistas na tabela do Apêndice A. 23 direcionadas às potencialidades domeio digital para a condução de uma nova escrita e leitura; já na Educação, muitas são relacionadas com práticas didáticas e, na Comunicação, os temas giram em torno da mudança do impresso para o digital ou estudam o hipertexto de uma maneira geral. A partir de um grupo de trabalhos encontrados (1.029), foram selecionadas 18 teses/dissertações para serem analisadas em maior profundidade. O critério utilizado para a seleção foi a abordagem a, pelo menos, um dos temas mencionados a seguir: o livro digital, a mudança do livro impresso para o digital, a história do livro e o hipertexto. Ao serem observados esses trabalhos, percebeu-se que na medida em que foram se popularizando os aparelhos que permitem, de maneira mais confortável, a leitura do livro digital, estes se tornaram mais apreciados e/ou utilizados. Essa mudança ficou clara ao comparar-se o posicionamento de Mello Jr. (2006), Salgado (2008) e Lazzari (2012), que traçaram panoramas diferentes para os possíveis futuros do livro digital, dentro do contexto sociocultural em que estavam inseridos. Com relação à definição de livro e de livro digital, alguns trabalhos mostraram aspectos interessantes para serem ponderados nesta dissertação. Os trabalhos de Gomberg (2006) e de Dadico (2011) colaboraram com uma revisão interessante sobre o livro impresso. Os trabalhos de Moraes (2012), Ludwig (2012), Conceição (2007) e Ribeiro (2009) apontaram para o fato de que o formato eletrônico ainda estava condicionado ao modelo conceitual desenvolvido no impresso. As pesquisas de Ribeiro (2009), Mathias (2011) e Alves (2012) trouxeram um panorama teórico sobre o livro digital, mas não fizeram uma pesquisa empírica com os leitores e tampouco analisaram o próprio objeto de estudo. Dentro das características dos livros digitais, foram salientadas por Mello Jr. (2006), Ludwig (2012) e Moraes (2012), a facilidade de acesso e a sua portabilidade como fatores importantes para sua adoção e maior aceitação. O hipertexto foi abordado em diversos trabalhos com diferentes profundidades. De um modo geral, foi citado como sendo uma característica própria do meio digital e, apesar de não ter sido criado para esse ambiente, foi ali que se solidificou, em função da facilidade de navegação dentro de um mesmo tema, proporcionada pela tecnologia digital. Juntamente com a proposta de não-linearidade, trouxe à tona questões sobre coautoria e autonomia do leitor, como 24 pôde ser visto em quase todos os trabalhos, destacando o de Longhi (2004), Aquino (2007) e Minchillo (2001) que trataram mais especificamente dessa questão. Neste Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da UFRGS, vários pesquisadores têm abordado o livro digital: André Moraes (2012) estudou a percepção dos livros digitais através do ponto de vista dos leitores, focando nas leituras obrigatórias dos vestibulandos da UFGRS; Danusa Oliveira (2013) investigou o setor livreiro e o posicionamento dos editores gaúchos com relação ao e-book; e Greta Lemos12 trouxe o olhar da cobertura jornalística sobre e-books nas revistas Superinteressante, Info Exame, Nova Escola, Você SA e Piauí. Dentro do panorama pesquisado, foi possível perceber a ausência de trabalhos que realizem uma identificação do que está sendo chamado de livro digital e quais seriam os principais recursos utilizados nesses artefatos. Nos trabalhos analisados de outras instituições, apenas um contemplou a análise empírica do artefato em questão, que foi o de Ludwig (2012), que recortou seu objeto de estudo dentro dos livros digitais infantis; nos outros, o registro do e-book servia mais como exemplo para elucidar outras questões que estavam sendo discutidas e não como uma parte principal da pesquisa. Portanto, vale destacar como uma justificativa para a realização deste trabalho, o registro desse momento atual onde o livro digital começa a ensaiar uma configuração mais clara de seus limites, ou quem sabe, de suas possibilidades, apesar desses contornos ainda estarem muitos borrados. 2. METODOLOGIA Para chegar aos objetivos propostos, a pesquisa foi feita com base em revisão bibliográfica e observação do objeto de estudo: os livros digitais. A pesquisa teórica permeou todas as etapas da pesquisa e foi fundamental para a identificação das características historicamente associadas à noção do livro. Para a observação dos livros digitais, foi construída uma amostra de abordagem intencional voltada para casos extremos, apropriada para “pesquisas cujos objetos têm origem recente,” 12 Greta Lemos está desenvolvendo a dissertação "Livros digitais em pauta: análise da cobertura jornalística das revistas Superinteressante, Piauí, Nova Escola, Info Exame e Você S/A", orientada por Ana Cláudia Gruszynski, apresentando seu trabalho em junho de 2014. 25 como é o caso deste objeto de estudo, tendo em vista que “esse tipo de abordagem é bastante adequado para registrar a existência de situações ou elementos até então desconhecidos” (FRAGOSO; RECUERO; AMARAL, 2012, p. 61). A observação dos livros digitais é o ponto central da pesquisa. Em função disso, o instrumento de análise foi avaliado e refeito até alcançar uma formatação considerada ideal para atender aos objetivos propostos. Os procedimentos de construção do referido instrumento, bem como as decisões que o embasam, estão descritos em 2.1 Procedimentos. Para a construção da amostra, foram selecionados livros digitais informacionalmente ricos, os quais, como explicou Patton13 (2003, p. 230 apud. FRAGOSO; RECUERO; AMARAL, 2012, p. 68), “são aqueles que permitem aprender muito sobre as questões centrais que a pesquisa tem a intenção de endereçar”. Outro elemento de seleção foi a preferência – mas não exclusividade – por obras em português, uma vez que a pesquisa está sendo feita no Brasil e o acesso é facilitado nos aparelhos comercializados aqui14. Nesse tipo de amostra emergente e intencional o número de componentes da amostra é menos importante que sua relevância para o problema enfocado, de modo que os elementos da mesma passarão a ser selecionados deliberadamente, conforme apresentem características necessárias para a observação, percepção e análise das motivações centrais da pesquisa (FRAGOSO, RECUERO; AMARAL, 2012, p. 67). O processo de amostragem foi concluído por meio de saturação, ou seja, como explicaram Fragoso, Recuero e Amaral (2012, p. 95): “Quando […] não há mais categorias emergindo ou há uma repetição naquilo que é colocado”. Além do ponto de saturação, foi estabelecido o dia 16 de dezembro de 2013 como data-limite para o fechamento da coleta, chegando-se a uma amostra final de 82 livros digitais. Através do confronto das características e potencialidades apontadas na teoria com aquelas observadas nos exemplos estudados, enumerou-se os diferentes tipos de produções que estão sendo chamadas de livros digitais e se verificou como estas se diferenciam a partir de sua materialidade e dos recursos explorados nos mesmos. 13 PATTON, Michael Q. Qualitative research & Evaluation Methods. 3ª ed. London: Sage, 2002. 14 As pesquisas realizadas no Google buscam os resultados nos sites que estão mais próximos geograficamente do buscador, através do IP do computador utilizado. A loja virtual da Apple exige um cadastro com endereço, que impede que o usuário de um país compre na loja virtual de outro. 26 A partir da revisão bibliográfica foi construído um conjunto de parâmetros que sirva para refletir o livro, visando contemplar tanto o impresso quanto o digital, desvinculando a necessidade de ser produzido em um suporte impresso. Entende-se que, no caso de um artefato como o livro digital, criar “um conceito não é homogeneizar, nem inventar um princípio totalizante, mas estabelecer um juízocrítico para compreender aspectos da realidade contemporânea no âmbito do planejamento da comunicação gráfica” (GRUSZYNSKI, 2007, p. 180). 2.1. PROCEDIMENTOS A observação foi construída em seis etapas. As duas primeiras, inspiradas na Teoria Fundamentada, foram feitas sobre a codificação aberta e a codificação axial (FRAGOSO; RECUERO; AMARAL, 2012). A escolha pela Teoria Fundamentada, nesta fase da observação, foi baseada pelo apelo empírico proposto pela mesma, cuja ideia central é que “a teoria deve emergir dos dados, a partir de sua sistemática observação, comparação, classificação e análise de similaridades e dissimilaridades” (FRAGOSO; RECUERO; AMARAL, 2012, p. 83). Contudo, este trabalho não se caracterizou como Teoria Fundamentada, tendo esta apenas inspirado as duas primeiras etapas, uma vez que ela implica em um distanciamento da teoria nesse momento da observação, o que não ocorreu nesta dissertação, que teve a pesquisa empírica e teórica realizadas simultaneamente. Durante a codificação aberta – primeira etapa – fez-se uma pesquisa exploratória para identificação, descrição e categorização dos artefatos vinculados ao livro digital. Esta foi realizada em sites e blogs especializados neste tipo de publicação, livrarias digitais que comercializam e anunciam e-books e, por fim, congressos e concursos da área. Posteriormente, numa segunda etapa, efetivou-se a codificação axial, relacionando-se as obras em categorias, observando-se suas conexões e buscando compreender o que suas características representavam para os leitores e para os agentes envolvidos na produção do livro digital. A seguir, concretizou-se a terceira etapa, que constou de uma análise preliminar de um dos livros da amostra, o Reprograme, de Luís Mendes (Apêndice C). A escolha recaiu sobre essa obra porque a mesma havia sido lançada em quatro formatos simultaneamente (impresso, PDF, MOBI, EPUB), apresentando diferenças em seus projetos gráficos, impresso e digital, cada qual atentando para as 27 especificidades de sua mídia. A identificação dessas particularidades foi realizada com base na bibliografia específica de projeto gráfico editorial e com os resultados preliminares obtidos através da codificação axial. Essas duas fontes resultaram em uma tabela de análise (Apêndice D) e constituíram a quarta etapa deste processo. A objetividade das características que foram identificadas fez com que essa tabela assumisse um formato de múltipla escolha, o que permitiu identificar os detalhes que foram analisados de forma mais clara. Procederam-se, neste momento, a três estudos-piloto com livros digitais de pré-categorias distintas, que geraram alterações nas questões de análise. A partir dos resultados obtidos na quarta etapa, fez-se uma reflexão sobre o objetivo de cada questão, percebendo-se que grande parte desse material não era condizente com o problema de pesquisa. Em função do detalhamento proposto pelos autores utilizados, ficou perceptível a existência de um aprofundamento em demasia na parte gráfica, o que não auxiliou no mapeamento proposto. Desse modo, em uma quinta etapa, houve uma reformulação do instrumento de análise (Apêndice E), dando-se, então, maior ênfase ao conhecimento sistematizado na codificação axial, sem deixar, entretanto, de considerar as bibliografias que versavam sobre design editorial e potencialidades da mídia digital. Esta nova tabela também assumiu o formato de questões múltipla escolha e igualmente sofreu alterações, com base nos três estudos-piloto realizados com livros digitais de pré-categorias diferentes. Após a avaliação desses resultados, elaborou-se a tabela final de análise (sexta etapa), que resultou de dois estudos-pilotos que antecederam à análise da amostra. Para esta tabela, inspirando-se no trabalho de Ludwig (2012), os recursos analisados foram divididos em macrocategorias, categorias e subcategorias. Estas foram definidas com base no cruzamento dos elementos da revisão teórica com as características dos livros digitais percebidas nas etapas anteriores. Os parâmetros foram organizados para obter uma resposta binária (possui/não possui) para cada item, o que tornou mais fácil a visualização das características de cada um. As macrocategorias de análise criadas foram: Identificação, Acesso, Funcionalidades, Potencialidades do meio digital, Aproximação da ideia de livro impresso (remediação) e Projeto gráfico. 28 Os primeiros itens da tabela, correspondentes a macrocategoria Identificação, destinam-se a identificar e contextualizar os e-books que foram analisados, sendo estes elementos os únicos preenchidos com texto. Para a identificação, optou-se por anotar o nome do livro, o autor e a editora (e, na ausência desta, a empresa responsável) (Tabela 1). Tabela 1 - Identificação I IDENTIFICAÇÃO Nome do livro Autor Editora/empresa Fonte: a autora. Para a contextualização da análise, foram indicados os seguintes itens: o formato15 do arquivo, o software utilizado para sua leitura, o hardware e a data da análise (Tabela 2). Essas informações foram importantes, pois como foi visto no capítulo anterior, cada uma delas interferiu de uma forma diferente na configuração do livro digital. A data de análise se fez necessária, pois os livros e softwares estão sujeitos a atualizações constantes, e a data serve para auxiliar na identificação posterior de qual versão do livro foi analisada. Tabela 2 - Identificação II IDENTIFICAÇÃO Foi analisado em: Formato Software Hardware Data da análise Fonte: a autora. O próximo item da tabela marcou a existência ou não do número ISBN ou de outro número de identificação regulamentado (Tabela 3). Julgou-se interessante 15 Nem todos os arquivos deixavam claro o tipo de formato em que eram apresentados, sendo que, nesses casos, fez-se uma estimativa de qual formato seria (em função de suas características e do software que permitia sua leitura) e incluiu-se junto ao nome um ponto de interrogação entre parênteses. 29 perceber quantos livros digitais dispunham dessa identificação, já que a UNESCO e a ABNT exigem que o conteúdo disponibilizado tenha ISBN para ser considerado livro. Outro detalhe é que desde 2005 já está sendo realizada essa identificação para as publicações digitais. A partir desse quesito se convencionou, para o preenchimento da tabela, a utilização dos números ‘0’ ou ‘1’. Para o caso de resposta positiva marcou-se ‘1’, quando não existia ou não era encontrado, foi sinalizado ‘0’. No caso da ausência do ISBN, mas constatada a presença de outro número de identificação, a resposta foi considerada positiva, sendo essa particularidade explicitada no comentário16 feito na célula da tabela. Também vale ressaltar que no preenchimento de todos os itens analisados, as categorias não são mutuamente excludentes. Tabela 3- Identificação III IDENTIFICAÇÃO ISBN Fonte: a autora. A seguir foram investigadas as formas com que os livros digitais eram acessados, dentro da macrocategoria “Acesso” (Tabela 4). A partir da divisão originada de duas interrogações que visavam responder em que software o material era lido e se o seu conteúdo era acessado online ou off-line, criaram-se as subcategorias. A primeira delas, advinda da pergunta “De que forma o conteúdo é acessado?”, foi dividida em quatro subdivisões: Software reader, Aplicativo próprio, Navegador e Outro. No caso do e-reader, onde o próprio sistema operacional é dedicado à leitura, foi marcada a primeira opção (Software reader). O aplicativo próprio foi marcado tanto quando este se tratava apenas de um livro, como também 16 No software Microsoft Excel, onde foram realizadas as análises, é possível adicionar um comentário à célula. Quando esta possui um comentário, istoé indicado através de um triângulo vermelho que aparece no canto superior direito da célula e, para acessá-lo, basta passar o mouse em cima do mesmo, que logo é visualizado o comentário. Esse recurso foi utilizado para inserir observações pessoais no momento do preenchimento da tabela, para facilitar a compreensão da análise dos dados. 30 nos casos em que abrangia uma biblioteca que disponibilizava vários livros de sua coleção. O item Navegador serviu para confirmar que o livro pode ser lido através do próprio navegador, e a opção Outro se destinou a informar que o mesmo não se enquadrou em nenhum dos casos previstos, devendo sua forma de acesso estar explicitada nos comentários. A segunda subcategoria intitulada “O conteúdo é facilitado para...” diz respeito à necessidade do uso da internet para ter acesso à obra. A palavra ‘facilitado’ foi incluída para caracterizar que no livro analisado houve uma indicação de que deveria ser feito o download do arquivo. É sabido que um usuário com maior conhecimento sobre web, mesmo sem haver uma forma explícita de baixar o arquivo, saberá fazer a cópia para seu computador de outras formas, porém neste quesito avaliou-se o livro nas mãos de um usuário menos experiente, que talvez, sem a indicação, não soubesse como proceder para ter acesso ao texto. Desse modo, nos livros que podem ser lidos tanto online quanto off-line, foram marcadas as duas opções; porém, no caso de possuírem conteúdos híbridos, ou seja, que o livro seja baixado para o hardware do leitor, mas alguns conteúdos só possam ser acessados quando conectados à rede, ou vice-versa, marcou-se a terceira opção (off-line + com conteúdos online). Tabela 4 - Acesso ACESSO De que forma o conteúdo é acessado? O conteúdo é facilitado para ... Software reader Aplicativo próprio Navegador Outro Online Off-line Off-line + online Fonte: a autora. A próxima macrocategoria abrangeu as funcionalidades do livro. Esse grupo foi dividido em três partes: Ações semelhantes às do livro impresso (Tabela 5); Ações que não podem ser realizadas no papel (Tabela 6); e Presença de atividades lúdicas ou de aprendizagem (Tabela 7). No item referente às ações semelhantes ao livro impresso, foram analisadas as possibilidades de interatividade existentes no livro digital que repetem as mesmas 31 ações que o leitor pode fazer em um livro impresso. Esta subcategoria foi composta com os elementos: “avanço da leitura” (caracteriza que o leitor pode avançar o conteúdo, seja através da rolagem, da troca de página etc.); “marcação de páginas” (é possibilitado que o mesmo adicione marcadores de página nas partes desejadas); “destaque de trechos” (é permitido grifar ou destacar trechos); “adição de comentários” (possibilita adicionar notas ou comentários). Tabela 5 - Funcionalidades I FUNCIONALIDADES Ações semelhantes às do livro impresso Avanço da leitura Marcação de páginas Destaque de trechos Adição de comentários Fonte: a autora. Dentre as ações que não podem ser realizadas no papel, mas que são possíveis de efetivar-se no meio digital, foram destacadas algumas facilidades que normalmente estão relacionadas ao ato de ler: a ferramenta de busca por palavras e trechos específicos; o dicionário embutido, que permite a consulta ao significado da palavra sem ter que sair do livro; a existência de zoom, possibilitando aumentar as imagens, tabelas, gráficos e textos e, ainda, a marcação automática, que ocorre no ato de fechar o livro, demarcando o local onde a leitura foi interrompida. Ressalva-se que ao se mencionar, na análise, a ampliação de textos, isto se refere àqueles tratados como imagem, como seria o caso do arquivo PDF, por exemplo, que mantém o layout do texto ao aumentá-lo. 32 Tabela 6 - Funcionalidades II FUNCIONALIDADES Ações que não podem ser realizadas no papel Busca por palavra ou trecho Consulta ao dicionário embutido Ampliação de imagens, textos etc. (zoom) Marcação automática do andamento da leitura Fonte: a autora. O próximo item que também contempla as Funcionalidades foi intitulado de “A Presença de atividades lúdicas ou de aprendizagem”. A intenção deste tópico foi a de avaliar os materiais extras que podem estar presentes no livro digital. A partir da observação dos artefatos – na codificação aberta – percebeu-se que muitos deles possibilitavam ao leitor mexer nos elementos das páginas e, inclusive, desenvolver atividades junto com a história ou em outro momento. Por este motivo, optou-se por separar esta categoria inicialmente em duas e posteriormente em três subcategorias. As duas primeiras destinaram-se a demarcar as atividades lúdicas e/ou de aprendizagem apresentadas ao leitor, sendo que se indicou a primeira, quando estas atividades estavam contidas dentro da história; e a segunda, quando foram oferecidas como material extra. A existência dessas duas subcategorias indicará ao leitor, que este será induzido a realizar uma ação, que difere da leitura e do avanço da mesma. Julgou-se necessário separar ações que estavam dentro ou fora da história, por entender-se que isto deve interferir no contexto da atividade. Para explicitar essa diferença, pode-se pensar nas seguintes situações: primeiro, um personagem deve ser conduzido pelo leitor ao topo da montanha, uma vez que na narrativa, naquele momento, ele está fazendo essa atividade; e a segunda poderia ser montar um quebra-cabeça de uma cena do livro, no final da leitura. Nos dois casos tanto o envolvimento da equipe de produção como o do leitor com a mesma atividade se processa de forma diferente, justamente porque uma vai acontecer dentro da história e a outra não. A partir dessa reflexão, percebeu-se que era necessário acrescentar-se um terceiro item, que viesse englobar os outros tipos de materiais extras que podem vir a estar presentes no livro digital e que não são 33 necessariamente atividades a serem desenvolvidas, tais como vídeos, músicas, indicações de sites, texto complementar etc.. Tabela 7 - Funcionalidades III FUNCIONALIDADES Presença de atividades lúdicas ou de aprendizagem Dentro da história Fora da história (Material extra) Outros tipos de materiais extras Fonte: a autora. A macrocategoria “Potencialidades do meio digital” foi dividida em três grupos, sendo que o primeiro abrangeu ações relacionadas com a interatividade do livro (Tabela 8); o segundo foi específico para as linguagens da multimídia (Tabela 9), e o terceiro dizia respeito à possibilidade de interação entre os leitores (Tabela 10). No primeiro grupo foram analisados alguns dos elementos que proporcionaram a interatividade no livro. É importante deixar claro que outros elementos, como os da Funcionalidade, também são interativos, mas, para este trabalho, julgou-se mais pertinente agrupá-los dessa forma, destacando os recursos embutidos no conteúdo daqueles que usualmente são atributos ao software. Nesta subcategoria, primeiramente se verificou a existência de recursos multimídia que necessitavam ser acionados pelo leitor, ou seja, que um possível som, movimento e/ou alteração da cena ou da história só iniciasse mediante uma ação do leitor (toque na tela, clique do mouse, movimentação do aparelho etc.); em caso contrário, a leitura seria efetivada sem esses recursos multimídia. Logo a seguir, foram colocadas a segunda e a terceira subcategorias, ambas relacionadas ao hipertexto. A segunda diz respeito a aspectos da narrativa, onde se pretendeu observar se esta fez uso da hipertextualidade, ou seja, se esta poderia conduzir o leitor por diferentes caminhos, traçando uma história diferente que dependeria das suas opções para ser conduzida. Verificou-se, ainda, se os textos que compõe o livro poderiam ser lidos em qualquer ordem sem, entretanto, 34 prejudicar a compreensão
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